quinta-feira, 29 de março de 2012

Acelerar o crescimento, mas em que direção?


Em seu encontro em Brasília, na quinta-feira passada (23/3), a presidenta Dilma Rousseff e os empresários perderam a oportunidade de iniciar um acordo sobre a direção do crescimento econômico do país no rumo do desenvolvimento sustentável.

Por Paulo Itacarambi, vice-presidente do Instituto Ethos

No encontro que manteve com 28 empresários, a “elite do PIB”, na quinta-feira passada (22/3), a presidenta Dilma Rousseff fez um apelo para que eles utilizassem seu “espírito animal” e investissem no crescimento econômico do país. Como contrapartida, ela prometeu estímulos.

Pelas notícias publicadas, a presidenta e os empresários perderam a oportunidade de iniciar acordo sobre a direção desse crescimento no rumo do desenvolvimento sustentável. Precisamos de uma economia que combine mais empregos, e de melhor qualidade, com menor intensidade no uso de energia e de materiais.

A conversa girou em torno da redução dos custos de energia, da desoneração das folhas de pagamento, do custo do dinheiro e dos insumos e também da melhoria da infraestrutura. Não há dúvida de que é preciso reduzir alguns custos para ampliar a competitividade. Mas é preciso também agregar valor aos produtos e serviços brasileiros. E o valor agregado do futuro é a sustentabilidade. Será cada vez mais esse valor, a sustentabilidade, que vai diferenciar empresas e países no mundo global.

O interessante é que a maior parte das empresas ali presentes já adotam práticas de gestão sustentável e usam esse diferencial para se apresentar aos clientes e consumidores. Esses empresários sabem que preço e qualidade não garantem mais mercado. É preciso “ser sustentável”. No entanto, durante a conversa, em nenhum momento tocaram no tema, nem mesmo para informar que estão preocupados com esse aspecto do desenvolvimento. Se essa questão foi tratada, não se divulgou.

E a sustentabilidade?

Se a perspectiva da sustentabilidade estivesse incorporada a essa conversa, os assuntos poderiam ter um desdobramento mais interessante para a sociedade, uma vez que os investimentos deveriam integrar as dimensões econômicas, sociais e ambientais.

Por exemplo, no caso da melhoria dos portos mencionada na conversa, além de investir na sua modernização e aumento de eficiência, é necessário investir também na integração modal com um sistema de transporte terrestre mais eficiente do que o rodoviário. Mas o país vem privilegiando estradas de rodagem, em detrimento das ferrovias. Inclusive com políticas recentes de redução do IPI sem as contrapartidas de aumento de eficiência e de redução do impacto ambiental.

As obras necessárias para a modernização dos portos também causam impacto nas comunidades do entorno. Esse impacto será levado em consideração nos investimentos privados?

Outro aspecto a considerar na privatização desses grandes investimentos é a definição de critérios de sustentabilidade na seleção das empresas, levando em conta o trabalho decente, o respeito aos direitos humanos, o investimento em inovação para a sustentabilidade, com processos de engenharia e as próprias construções com menores índices de emissão de carbono. Aliás, o empresariado e o governo poderiam aproveitar essas grandes obras para desenvolver novas áreas do conhecimento voltadas para a sustentabilidade.

Outra preocupação diz respeito à desoneração da folha de pagamento, que parece uma medida boa. A pergunta é se a desoneração resultará ou não em redução dos recursos utilizados em programas sociais. Se sim, esses investimentos sociais serão absorvidos pelos investimentos privados?

A aliança governo-empresas em prol do crescimento é bem-vinda, sem dúvida. Mas ela seria ainda mais benéfica se apontasse para a sustentabilidade, ou seja, se os empresários decidissem de fato arriscar num novo futuro e o governo utilizasse todos os seus meios para criar um ambiente favorável à inovação e à mudança, aproveitando, inclusive, a Rio+20. Ainda dá tempo. Será que estamos pedindo muito?

26/3/2012
 
Fonte: Instituto Ethos

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