domingo, 27 de abril de 2014

Especialistas falam sobre o medo e o perigo dos boatos em meio a violência


"Eu acredito que os alardes desta semana foram ocasionados por motivações políticas”. Roberto Kant Sociólogo


Chailon Conceição e Leonardo Sodré

Especialistas alertam sobre o risco de disseminar informações falsas nas redes sociais e criar um pânico generalizado na população e aumentar o clima de insegurança

O crescimento da violência e os rumores espalhados pela internet têm potencializado o medo em Niterói. Na última semana, falsas notícias publicadas na internet provocaram a antecipação do encerramento do expediente em universidades, empresas e no comércio. O que se via na internet e nas ruas eram pessoas desesperadas com possíveis atos de violência que, em sua maior parte, não aconteceram. Especialistas dizem que as redes sociais refletem o medo da população, mas ponderam que os boatos podem ter motivações políticas.

“Está sendo constituído um clima de medo em Niterói. Antes a cidade tinha pontos, mais ou menos mapeados, onde a violência era mais presente. As pessoas conseguiam evitar estes lugares e se sentiam mais seguras. Hoje, atos de violência, como assaltos, furtos e roubos, estão acontecendo em todos os locais e modificando esta dinâmica que o cidadão tinha na relação com a cidade”, explica o presidente do Observatório Urbano da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Cezar Honorato.

Para Honorato, o medo é um reflexo do aumento da violência, que ganha impulso nas redes sociais, onde é comum a prática de repassar qualquer notícia sem antes checar a informação.

“O medo e a sensação de insegurança não correspondem necessariamente ao aumento da violência. Em Niterói, a relação é direta: o clima de medo é causado pelo aumento da violência, mas potencializado pela internet”, alerta o especialista.

Para o professor do departamento de comunicação da Universidade Federal Fluminense (UFF) e pesquisador do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), Marco Schneider, o impulso que as pessoas têm em publicar as informações é o grande motivo da circulação das falsas notícias.

“Às vezes, muita gente age por impulso e acaba compartilhando informações sem a menor preocupação em confirmá-las, saber se aquilo que estão lendo procede. Isso é ruim para todo mundo, pra quem publica e pra quem lê”, ressalta.

O sociólogo especialista em segurança pública da UFF, Roberto Kant de Lima, acredita que os alardes em Niterói têm motivações políticas. Para ele, há envolvimento de grupos políticos na disseminação das notícias falsas.

“Eu acredito que estes alardes que aconteceram esta semana na cidade foram ocasionados por motivações políticas, isso não teve origem no crime organizado, nem na polícia. As pessoas nas redes sociais se sentem livres para postarem o que quiserem e isso passa por uma falta de cuidado em checar o que está sendo passado”, argumenta.

"Se o usuário buscar, dentro da própria rede, ele vai saber a informação verdadeira”. Ivana Bentes Professora

A velocidade da internet é o grande diferencial, seja para nos atualizarmos, quando as informações são verdadeiras, seja para nos confundir, quando são falsas. A professora e pesquisadora da escola de comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Ivana Bentes, aponta que esta condição de imediatismo da internet é fundamental para nos orientarmos em relação às notícias, facilitando a desqualificação pública das falsas informações.

“Se o usuário buscar, dentro da própria rede, ele vai saber a informação verdadeira. A internet é uma coisa muito nova, estamos aprendendo a lidar com ela”, explica.


Tem aqueles que aproveitam para se promover e usam a rede de forma irresponsável”. Marinice Machado Psicóloga

A psicóloga Marinice Machado é ativa nas redes sociais e evita compartilhar qualquer informação que lê. Mesmo tomando este cuidado, ela diz entender este fenômeno nas redes sociais e coloca a falta de informações oficiais como principal motivo para o crescimento dos rumores.

“Esse fenômeno da rede social lida com algo que está acontecendo naquele momento e muitas vezes a pessoa, ao saber da notícia, não se preocupa em se certificar se é verdadeira ou falsa, ela quer transmitir a informação o mais rápido possível. E também tem aquelas pessoas que usam a rede para aparecer e ter seus conteúdos multiplicados a maior quantidade de vezes e publica inverdades como se fosse ‘pegadinha’ de mau gosto, aproveitando para promover a imagem na rede, irresponsavelmente, sem qualquer preocupação com o que pode causar de dano àquela pessoa que muitas vezes deixa de sair de casa e pode vir a desenvolver doenças, como Síndrome do Pânico, depressão, dentre outras”, conclui.


"Essa velocidade na informação, ao mesmo tempo que ajuda, pode provocar terror”. Sandro Araújo Policial federal

O coordenador do projeto Geração Careta e policial federal, Sandro Araújo, de 43 anos, que coordena atividades e palestras de prevenção às drogas para crianças e adolescentes, alerta sobre o clima de pânico que pode ser desencadeado pelos rumores.

“É óbvio que o índice de criminalidade aumentou na cidade – isso não se pode negar. Mas o comportamento, a estrutura de hoje é um pouco diferente. Niterói sempre foi alvo de assaltantes, mas ao compartilhar um fato com seu amigo virtual, que nem sempre é o seu amigo de fato, pode transformar essa informação em algo brutal”, afirma.

Ainda de acordo com Sandro Araújo, as pessoas podem ver um assalto no mesmo local de forma diferente. Nesse sentido, a sensação é que sempre está se concretizado um ocorrência na região.

“Nunca um fato vai ser mesmo. Isso tem um peso enorme, porque as pessoas publicam sem saber o que leram, sem ter muita certeza do que foi, e o pânico fica instalado. A absolvição de inverdades por você é complexa. Antigamente, geralmente você só sabia da notícia nos jornais no dia seguinte. Hoje é impossível esperar pelo dia seguinte, a gente sabe na hora pelo site ou pelas redes sociais. Então, essa velocidade na informação, ao mesmo que ajuda, uma vez que pode ser traçado um panorama do que está acontecendo e se movimentar de uma forma mais segura, também pode provocar um certo terror nas pessoas”, completa.

Interesses – Segundo Sandro, nesse cenário é comum oportunistas se aproveitarem deste pânico para oferecer segurança de forma paralela.

“É óbvio que algumas pessoas queiram ganhar com uma informação falsa, que é reproduzida várias vezes, beneficiando outros grupos de interesses distintos. Antes de compartilhar uma informação, você deve se certificar: se alguém viu efetivamente o fato e procurar ser específico ao detalhar o que realmente aconteceu. Tem pessoas que propagam inverdades na internet”, finaliza.

Fonte: O Fluminense

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