quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Turismo em parques federais: ecológico e lucrativo



Visitantes nas Cataratas do Iguaçu: gastos de oito milhões visitantes de unidades de conservação federais geraram mais de R$ 4,1 bilhões em vendas totais Foto: Agência O Globo


Para cada R$ 1 gasto nas unidades de conservação do país, outros R$ 7 são injetados na economia

Ana Lúcia Azevedo

Num fim de manhã de novembro, a catarinense Maria Salete Ramos, de 32 anos, comentava com a amiga Sandra Cunha, de 30, ter se deslumbrado com as Cataratas do Iguaçu (PR) à sua frente, mas estava frustrada porque não havia visto um só quati. Não satisfeita com o de pelúcia que havia adquirido numa das lojas do Parque Nacional do Iguaçu, ela planejava voltar no verão só para ver os ditos quatis, comuns por lá. Turistas como ela movimentam a economia de forma mais expressiva do que se imagina. Para cada real gasto pelo visitante em parques federais, outros R$ 7 são injetados na economia regional, mostra um estudo.

As unidades de conservação (UCs) estão na base de um negócio lucrativo não apenas para empresas de ecoturismo, mas para os municípios de entorno dessas áreas. Em 2015 (último ano com dados consolidados), os gastos de oito milhões visitantes de UCs federais geraram mais de R$ 4,1 bilhões em vendas totais, R$ 1 bilhão em renda pessoal e R$ 1,5 bilhão em valor agregado ao PIB, além de apoiarem 43.602 empregos. Os dados são de uma pesquisa liderada por Thiago Beraldo Souza, do ICMBio, em colaboração com pesquisadores das universidades de São Paulo (USP), Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e da Flórida.

Carlos Eduardo Young, professor do Instituto de Economia da UFRJ e co-organizador do livro “Quanto vale o verde: a importância econômica das unidades de conservação brasileiras”, afirma que a visitação de áreas protegidas, ainda incipiente no Brasil, tem enorme potencial econômico. Ele diz que, em 2016, o turismo em áreas protegidas (federais e estaduais) gerou R$ 6,1 bilhões. E ressalta que esse valor poderia ser significativamente maior se houvesse investimento para atrair mais público. Além disso, nem todas as UCs registram a visitação e poucas dispõem de estrutura. Dos 73 parques nacionais do Brasil, apenas 14 cobram ingressos.

Conservação é a alma e o corpo do negócio, enfatiza o diretor de Sustentabilidade do Grupo Cataratas, Fernando Sousa. Ele destaca a importância do combate ao desmatamento e à caça não apenas para a preservação da biodiversidade, mas para a economia:

— As unidades de conservação prestam um serviço enorme para a economia. Não exploramos ainda uma ínfima parte do potencial do Brasil, há muitas oportunidades de desenvolvimento realmente sustentável e gerador de renda e empregos.

Cerca de 45 áreas aptas

O Cataratas administra as concessões dos parques nacionais da Tijuca, do Iguaçu (PR) e de Fernando de Noronha (PE), além do AquaRio, do RioZoo e do Marco das Três Fronteiras (PR). Segundo Sousa, há planos ainda de ampliar os investimentos. Um estudo coordenado por Young, da UFRJ, mostrou que só a atividade do grupo com venda de ingressos, suvenires e outros serviços de uso público gera por ano até R$ 46,3 milhões, além de uma arrecadação de impostos de R$ 19 milhões e um repasse de R$ 14,3 milhões ao ICMBio.


Fernando de Noronha: outra área de conservação que atrai muitos visitantes Foto: Divulgação


O cálculo não considera as atividades das demais concessionárias no parque nem os efeitos sobre hotelaria, alimentação e transportes. Cerca de 70% dos produtos vendidos no parque em Foz do Iguaçu, como alimentos, roupas ou brinquedos, vêm do município e das outras 13 cidades no entorno da área de visitação. Ao estimular a economia local, diz Sousa, diminuiu-se a pressão de desmatamento no entorno do parque:

— O produtor vê que o parque lhe dá muito mais lucro do que o desmatamento.

Há ainda as transferências fiscais para os municípios, via ICMS ecológico, diz Young. Ele observa que, de 2009 a 2016, a visitação nos parques da Tijuca e do Iguaçu, as duas UCs mais visitadas do Brasil, aumentou 50%. Em 2017, o Iguaçu recebeu 1,8 milhão de visitantes, 70% brasileiros e os demais de 170 países. Mas outras poderiam ter visitação expressiva, caso do Parque Nacional da Bocaina, entre Rio e São Paulo, que recebeu apenas 8.897 visitantes em 2016.

A Bocaina é um dos parques nacionais para os quais o ICMBio propõe parcerias público-privadas por meio de concessões de apoio à visitação. Outros são, por exemplo, Itatiaia (RJ), Serra dos Órgãos (RJ), Caparaó (MG/ES), Jericoacoara (CE) e Lençóis Maranhenses (MA). Os processos de concessão estão ainda em diferentes níveis de andamento.

Reuber Brandão, professor de manejo de áreas protegidas da Universidade de Brasília (UnB) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza, acredita que o turismo em unidades de conservação poderia, ao menos, quadruplicar no país. Fernando Sousa observa que nem todas as UCs são aptas à atividade. Ele estima em cerca de 45 aquelas com potencial para o turismo e diz que os recursos arrecadados com elas poderiam ser empregados na conservação das demais, que prestam outros serviços ambientais essenciais, como produção de água e regulação do clima:

— Há uma visão equivocada de que unidades de conservação trazem prejuízos. É o contrário. Elas são um patrimônio nacional e dão um retorno enorme para a sociedade.

E não apenas as unidades de conservação públicas, mas também as privadas. Brandão destaca o caso da Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) do Vagafogo, em Pirenópolis, Goiás. Com apenas 17 hectares, ela recebe 12 mil visitantes por ano:

— As UCs empregam pessoas, fixam o morador da área rural na terra, diminuindo o inchaço urbano, e contribuem para valorizar a cultura e as tradições rurais do Brasil.


Fonte: O Globo










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