segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Desperdício de água chega a 31,4% em SP e já supera os anos pré-crise hídrica



Represa Jaguari em fevereiro de 2016 (à esq.) e em janeiro de 2017 (à dir.) (Foto: Márcio Fernandes/Estadão)


Estadão - São Paulo - 28/01/2017

De acordo com dados da Sabesp, entre janeiro e setembro foi perdido o equivalente a quatro represas do Guarapiranga com vazamentos na rede e fraudes como ligações clandestinas; desperdício teve alta de 10% em relação a 2015

SÃO PAULO - Menos de um ano após o término declarado da crise hídrica paulista, o desperdício de água tratada registrado pela Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) voltou a crescer. E já supera os índices de perdas medidos antes do início da seca histórica e do racionamento ocorridos entre 2014 e 2015.

Os últimos dados divulgados pela estatal mostram que o índice de perdas de água por meio de vazamentos na rede e fraudes como ligações clandestinas chegou a 31,4%, alta de 10% em relação a 2015. Na prática, a cada 1 mil litros de água tratada pela Sabesp, 314 litros se perdem por buracos na tubulação antes de chegar aos consumidores ou são furtados, causando prejuízo financeiro.

Um cálculo feito pela reportagem, a partir do último balanço divulgado pela Sabesp, aponta que entre janeiro e setembro de 2016 mais de 600 bilhões de litros de água tratada foram desperdiçados, o que corresponde a mais da metade da capacidade normal (sem contar o volume morto) do Sistema Cantareira ou a quase quatro represas do Guarapiranga cheias.

Em 2015, segundo ano da crise, as perdas da Sabesp haviam caído para 28,5%, menor índice já registrado pela companhia. O resultado, contudo, foi reflexo do racionamento de água feito na Grande São Paulo por causa da seca, principalmente no primeiro semestre, quando parte da população chegou a ficar até 20 horas por dia sem água. Os dados completos de 2016 serão divulgados apenas em março.

A Sabesp já esperava uma alta nas perdas de água na distribuição por causa da normalização do abastecimento, que ocorreu no fim de 2015 - em março de 2016, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) anunciou o fim da crise. Mas o índice registrado no terceiro trimestre de 2016 já superou até a média observada em 2013 (31,2%) e 2012 (31,1%), quando não havia crise nem racionamento. Em 2014, ano marcado pelo início dos cortes de água, o índice foi de 29,8%. No País, a média é de 36,7%, de acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), do Ministério das Cidades.

À época, a Agência Reguladora de Saneamento e Energia de São Paulo (Arsesp), que fiscaliza o serviço prestado pela Sabesp, havia definido como meta para 2016 um índice de perdas de 27%. Segundo a Sabesp, cada ponto porcentual do índice de perdas corresponde a um volume de água suficiente para abastecer cerca de 300 mil pessoas. A própria companhia havia estipulado como meta para 2016 perdas de 28,4%.

Os resultados colocam em xeque a eficiência do programa de redução de perdas de água feito pela Sabesp, que já gastou mais de R$ 1 bilhão desde 2009 e é alvo de investigação do Ministério Público Estadual (MPE) desde 2014 por suspeita de favorecimento a empresas de ex-diretores da companhia.

O presidente do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos, acredita que a contenção de investimentos feitos pela companhia por causa das crises hídrica e financeira nos dois últimos anos pode ser uma das causas da alta no índice de perdas acima do que já era esperado com o fim do racionamento. “Perda de água é uma coisa na qual não podemos deixar de investir nunca. O envelhecimento natural da rede faz com que esse índice piore sozinho e, por isso, é preciso investir de forma contínua para reduzir as perdas a longo prazo. Por causa da crise, a Sabesp focou seus investimentos em obras relacionadas aos mananciais, para aumentar a segurança hídrica”, afirma.

Dados da Sabesp mostravam, em 2014, que 51% da rede de abastecimento na Grande São Paulo tinha mais de 30 anos de uso. O envelhecimento das tubulações é um dos principais motivos das perdas físicas (por vazamentos) de água, que correspondem a cerca de 65% do volume total de água desperdiçada pela própria empresa antes de chegar às residências.

“Com a normalização do abastecimento, a água volta a circular com mais pressão e pontos que já tinham alguma fragilidade sofrem com vazamentos. Por isso, é preciso dividir a rede em pedaços e substituir os trechos mais antigos por novas tubulações, além de combater as fraudes. Qualquer contenção dos investimentos impacta aumento das perdas”, afirma Édison Carlos.

Somente entre janeiro e setembro de 2016, a Sabesp flagrou 19.162 casos de furto de água na Grande São Paulo, que desviaram cerca de 2,9 bilhões de litros, volume suficiente para abastecer 385 mil pessoas por um mês. No mesmo período de 2015, foram descobertas 14,2 mil fraudes, com prejuízo de 2,7 bilhões de litros.

Estoque para a Grande SP dobrou em 1 ano

A normalização do regime de chuvas sobre os reservatórios e o consumo de água ainda abaixo dos padrões pré-crise hídrica impediram que o aumento das perdas na distribuição comprometessem o abastecimento na Grande São Paulo ao longo do ano passado.

Em um ano, o estoque de água disponível nos seis principais mananciais que abastecem a região metropolitana praticamente dobrou, passando de 585,4 bilhões de litros, em janeiro de 2016, para 1,1 trilhão nesta sexta-feira, 27, segundo dados da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp).

Só no Sistema Cantareira, o maior deles, a quantidade de água nas represas triplicou, fazendo com que o índice de armazenamento subisse de 14,7% para 58,8%. Os dados não incluem as duas cotas do volume morto dos reservatórios, usadas emergencialmente entre 2014 e 2015.

Em 2016, entraram no sistema 62% mais água do que em 2015 e a tendência é que o volume continue subindo. Só neste mês já choveu no Cantareira 40% mais do que a média para janeiro. Enquanto isso, a população consome 13% menos água do que antes da crise.

Sabesp diz que alta da pressão na rede aumentou perdas

A Sabesp alega que o “aumento da disponibilidade de água nas redes”, após o fim da crise, e a “diminuição do período de gestão de pressão” provocaram “uma elevação proporcional das perdas de água”. Essa medida, diz, foi feita para “diminuir o desconforto da população, mas tem como contrapartida aumentar as perdas de água”. Segundo a estatal, seu índice de perdas por vazamentos é compatível ao de cidades como Chicago e Barcelona. A companhia informou que vai investir R$ 520 milhões neste ano, substituir 674 km de redes até 2019 e que contratos de performance já resultaram em uma economia de 1.100 litros por segundo desde 2009.

Fonte: Estadão







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