Márcia Hirota, diretora executiva da Fundação SOS Mata Atlântica. |
Artigo de Marcia Hirota*, originalmente publicado no Valor Econômico
Pouco abordada e valorizada no país, a iniciativa de empresários na criação de Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs), certificando parte de suas propriedades à proteção dos ambientes naturais e da biodiversidade, é uma importante estratégia para a conservação da Mata Atlântica. Isto porque as RPPNs têm conquistado um espaço cada vez maior na proteção dos ecossistemas brasileiros, sendo uma categoria do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC) que trabalha diretamente com a sociedade civil, por meio de um ato voluntário de proprietários rurais e empresários que desejam criar uma área protegida em caráter perpétuo.
Há no Brasil, hoje, mais de 1.200 RPPNs que protegem aproximadamente 700 mil hectares. Na Mata Atlântica, onde cerca de 80% dos remanescentes florestais está em áreas privadas, elas são mais de 900 e preservam aproximadamente 200 mil hectares. Desse total, cerca de 90 mil hectares estão distribuídos por 163 reservas criadas ou financiadas por empresas. Os outros 110 mil hectares encontram-se em 737 reservas instituídas por proprietários engajados com a conservação. Ou seja, as reservas corporativas, mesmo em menor número, acabam por abranger quase metade da área protegida por RPPNs nesse bioma.
Os dados são do Programa de Incentivo às RPPNs da Mata Atlântica, coordenado pela Fundação SOS Mata Atlântica em parceria com a Conservação Internacional. O Decreto 5.746/06, que regulamenta as RPPNs, reconhece que a reserva particular é de domínio privado. Assim, a RPPN é gravada em perpetuidade na escritura do imóvel, o direito sobre a propriedade é preservado e ainda são oferecidos alguns benefícios, como isenção do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR) referente à área da reserva e incentivos financeiros.
Ao ser reconhecida como RPPN, ficam permitidas em seu interior apenas atividades de pesquisa científica e visitação com objetivos turísticos, recreativos e educacionais. Pode parecer restritivo, mas muitas já perceberam os benefícios desse investimento ambiental. Para as empresas do agronegócio, por exemplo, a presença de RPPNs tem impacto direto em suas atividades, pois pode agregar valor aos seus produtos e serviços – tanto em qualidade quanto em imagem. A reserva contribui ainda para o equilíbrio ecológico, principalmente no que se refere ao controle biológico de pragas e a conservação dos recursos hídricos.
Das RPPNs corporativas na Mata Atlântica, 30 são de empresas desse setor, abarcando uma área total de 13.358 hectares. A constituição de uma RPPN pode também abrir um novo espaço de relacionamento da empresa com seus públicos de interesse. São várias as alternativas, como a oferta de atividades de recreação, lazer e de educação ambiental que envolvam a comunidade; o uso da RPPN como ambiente para treinamento e integração de seus colaboradores e o desenvolvimento de pesquisas científicas que promovam a geração de conhecimento e trocas com o meio acadêmico.
Outro setor que tem se beneficiado com a criação de reservas privadas é o de empreendimentos imobiliários e turísticos – tais como hotéis, pousadas e condomínios. Essas RPPNs acabam valorizando a região onde estão inseridas e abrem oportunidades de desenvolvimento de novos negócios ligados ao turismo sustentável, principalmente se aliados à visitação de parques localizados nos seus entornos. Esse é o setor com mais RPPNs na Mata Atlântica – são 50 reservas que protegem 5.137 hectares. Já em área, a liderança fica para o setor florestal. Com 31 RPPNs, ele é responsável pela conservação de 40.319 hectares.
As principais empresas do setor são pioneiras nessa estratégia de associarem seus negócios à proteção de fragmentos da Mata Atlântica, como é o caso da Klabin, uma das maiores fabricantes e recicladoras de papéis do Brasil, que desde 1998 mantém a RPPN Fazenda Monte Alegre, com 3.852,3 hectares, em Telêmaco Borba, no Paraná. Lá são desenvolvidas pesquisas científicas, ações de proteção dos recursos hídricos, fornecimento de sementes de espécies florestais para a restauração de áreas degradadas, além da proteção de eventuais sítios arqueológicos e culturais.
Uma alternativa para empresas interessadas em investir em conservação é a criação de organizações sem fins lucrativos, como é o caso da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza, criada em 1990 pela indústria de cosméticos e perfumaria O Boticário. Desde então, a Fundação apoia pesquisas e projetos ambientais e adquiriu em 1994, com apoio da The Nature Conservancy (TNC), a área de sua primeira reserva natural, a RPPN Salto Morato, no município de Guaraqueçaba, no litoral do Paraná, onde protege 2.253 hectares de Mata Atlântica. Desde 1996, a RRPN está aberta ao público e se tornou uma das atrações turísticas do município, recebendo mais de 10.000 visitantes por ano, trazendo dinamismo à economia regional. Em 1999, foi reconhecida pela Unesco como Sítio do Patrimônio Natural da Humanidade.
