Martine e Marco Grael com a Baía de Guanabara ao fundo: os irmãos disputarão os Jogos - Fabio Seixo |
por Tatiana Furtado
Na classe 49er, os dois carregam nome de tradição entre expectativas e dificuldades na Baía
Em 2012, bateu na trave. Em 2016, eles estarão lá. Ou melhor, aqui. Cada um no seu barco, mas nas mesmas águas que, desde muito cedo, se tornaram o quintal de casa da família Grael. Nas raias da Baía de Guanabara, os irmãos Martine e Marco, ambos na classe 49er, terão a chance de um feito que o pai Torben e o tio Lars, que somam sete medalhas olímpicas na vela, não tiveram: a consagração em uma Olimpíada em seus domínios.
- Vai ser muito especial. Não é só a pressão, mas todos dizem que Olimpíada é muito diferente - diz Martine, que conquistou a vaga ao lado de Kahena Kunze após o título mundial do ano passado.
O desafio será maior não apenas pelo peso da competição em casa, mas justamente por onde será. A Baía de Guanabara não é para qualquer um. A imprevisibilidade das águas é o fator que assusta brasileiros e estrangeiros. Enquanto na maioria das raias da vela mundial é possível saber o tipo de vento em cada estação do ano, no Rio, isso muda ao sabor das águas.
- Agosto é totalmente imprevisível, por isso a Baía é um dos lugares mais legais de treinar. Há mudança o tempo todo. Pode fazer uma semana de vento forte lá fora (na parte aberta da baía) e, na semana seguinte, fica fraco. Então, não dá para acreditar na previsão. Aqui no Rio, mal acredito na do dia seguinte quanto mais de semanas antes - conta Martine, de 24 anos.
A predileção é por vento forte, bem diferente do encontrado no Lago Ontario, no Canadá, onde a dupla ficou com a prata. Mês passado, na Argentina, a dupla também ficou em segundo lugar no Mundial.
- Eu não gosto de vento fraco. Mas aqui a baía é muito desafiadora, pois a mudança de direção do vento é constante - afirma Kahena.
Para aqueles que praticamente nasceram velejando no Rio - Andreia, mãe dos irmãos, chegou a participar de regata com Martine no ventre - claro que há certa vantagem. Sem contar a ajuda caseira, com dicas preciosas do pai, do tio, e de multicampeões, como o amigo Robert Scheidt.
- A Baía tem quantidade muito grande de água dentro dela e uma saída pequena. Em vários pontos dela, como perto da Escola Naval, há mudanças de correntes que ninguém pode prever. Cada momento do dia pode acontecer algo diferente. Antecipar é muito difícil, o que se pode fazer é treinar algumas estratégias em determinadas situações. Porém, nunca sabemos o que realmente vai acontecer - explica Marco, que garantiu a presença nos Jogos ao lado de Gabriel Borges, ao ter a melhor classificação entre os brasileiros no último Mundial.
Os adversários tentam desvendar os mistérios das águas cariocas há anos. Até agora, no entanto, não descobriram.
- Cada área de regatas tem suas características. Aqui, nós sabemos as variáveis e temos mais vantagens. Na prática, sabemos o que pode acontecer ou não, ainda que seja complicado. Os gringos estão há três anos vindo aqui com frequência, fazem estudos, colocam boias e tentam achar um padrão. Mas não há padrão. Nós temos a prática - analisa Gabriel.
Talvez pelo conhecimento dessas águas turvas, os brasileiros evitem estratégias pré-determinadas. Vai ser no feeling, diz Martine. Nem mesmo no exterior, a dupla costuma fazer uma preparação específica para as provas. No Pan, por exemplo, as argentinas, que ganharam o ouro, fizeram dieta para ganhar velocidade nas regatas sem vento. As brasileiras até pensaram em fazer algo parecido, porém a competição anterior fora disputada com ventos fortes.
- Não dava para emagrecer em duas semanas. O ideal é estarmos bem no dia, confiantes e tranquilas. O que faz a diferença é a experiência, ter constância nas competições. Sei que haverá pressão psicológica aqui. Mas conversamos com muitas pessoas que nos dizem que uma Olimpíada pode ser até mais fácil do que outras regatas mundiais por não contar com tantos competidores por país - avalia Martine, que junto com Kahena, participará de até oito torneios até o início das Olimpíadas. - Escolhemos as provas de acordo com as competidoras para disputarmos no mais alto nível sempre.
Marco e Gabriel fazem o mesmo. Só assim para montar alguma tática.
- Só é possível treinar a estratégia em competições com grande número de barcos e do nível dos atletas - concorda Marco, de 23 anos.
Para aquelas crianças que correram o mundo com o pai, fizeram os melhores amigos nas águas e a brincadeira de infância se tornou profissão, tudo parece natural. Em casa, a vela é assunto na mesa de jantar. Mas a família amplia os horizontes dos dois, que tiveram de parar as faculdades pelo sonho olímpico.
- Nosso pai (coordenador técnico da CBVela) sempre nos ajuda no que pode, passando a experiência dele. Mas não deixa de nos ensinar que precisamos tem um plano B na vida - diz Marco.
Fonte: O Globo
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