Ângela Moliterno e Patrícia Bastos: coordenadora e diretora de museologia do Museu do Ingá Foto: Lucas Benevides |
Raiana Collier
Museólogos comentam a importância de seu curso
A celebração pelo Dia do Museólogo é só na sexta-feira, 18, mas os profissionais da área têm motivos para comemorar desde hoje. Com mais de 80 anos de história, o curso de museologia da Unirio foi o primeiro a ser criado no Brasil e é o mais antigo da América do Sul, com origens no Museu Histórico Nacional, onde funcionava até 1979, e era chamado de Curso de Museus. Em 1991, já no campus da Urca, tornou-se uma Escola de Museologia.
“Houve uma extensão do campo profissional nas últimas duas décadas. A gente veio de um processo onde a cultura estava muito fragilizada, até 2006 eram apenas dois cursos em todo o Brasil. Hoje, todas as regiões do país têm pelo menos uma graduação. E no mercado de trabalho vemos uma ampliação dos concursos públicos e aumento do número de museus. É claro que, com isso, acontece a contratação de mais museólogos”, declara a museóloga, diretora e professora da Escola de Museologia da Unirio, Elizabete de Castro Mendonça.
Elizabete afirma que, mesmo com a crise econômica no país, ainda vê no cenário profissional concursos acontecendo com regularidade. Para ela, o cenário atual para os profissionais de museologia é menos crítico do que era quando se formou, nos anos 90. O número de vagas disponíveis nos cursos aumentou, mas a Escola sofre com a debandada de alunos ao longo do curso.
“O que ocorreu foi uma ampliação do número de vagas. O nosso maior problema é a evasão, que desde o início sempre foi muito alta, entre 60% e 70%”, relata Elizabete.
Patrícia Bastos, 56, e Ângela Moliterno, 60, são crias do Curso de Museus, onde tinham “tudo que precisava ser aprendido sobre um museu”. Como estudavam no Museu Histórico Nacional, havia contato com documentação, conservação, restauração e atendimento ao público. Atualmente, as duas museólogas são, respectivamente, a diretora e a coordenadora de museologia do Museu de História e Artes do Estado do Rio de Janeiro - popularmente conhecido como Museu do Ingá. Patrícia conta que o interesse pela museologia vem desde a adolescência.
“Nos meus 14 anos, quis ir ao Museu da Quinta da Boa Vista, eu amava aquele ambiente. Eu lia muito, estava sempre ligada na parte de história, de humanas. Quando chegou a hora de fazer as provas para o vestibular, decidi que queria museologia e fui fazer o Curso de Museus”, conta.
Ela já é prata da casa. Em 1982, ela foi estagiária do museu, e depois, ao longo dos anos, foi percorrendo outros equipamentos do Estado. A dupla enfatiza que as adversidades são muitas e diz que já poderiam ter se aposentado, mas continuam na ativa por amor à profissão. Veteranas na museologia, acompanham a chegada de novos profissionais e enxergam uma defasagem em termos de prática.
“Quando fizemos o curso, nós estudávamos história da arte, numismática, noções de arquitetura... O nosso universo era muito grande. Agora a faculdade cuida desse lado científico, mas essa parte de catalogação, por exemplo, está muito esquecida. O pessoal sai da faculdade e não sabe fazer uma ficha”, descreve Ângela.
O Conselho Regional de Museologia (Corem) 2ª Região é responsável pela regulamentação do registro profissional e a fiscalização do exercício da profissão de museólogo no Rio, Minas Gerais e Espírito Santo. Graduada em museologia pela Unirio e membro da Comissão de Informação e Divulgação do Corem, Mariana Santana frisa que o campo da museologia vem crescendo e os perfis do curso mudando ao longo dos anos.
“Nós entendemos que cada curso tem um enfoque, e eles seguem a diretriz do Ministério da Educação. O caminho que cada aluno vai seguir depende muito deles, em relação à área que eles querem atuar. É oferecido um leque de opções e o aluno vai se direcionando”, explica Mariana.
Eunice Batista está à frente do Museu de Arqueologia de Itaipu Foto: Lucas Benevides |
Quem também tem passagem pelo Museu do Ingá é Márcia Muller, hoje, chefe da divisão de acervo do Museu de Arte Contemporânea (MAC). Formada em 1997, em museologia na UniRio, ela cita a permanência dos museus, a abertura de novos espaços, a criação do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), do Sistema Nacional de Museus e, em breve, o Sistema Municipal de Museus de Niterói como pontos a serem comemorados no Dia do Museólogo.
