Participei ontem de uma mesa de debates do XI Congresso Brasileiro de Defesa do Meio Ambiente, promovido pelo Clube de Engenharia, no Rio de Janeiro. A mesa, intitulada "A situação e soluções técnicas de saneamento da Baía de Guanabara para as Olimpíadas de 2016", contou com a seguinte composição:
Debatedores:
JOSÉ STELBERTO PORTO SOARES- Engenheiro Sanitarista e Diretor do Clube de Engenharia
AXEL SCHMIDT GRAEL – Vice-Prefeito do Município de Niterói
ROGÉRIO VALLE - Professor da COPPE-RJ
TITO RYFF – Membro do Conselho de Administração do Instituto Brasileiro de Administração Municipal – IBAM
Em minha apresentação, enfatizei os problemas da Baía de Guanabara abordando três dimensões: Modelo de Gestão, Governança e Financiamento. Seguem alguns pontos abordados:
MODELO: O Brasil ainda não conseguiu estabelecer um modelo de gestão que permita atender à sua demanda de investimentos em saneamento. Como o caso da Baía de Guanabara bem exemplifica, a nossa capacidade de suprir uma infraestrutura de esgotamento sanitário é inferior ao crescimento da demanda e nos impõe um déficit crescente (vide quadro abaixo).
Como pode ser verificado no gráfico acima, o déficit de atendimento de serviços de saneamento em 2012 é maior do que todo o quantitativo de moradias - atendidas ou não atendidas por saneamento - na década de 1970. Estimativas de fontes diferentes consideram que os investimentos necessários para implantar todo o sistema de saneamento na Baixada Fluminense e demais municípios do entorno da Baía de Guanabara, como São Gonçalo, por exemplo, estaria entre R$ 12 bilhões, R$ 15 bilhões ou R$ 20 bilhões. Eu acredito mais na terceira hipótese. O atual modelo de saneamento, baseado em investimentos estatais e tendo a CEDAE como executora teria como atender à demanda no prazo necessário? A história tem mostrado que não!
METAS: Outro sério problema é a falta de metas claras de curto médio e longo prazo. A falta desta clareza permite que tenhamos programas e investimentos que não têm continuidade. Por exemplo, o PSAM não é um programa de continuidade do PDBG.
PERFORMANCE AMBIENTAL: Ao contrário de iniciativas de recuperação de outras baías ou ambientes estuarinos, na Baía de Guanabara não praticamos critérios de performance ambiental para a medição da eficácia dos investimentos. Os nossos parâmetros de monitoramento e de estabelecimento de metas são físicas e relacionadas às obras: extensão de tubos instalados nas redes de esgoto, número de ETE´s, etc.
A falta de indicadores de performance ambiental das obras impedem, inclusive, que o governo consiga dar dar respostas às críticas frequentes de que os recursos do PDBG e outros foram "jogados fora", "desviados", etc. A Baía de Guanabara melhorou nos últimos anos em vários aspectos, mas o governo não consegue comprovar isso porque não mede os resultados dos seus investimentos.
"CHAPA BRANCA": Outro ponto de diferença entre as ações de despoluição da Guanabara e outras iniciativas é o caráter "chapa branca" do nosso programa, ou seja, o protagonismo é quase que unicamente do governo estadual. No caso da Baía de Chesapeake, por exemplo, existem recursos federais e do governo estadual compromissados com o programa, mas contam com uma ampla matriz institucional que envolve a socidade civil, universidades e empresas. Portanto, no caso deles, o programa de despoluição não é um programa estatal, mas de toda a sociedade. Este lastro social permite que o programa tenha mais apoio social e continuidade.
Estudo apresentado pelo Projeto Grael para colaborar com a solução do problema do lixo flutuante na Baía de Guanabara. |
ENSEADA LIMPA: o Programa Enseada Limpa é uma iniciativa da Prefeitura de Niterói para a recuperação ambiental da Enseada de Jurujuba (Saco de São Francisco), que poderá ser a primeira parte da Baía de Guanabara a ser considerada despoluída.
Enfim, é óbvio que a Baía de Guanabara não será despoluída para os Jogos de 2016, mas ainda dá tempo de se obter bons resultados no caso do lixo flutuante. Mas, o mais importante é que o debate se mantenha e que se garanta, agora, no período pré-olimpíadas, os compromissos que assegurem o futuro do programa de despoluição da Baía de Guanabara.
O futuro da Baía de Guanabara precisa ser construído agora!
