sexta-feira, 11 de abril de 2014
A cidade sustentável e o clima
Suzana Kahn
O longo tempo de vida útil da infraestrutura urbana torna imprescindível que os prefeitos tenham ciência do que suas escolhas poderão acarretar
As cidades se tornaram alvo de manchetes no mundo por conta de eventos climáticos extremos que as atingem cada vez mais: enchentes, ondas de calor ou frio intenso, chuvas torrenciais e falta de água. O Quinto Relatório do Grupo III do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), recém-lançado em Berlim, pela primeira vez dedica um capítulo exclusivamente a “assentamentos urbanos”, tratando as cidades como uma das principais fontes de emissão de gases de efeito estufa. Não por acaso, a capa do relatório estampa a imagem de uma metrópole. Hoje as cidades consomem cerca de 76% da energia mundial e respondem por 71% a 76% das emissões de CO2 no planeta. A expansão urbana ocorre a uma taxa duas vezes mais alta do que a do crescimento populacional e a uma velocidade sem precedentes.
A infraestrutura urbana terá ainda que ser construída para atender a esse crescimento, sendo um dos maiores vetores de aumento de emissões. Se a expansão se der com base nas tecnologias que temos disponíveis no momento, somente a produção de materiais necessários geraria, até 2050, dez vezes mais gases de efeito estufa do que é emitido hoje por ano no mundo, ou seja, cerca de 470 GtCO2.
O longo tempo de vida útil da infraestrutura urbana torna imprescindível que os prefeitos tenham ciência do que suas escolhas poderão acarretar no futuro. Não somente em relação ao consumo de energia e emissões relacionadas, mas também ao estilo de vida e padrão de consumo dos habitantes das cidades. As cidades em crescimento são as que apresentam maior potencial de mitigação das emissões e de implementação de novas tecnologias.
O Quinto Relatório apresenta as principais medidas tomadas por várias cidades para reduzirem suas emissões. As principais estratégias são direcionadas à redução da demanda de energia nas edificações, tanto comerciais como residenciais, são medidas de eficiência energética, retrofit, estabelecimento de padrões de desempenho energético, mudança de fonte de energia e produção de energia renovável no próprio local, como em telhados e estacionamentos, entre outras.
A segunda estratégia está na área de transporte, pois, além da busca por veículos mais eficientes, públicos e privados, também almeja estimular o sistema público e o deslocamento não motorizado, em caso de pequenas distâncias. As demais opções dizem respeito a resíduos, com foco no reaproveitamento, e a água, tanto no reuso como no uso mais racional, incluindo tecnologias de tratamento que evitariam ter que buscar pela água limpa cada vez mais distante do local de consumo. Por fim, também contempla matriz energética, que não depende tanto de uma decisão municipal.
Vale ressaltar que a mitigação climática é uma questão de transição tecnológica, o que implica um investimento massivo em inovação e em tecnologias de baixo carbono que possam ser adotadas e difundidas mundialmente.
Nessa direção, está em curso na Ilha do Fundão o projeto da Cidade Universitária Sustentável, que agrega essas duas principais mensagens do IPCC, buscando seguir tais estratégias com o objetivo de se tornar uma cidade modelo, testando soluções sustentáveis em escala real, um grande laboratório urbano.
A inovação tecnológica tem um papel fundamental na superação das dificuldades impostas pelas mudanças climáticas. No entanto, o maior desafio está em fazer transbordar essas experiências, seja para a cidade do Rio de Janeiro como para outros municípios que desejam estar preparados para a nova realidade do planeta.
Fonte: O Globo, Opinião
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