sábado, 25 de maio de 2013

Programas florestais cambaleantes na América Latina



Floresta da reserva de biosfera de Manmatlán, no ocidente do México. Foto: Comissão Nacional de Áreas Protegidas

Cidade do México, México, 24/5/2013 – O tratamento de assuntos como a propriedade do carbono florestal e o mecanismo de consulta prévia ameaça fazer descarrilar os planos para a Redução de Emissões Provocadas pelo Desmatamento e pela Degradação das Florestas (REDD+) em alguns países da América Latina. Esses temas obstruem o desenho do plano do México dentro do Programa Conjunto da Organização das Nações Unidas para a Redução de Emissões Provocadas pelo Desmatamento e pela Degradação das Florestas (ONU REDD). No Panamá levaram os povos indígenas a se retirarem do programa.

“O governo anterior deixou escapar a oportunidade de incluir o processo por medo da participação social, especialmente de povos indígenas e comunidades camponesas”, contou à IPS o presidente da Rede Mexicana de Organizações Camponesas Florestais (Rede Mocaf), Gustavo Sánchez. A administração que começou em dezembro não se pronunciou quanto a “assumir o rascunho existente” do plano nacional, acrescentou. “O México seria o segundo país em avanço na região da Mesoamérica, porque a Costa Rica já está em processo de aplicação da consulta, depois de chegar a um acordo entre indígenas e governo”, detalhou Sánchez.

A REDD+ é um plano de ação que financia programas nacionais em 16 países do Sul em desenvolvimento para combater o desmatamento, reduzir as emissões de dióxido de carbono, e apoiar o acesso dos países participantes ao suporte técnico e financeiro. A iniciativa foi lançada em 2008 por uma agência e dois programas da ONU: a FAO, que cuida de alimentação e agricultura, o Pnuma, que trata do meio ambiente, e o Pnud, encarregado de questões de desenvolvimento. Sua finalidade é promover a conservação, o manejo sustentável e o aumento dos depósitos de carbono nas florestas existentes.

Pela América Latina participam Bolívia, Equador, Panamá e Paraguai, enquanto até agora aderiram como sócios sem receber financiamento Argentina, Chile, Costa Rica, Guatemala, Honduras, México e Peru. No total, participam 46 países do Sul. O México tem cerca de 65 milhões de hectares cobertos por árvores, que são parte dos territórios de aproximadamente 2.300 comunidades, 600 delas manejando empresas florestais, segundo o Conselho Civil Mexicano para a Silvicultura Sustentável.

Este país, com quase 117 milhões de habitantes, emite anualmente cerca de 748 milhões de toneladas de dióxido de carbono, um dos contaminantes responsáveis pelo aquecimento do planeta. Aproximadamente 16% correspondem às atividades agropecuárias, ao desmatamento e a outros usos do solo. As autoridades estimam que são perdidos anualmente 150 mil hectares de florestas, mas organizações ambientalistas dizem que essa redução atinge mais de 500 mil hectares.

Em fevereiro os povos indígenas panamenhos se retiraram do programa-piloto, por considerarem que desrespeita a livre consulta, prévia e informada, prejudica os direitos coletivos sobre a terra, e viola a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, de 2007. “O Estado tem nos marginalizado. A primeira coisa a ser garantida pelo programa são as salvaguardas indígenas. Não tem sentido continuar com o programa”, disse Héctor Huertas, da Corporação de Advogados Indígenas do Panamá, que representa a Coordenadoria Nacional dos Povos Indígenas do Panamá.

Por isso, explicou Huertas à IPS, a Coordenadoria, que agrupa os sete povos originários do país, entrará nos próximos dias com uma ação em um tribunal administrativo contra a Autoridade Nacional do Meio Ambiente para deter a REDD+. No Panamá, país com 3,5 milhões de habitantes, há cerca de 417 mil indígenas, segundo o censo de 2010, em uma área de 16.634 quilômetros quadrados, equivalente a 29% do território nacional. Os territórios indígenas funcionam sob a figura de propriedade coletiva e sua terra não pode ser alienada nem vendida.

A crise nesse país com o plano corrobora as suspeitas de dezenas de organizações não governamentais e acadêmicos de diferentes partes do mundo de que a REDD+ não é uma solução de fundo para os problemas ambientais. Além disso, pode ser uma lição para os países que estruturam esses programas.

O estudo Análise Legal de Temas Transversais na Execução da REDD+. Lições Aprendidas com México, Vietnã e Zâmbia destaca que “as leis mexicanas não especificam quem possui o carbono, mas podemos presumir que os proprietários das florestas e os sujeitos de direitos serão os beneficiários diretos”. Este documento, divulgado no dia 2 pela ONU REDD, acrescenta que “a clareza dos direitos da posse da terra é um componente crucial nos enfoques florestais para combater a mudança climática e definir os direitos de carbono relacionados”.

O informe Juntando as Peças Para Uma Boa Governança da REDD+: Uma Análise de 32 Propostas de Preparação Nacionais, divulgado em março, conclui que poucos países desta iniciativa “consideram opções de projeto ou desafios específicos relacionados com a repartição de benefícios, resolução de conflitos ou sistemas de administração de ganhos”. Contudo, destaca positivamente que “a maioria inclui planos para abordar estes temas enquanto as atividades preparatórias avançam”.

O documento, elaborado por Lauren Goers Williams, do Instituto de Recursos Mundiais, dos Estados Unidos, afirma que “relativamente poucas propostas preparatórias identificam passos seguintes específicos para abordar os desafios de posse da terra ou estabelecer mecanismos de coordenação com instituições locais durante o planejamento e a execução da REDD+”. Embora no México existam seis projetos-piloto de REDD+, é difícil a estratégia nacional ficar pronta este ano.

“Preocupa como avançam as ações, porque não existe um eixo nacional que teria de vir primeiro. É dada menos importância à propriedade e aos direitos, e mais à medição, relatórios e verificação do carbono. Se avança mais na parte técnica, mas não há nenhuma perspectiva de sustentabilidade”, criticou Sánchez. Organizações não governamentais vinculadas ao processo pedirão à Comissão Nacional Florestal uma definição a respeito da negociação da estratégia nacional, para dirimir os temas críticos.

No caso do Panamá, Huertas explicou que os povos originários “queriam que houvesse especialistas indígenas no programa e que a consulta fosse feita pela Coordenadoria. Agora, queremos uma suspensão sob o princípio precatório, porque são violados direitos fundamentais”. A retirada indígena é comentada no 12º período de sessões do Fórum Permanente para as Questões Indígenas da ONU, que acontece de 20 a 31 deste mês, em Nova York.

A ONU REDD adianta anualmente uma avaliação externa do programa no Panamá. Seu estudo indica que, “para garantir a distribuição com êxito e equitativa dos benefícios da REDD+, a legislação respectiva deve incorporar procedimentos e normas claras e harmonizadas, que permitam a participação aberta entre atores nos níveis nacional e regional. Envolverde/IPS

Fonte: Envolverde


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