Os demais setores que investem em RPPNs na Mata Atlântica são: siderurgia e mineração (30 reservas que abrangem 10.067 hectares); serviços (11 RPPNs – 9.375 hectares); energia (6 RPPNs – 10.903 hectares); têxtil (2 RPPNs – 135 hectares); empresa pública (1 RPPN – 763 hectares) e comércio atacadista (1 RPPN – 96 hectares).
Com esses exemplos, esperamos estimular que outras empresas identifiquem áreas preservadas em suas propriedades com alto valor para a conservação e as proteja sob a forma de reservas particulares.
Como vimos, esse é um investimento em que todos ganham. A empresa associa sua imagem diretamente à conservação ambiental, além de se beneficiar das atividades desenvolvidas em suas áreas. Já a natureza ganha um importante aliado para a preservação da rica, porém ameaçada, biodiversidade brasileira.
*Marcia Hirota é diretora executiva da Fundação SOS Mata Atlântica
Fonte: SOS Mata Atlântica
Entendendo as pesquisas de opinião pública
ResponderExcluirExistem temas que permeiam o nosso dia-a-dia (por exemplo, Aquecimento Global, Efeito Estufa, Mudanças Climáticas), mas que, para muitos de nós, são identificados como termos ouvidos na mídia (repetidos sistematicamente), mas que, realmente, não sabemos (em essência) o que eles se referem.
Ou seja, temos na lembrança os termos ouvidos, mas não sabemos o que exatamente estes se referem e quanto ao reflexo na vida de cada um de nós. Digamos que somos alimentados pelos nossos ouvidos, mas não temos a real noção do que estes temas realmente são.
Um bom momento para analisar resultados de uma pesquisa realizada em âmbito nacional, nos atendo não apenas aos resultados, mas procurando ir além dessa análise.
Um dos questionamentos era sobre se o entrevistado estava preocupado com o Aquecimento Global. Na pesquisa realizada em 2010 o resultado foi de 80%, evoluindo para 94% em 2011.
Outra pergunta era sobre a gravidade das Mudanças climáticas. Em 2012 os entrevistados indicaram (65%) que o problema deveria ser considerado como muito grave.
Outro questionamento procura saber a opinião da participação do homem em relação ao Aquecimento Global. Em 2010 os entrevistados confirmaram o efeito do home em 78%, sem mudança significativa em relação a 2011, quando o valor foi de 79%.
Analisados estes números – plenamente respaldados por uma pesquisa séria – cabe analisar que tipo de entrevistado atendeu aos pesquisadores que foram às ruas obter as informações. Seriam do tipo “sei o que é e posso explicar o que o assunto se refere” ou do tipo “sei o que é dado que escuto diariamente falar sobre eles”.
No primeiro grupo estão aqueles que conhecem o assunto e, portanto, tem condições de assumir posições no que diz respeito ao debate decorrente da procura de soluções que possam minimizar os efeitos do Aquecimento Global. No segundo grupo os que não têm condição de participar dessa discussão, pois, a priori, não sabem do que se está discutindo.
Um bom momento para perguntar: em que categoria você está inserido? Estamos tratando de um assunto que efetivamente está relacionado à saúde e a qualidade de vida das futuras gerações.
Nesta linha de raciocínio, em 2010, realizada no âmbito da Grande Vitória, foi desenvolvida uma pesquisa que procurou separa estes dois grupos explicitados acima. De início o entrevistado explicitava se tinha ou não preocupação com o Aquecimento Global. Em seguida, era entrevistado por outro pesquisador que pedia que o entrevistado explicasse, com as suas palavras, o que ele entendia por Aquecimento Global.
Para simplificar a explicação tal comparação demonstrou que pouco mais da metade dos entrevistados conseguiu explicar aquilo que, na pergunta anterior, havia explicitado ter preocupação com o mesmo.
Ou seja, será possível que o grupo que não conseguiu, com suas próprias palavras, explicar o que consistia o termo Mudanças Climáticas, esteja realmente preocupado com o assunto e, sobretudo, está preparado para uma discussão que a sociedade já deveria estar envolvida há algum tempo?
Tenho minhas dúvidas se a maioria da sociedade sabe a diferença entre Aquecimento Global (origem do problema), Efeito Estufa (processo que explica o fato) e Mudanças Climáticas (efeitos que são percebidos da ocorrência do problema).
Não quero que este artigo desponte como uma visão pessimista para o fato em discussão, mas, sobretudo, que ele seja um alerta indicativo para os gestores públicos (federal, estaduais e municipais) que precisam dar condições a sociedade para que possam entender e participar das discussões em andamento.
Esta operação de conscientização / sensibilização deve passar pelos nossos educadores (em todos os níveis de ensino), especialistas em proposição de políticas públicas, órgão gestores da política ambiental e, também, das pessoas que são formadoras de opinião na sociedade.
Roosevelt S. Fernandes
Membro do CONSEMA e do CERH
roosevelt@ebrnet.com.br