Imagem de área afetada pelo desmatamento na Amazônia — Foto: Raphael Alves/AFP/Arquivo |
Documento é uma análise de estudos científicos que comprovam que a temperatura do planeta está subindo. As publicações mais recentes são de abril de 2019.
O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) divulgou nesta quinta-feira (8) um novo relatório que analisa e compila as descobertas científicas mais recentes sobre o aquecimento global. O documento reafirma a necessidade de limitar o aquecimento da Terra em até 1,5ºC e, entre outros pontos, destaca a importância da Amazônia nesta tarefa.
O documento do IPCC foi organizado especificamente para apresentar cenários sobre como o uso da terra contribui para o fenômeno e como o próprio aquecimento afeta a gestão da terra. O relatório contou com a coordenação de mais de 100 especialistas de 52 países, sendo a maioria de países em desenvolvimento.
Produção global de alimentos está em risco, afirma relatório da ONU Assista ao vídeo com matéria do Jornal Nacional: https://globoplay.globo.com/v/7829312/ |
O texto trata de quatro temas principais ligados ao aquecimento global e às emissões derivadas do uso do solo: mudanças de uso da terra(desmatamento incluso), segurança alimentar, degradação do solo e desertificação.
O documento analisa uma série de estudos científicos publicados até abril de 2019, que comprovam que a temperatura do planeta está subindo.
Destaques do relatório do IPCC:
- O aumento da temperatura global nas áreas continentais é mais alto do que o aumento da temperatura média Terra; enquanto nosso planeta está cerca de 1ºC mais quente, nos continentes onde os humanos vivem o aumento já atingiu de 1,4ºC a 1,5ºC;
- O relatório deixa claro que é inviável a meta de não passar dos 1,5ºC sem forte sequestro de carbono, uma tarefa importante que envolve as florestas tropicais, como a Amazônia;
- Se o desmatamento na Amazônia atingir 40% da floresta, chega-se a um ponto irreversível tanto para barrar o aquecimento global quanto para a sobrevivência do ciclo da floresta como é hoje;
- As emissões dos gases do efeito estufa relacionadas à agricultura, florestas (desmatamento, principalmente) e outros usos do solo representam 22% do que é liberado no mundo;
- O documento não pede uma redução no consumo de carne, mas alerta para a necessidade de uma diversificação da dieta para reduzir as emissões. Até 2050 serão 10 bilhões de pessoas no mundo, um cenário preocupante para conciliar produção de alimentos e energia;
- Ao avaliar os impactos da desertificação e da escassez de água, o relatório aponta que 8% das terras no Brasil já sofrem alguma forma de degradação relacionada. Na Caatinga, a estimativa é de 50% da área;
- No Brasil, o aquecimento pode reduzir as safras de milho em 5,5% a cada grau Celsius de aquecimento. Nos EUA, esse percentual pode chegar a 10,3%;
O pesquisador Paulo Artaxo, da Universidade de São Paulo (USP), é autor de um dos capítulos. Ele ressalta que o documento do IPCC adverte para os riscos do desequilíbrio na condução do futuro do planeta.
"O relatório mostra os perigos que a humanidade tem hoje de não traçar um bom equilíbrio entre produção de alimentos, mitigação de CO², redução de desmatamento e bioenergia" - Paulo Artaxo, pesquisador da USP
Amazônia
Há referências diretas ao Brasil e à Amazônia, mas o relatório não reserva capítulos específicos para um só país. Um estudo do pesquisador brasileiro Carlos Nobre, que segue em atualização e refinamento científico desde 2007, é referendado pelo documento. Ele trata de um "tipping point" para a floresta, um "caminho sem volta".
Nobre considera que o desmatamento da Amazônia é irreversível se chegar a 40% da área da floresta, em um cenário em que o aquecimento global é desconsiderado. Em outra projeção, se o desmatamento for zero, mas o clima continuar a esquentar em mais 4ºC, também não seria possível reverter os efeitos da degradação no bioma.
Nobre também criou um modelo de previsão para os fatores que vemos atualmente: com desmatamento, aumento dos incêndios e efeito do gás carbônico. Assim, não podemos passar de 20% a 25% de devastação da floresta. Nos últimos 30 anos, o percentual acumulado já soma 18% em território brasileiro.
Florestas e o CO²
As mudanças do uso do solo relacionadas às florestas (desmatamento), agricultura e outras atividades, como o uso de fertilizantes, representam 22% das emissões dos gases causadores do efeito estufa no mundo, de acordo com o relatório. Há um aumento de mais de 40% dessas emissões desde 1950.
O pesquisador Paulo Atarxo explica que as florestas tropicais têm um papel fundamental no que chama de "reciclagem de carbono". "Uma floresta na Amazônia pode ficar madura em 30 a 40 anos, enquanto florestas boreais demoram 80 a 100 anos para amadurecer. A reciclagem do carbono é muito mais rápida em áreas tropicais e isso coloca uma pressão enorme sobre a questão das florestas tropicais. Nisso, o Brasil é particularmente sensível", explica.
Eventos extremos e incêndios
O IPCC observou uma forte ligação entre o El Niño e as secas no período entre 1979 e 2000 no Brasil. Os eventos extremos, incluindo o calor e a seca, aumentaram a frequência e intensidade dos incêndios florestais – durante a seca de 2015, o fogo aumentou 36%, mesmo com uma taxa de desmatamento em queda naquele ano, outro dado referendado pelo relatório.
Apesar de não ser o principal emissor de gases, os incêndios têm um papel relevante no Brasil.
"A seca aumenta o incêndio florestal. A maioria desses incêndios, grande maioria, não é natural. Eles são provocados pela ação humana, muito disso está ligado com a limpeza de pasto. Mas por que a floresta fica muito mais inflamável, ela fica superseca, então um pequeno incêndio que tem uma fagulha levado pelo vento pode se propagar por quilômetros dentro da floresta", explica Nobre.
"Aumenta muito a emissão de gases e, mais importante que isso, também mata árvores, o que também tem o mesmo efeito".
Próximo relatório e reuniões
Em setembro o IPCC deve divulgar outro relatório, desta vez dedicado a avaliar a literatura científica mais recente sobre a mudança climática e o oceano e a criosfera – água em estado sólido, como geleiras e áreas cobertas pelo gelo.
Antes disso, a comunidade científica se reúne a partir de 19 de agosto em Salvador, na Bahia, para um novo painel sobre o clima.
Em novembro o debate será no Chile, que vai sediar a 25º Conferência das Partes da Convenção do Clima das Nações Unidas. Cotado para receber os pesquisadores, o governo brasileiro resolveu desistir do evento.
Fonte: G1
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