“Outro ponto importante é a difusão da profissão, por meio de seus cursos de bacharelado, licenciaturas plenas, mestrado e doutorado em todo o Brasil”, completa Márcia.
No MAC, que virou cartão de visitas da cidade, a média é de 12 mil visitantes por mês. Com áreas destinadas à convivência, como o espaço educativo e as galerias em torno do salão central, a ideia é criar metas, estratégias e ações para que o público fruidor de arte e o público em geral se sintam acolhidos, diminuindo o distanciamento entre museu, memória e visitante.
“No MAC, temos pesquisa de público. O niteroiense se orgulha muito do seu museu, de cada 10 visitantes, podemos dizer que seis são de Niterói. E há um retorno para visitar as exposições, já que a direção organiza novas mostras a cada três meses. Neste item, o museólogo contribui para o desenvolvimento e a promoção das atividades, sendo também um elo de ligação com o público, através da organização dos eventos no museu, contribuindo, assim, com uma de suas missões: transmitir e divulgar conhecimento”, conta Márcia.
O trabalho de chamar o público para dentro dos museus lançando mão de artifícios como as áreas destinadas à convivência, além das salas de exposição também é feito no Museu do Ingá. Além de projetos futuros, como uma exposição com uma carroça onde os visitantes poderão fazer selfies e uma parceria com a Escola de Música Villa-Lobos, o local já recebe projetos como o Cine Jazz que, periodicamente, ocupa seus jardins.
“O museu não pode mais ter aquela característica de ser simplesmente lugar de coisa velha. O objeto quando entra aqui é estudado, vai para exposição, pode ser emprestado. Existe uma gama de oportunidades de fazer aquele objeto falar. O museu está sempre em crescimento, não é uma coisa estática”, defende Patrícia.
Márcia Muller atua como chefe da divisão de acervo do MAC. A museóloga comemora a aproximação do público nos equipamentos culturais Foto: Lucas Benevides |
Patrícia e Ângela recordam que lá nos primórdios do Curso de Museus, o sonho dos formandos era trabalhar nos grandes museus nacionais, como o Museu Histórico. Atualmente, enquanto os grandes continuam com muita tradição, os demais também ganharam destaque. Elas defendem que a criação do Ibram, em 2009, contribuiu para o crescimento do status e da organização dos museus do país.
“Antigamente, só existiam dois cursos no Brasil. Com a criação do Ibram tivemos um reconhecimento muito grande dos museus e das pessoas que trabalham na área. Foi quando passaram a entender o museu não como lugar de coisa velha, mas, sim, um local que dispersa conhecimento e irradia cultura”, pontua Ângela.
Longe da agitação do Museu do Ingá e do badalado MAC, está o Museu de Arqueologia de Itaipu, antigo Recolhimento de Santa Teresa, instituição fundada em 1764. Por lá, é Eunice Batista Laroque, museóloga, 50, formada na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que está à frente do equipamento cultural.
Eunice assumiu o cargo de diretora do espaço em janeiro, quando chegou a Niterói. Na bagagem, tem mais de 25 anos de carreira e uma série de formações. É licenciada em Pedagogia pela Universidade Católica de Pelotas (RS) e em Filosofia e Ciências da Educação pela Universidade de Salamanca (Espanha), com mestrado em Tecnologia da Educação, tecnóloga em Design de Interiores e especialista em Educação de Jovens e Adultos e ainda acumula uma especialização em Patrimônio Cultural em Centros Urbanos. Ufa!
A multifacetada museóloga, que leva para o museu niteroiense o sotaque gaúcho, cita o desenvolvimento de políticas públicas para o setor e a expansão dos cursos de graduação e pós-graduação em museologia do país como motivos de comemoração. A melhora na relação com o público, segundo ela, também é um motivo a ser festejado.
“Falo pelo Museu de Arqueologia de Itaipu, que vem estreitando relações com as unidades de ensino de Niterói e municípios circunvizinhos, obtendo êxito nesta aproximação. Nos últimos anos, ampliamos muito nossa visitação, mas ainda falta consolidar as melhorias que são necessárias para o entorno do museu”, acredita.
Depois de defender que os museus não “amedrontam” mais os visitantes, ela revela que os espaços estão desenvolvendo estratégias de ação para ampliar o público. O museu é tratado como um local de interpretação social, educacional, cultural e de preservação de bens materiais e imateriais e, por isso, está mais próximo da sociedade. O grande desafio de hoje e do futuro para ela são os possíveis diálogos com diferentes públicos.
Fonte: O Fluminense
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