Axel Grael
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Legado em xeque
Temas dos mais delicados para a cidade do Rio de Janeiro e outros 16 municípios adjacentes à Baía de Guanabara, sua despoluição, prometida como Legado Olímpico pelo Brasil, um dos fatores responsáveis pela vitória da cidade como sede dos Jogos Olímpicos de 2016, foi o tema da mesa redonda que fechou o segundo dia do CBDMA. Contando com a moderação de Gandhi Giordano, vice-presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES-RIO), a mesa teve como debatedores José Stelberto Porto Soares, diretor do Clube de Engenharia; Axel Schmidt Grael, vice-prefeito do município de Niterói; Rogério Valle, professor da COPPE-UFRJ e Tito Ryff, membro do Conselho de Administração do Instituto Brasileiro de Asministraão Municipal (IBAM).
Para falar do histórico do problema, Tito Ryff, que articulou e coordenou o Plano de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG) na década de 1990, falou do esforço necessário para se conseguir, de fato, despoluir a baía. “O PDBG contou com um financiamento de 800 milhões de dólares. Corrigindo-se monetariamente para valores atuais, daria cerca de US$ 1,5 bilhão. O valor é grande, mas não suficiente para todo o trabalho que precisava ser realizado. Para se ter comparação, apenas a construção do Estádio Mané Garrincha para a Copa do Mundo de 2014 custou 1 bilhão e 400 milhões”, destacou.
Além de elencar as diversas fontes de poluição da baía, incluindo a descarga de esgoto sanitário equivalente ao despejo de um Maracnã inteiro diariamente, Ryff citou o derramamento de óleo de barcos, a poluição industrial e o lixo – de papéis e plásticos até estantes e geladeiras – jogados nos 34 rios e canais que desaguam na baía. “Imagine coordenar o espírito cívico e compromisso político de 17 prefeitos para realocar populações ribeirinhas, realizar programas de coleta e destinação adequada do lixo, de educação ambiental etc”, propôs Ryff. “Não basta limpar a baía. Temos que impedir que ela continue sendo contaminada. Esse é o verdadeiro desafio”, finalizou.
O vice-prefeito de Niterói, o ambientalista Axel Grael, descreveu experiências de outros lugares do mundo onde, com compromisso político e participação social direta, foi possível recuperar baías semelhantes à Baía de Guanabara. Citando a experiência do estado americano de Maryland, nos EUA, que se esforça para recuperar a Baía de Chesapeake, Grael afirmou: “Em experiências no exterior, vemos que tudo é feito em cima de metas de performance ambiental e indicadores. Há planos que determinam exatamente o que deve acontecer em cada etapa do processo e, a cada dois meses o governador cobra dos secretários os resultados, bem como a população cobra do governador. Tecnologias de ponta são usadas lá fora enquanto nós continuamos tentando resolver o esgotamento sanitário, problema que deveria ter sido superado no século XIX”, declarou.
O legado e a obrigação da cidade para com o Comitê Organizador foi o destaque dado por Rogério Valle. Entre os compromissos apresentados pela cidade do Rio no documento de campanha para sede daos Jogos Olímpicos estava a despoluição de 80% da Baía de Guanabara. Buscando uma visão mais otimista diante da óbvia impossibilidade de se cumprir o compromisso, Valle propõe que o Brasil tome Sidney como exemplo. A cidade-sede também não foi capaz de despoluir sua baía para os jogos olímpicos, mas se comprometeu que aquele seria o primeiro momento de um programa maior de despoluição e vem perseguindo esse objetivo desde então. “Não podemos esquecer oq eu a Baía de Guanabra tem de bom. Ainda há muita vida ali. . A limpeza superficial não deve nos distanciar de medidas permanentes e estruturantes: o saneamento da Baixada Fluminense. Esse não é só um compromisso da cidade com o COI, mas com ela mesma. O que precisamos “é de um bom projeto, com metas factíveis”, defendeu.
Stelberto Soares somou sua opinião aos demais, ao evidenciar que um dos maiores problemas do Brasil em qualquer área é também o problema determinante na questão: a falta de planejamento. “Não se consegue ter metas claras. A falta de planejamento é o nosso problema no passado e no presente. A cidade continua partida não só no social. Também no abandono. É preciso assumir um posicionamento politico que nos leve a planejar algo que tenha começo meio e fim. Se não, vamos continuar com a cidade partida. Hoje, a nossa responsabilidade não é apenas técnica, porque a questão é política”, finalizou.
Fonte: baseado em texto divulgado pelo CBDMA e publicado no portal do Clube de Engenharia.
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