terça-feira, 29 de outubro de 2013

Entrevista do secretário Chico D'Angelo sobre a gestão da Saúde em Niterói


Entrevista. Secretário de Saúde de Niterói, Chico D`Ângelo, em seu gabinete, fala dos problemas e dasafios do município Hudson Pontes


Luiz Gustavo Schmitt
Renato Onofre
 
Chico D'Angelo: ‘Num cenário de crise, não tem como fazer milagre’

Depois de dez meses como secretário municipal de Saúde, ele admite dificuldades na rede, revela seus desafios e propõe mudança no modelo de gestão para reestruturar o atendimento no município

Emergências fechadas. Falta de remédios, leitos e médicos. Hospitais e postos de saúde em estado precário. Nas últimas quatro semanas, O GLOBO-Niterói publicou a série “Cidade pede socorro”, em que mostrou problemas enfrentados pela população de Niterói em busca de atendimento. Na quinta e última reportagem, o secretário de Saúde, Chico D’Angelo, fala sobre investimentos, mudança no modelo de contratação de servidores e pede a reabertura do Hospital Universitário Antonio Pedro. Ele afirma que, a partir de novembro do ano que vem, a área de saúde estará melhor e promete assinar uma carta-compromisso com as principais metas de sua gestão. Garante ainda que um novo panorama no setor será percebido pela população.

O cenário atual

“A gente tem um passivo e uma demanda reprimida muito grande, que herdamos da antiga gestão. Eu sabia que a cidade estava com problemas, mas não tinha a dimensão do tamanho. O que pegamos é bem diferente do que deixei em 2006 (Chico D’Angelo foi secretário de Saúde de 2002 a 2006). A emergência do Antonio Pedro estava aberta. O Getulinho aberto. O Hospital Mário Monteiro, em Piratininga, tinha sido recém-inaugurado e funcionava a todo vapor. Os dois centros de atenção psicossocial (Caps) — o Álcool e Drogas, no Fonseca, e o Infantojuvenil, no Ingá — andando bem. Este ano, um caos. A maioria dos serviços ou não funcionava ou funcionava mal. Ainda encontramos sérios problemas tanto do ponto de vista estrutural quanto de insumos, além de uma séria crise de recursos humanos. Isso sem contar com o imbróglio jurídico da Maternidade Alzira Reis, em Charitas. Até o programa Médico de Família, que sempre foi uma referência, estava com unidades fechadas, como é o caso do posto da Grota, que reabrimos. Já o Hospital Carlos Tortelly (antigo CPN), no Bairro de Fátima, deixamos uma obra encaminhada que até hoje não foi concluída. O quadro era dramático!”

Contratação de médicos

“Esse é um problema que resolvemos enfrentar. Não tinha outro jeito. Na média, cerca de 60% são funcionários com vínculo precário de trabalho (RPAs). Estamos em fase de conclusão do levantamento das necessidades da rede e optamos por três modelos: organizações sociais (OS), fundação estatal e concurso público. A princípio, trabalhamos com a tese de que para as áreas hospitalares e de urgência e emergência, o melhor é a OS. Já para área administrativa, como vigilância sanitária, prefiro concurso público. Defendo ainda que toda a área de saúde mental, assim como o programa Médico de Família e atenção básica, seja trabalhada com a lógica de fundação estatal. Porque tem plano de carreira, crescimento por mérito, funcionários são celetistas. Nós já formatamos o projeto, encaminhamos à Procuradoria. Até novembro, o prefeito encaminhará a proposta à Câmara. Com isso, acabamos com a precarização de mão de obra de maneira global na rede.”

Hospital Getulinho

“Em um ano e oito meses, a obra deve ficar pronta. O hospital estava praticamente fechado. A média cirúrgica do Getulinho era de 20 cirurgias por mês. Fomos a Brasília, conseguimos recursos e abrimos a emergência. Há uma polêmica em torno do custo da utilização da OS que não é verdade. O custo do Getulinho, em maio deste ano, sem OS e com a emergência aberta, foi de R$ 2, 8 milhões. A conta (divulgada) de R$ 1,2 milhão não incluiu o salário dos funcionários. Com a OS, houve uma redução concreta de profissionais RPAs. Eles agora têm vínculo empregatício, têm fundo de garantia e, principalmente, têm um salário muito melhor. Hoje, a OS está custando R$ 2,6 milhões, quando antes gastávamos R$ 2,8 milhões. O custo da OS vai empatar o jogo. Eu sei que há muitas pessoas que criticam OS e que defendem concurso público. Mas, esse é um modelo bem-sucedido que avança no Brasil. Contudo, é verdade que não se chegou a um consenso sobre qual é a melhor solução para os recursos humanos.”

Transparência no contrato

“Nós fomos excessivamente transparentes com a questão da OS e publicamos a íntegra do contrato (os anexos não foram publicados, mas o secretário garantiu sua publicidade ao GLOBO-Niterói). Não há risco de supervalorização dos serviços. A OS tem uma comissão com participação do conselho municipal, que controla o padrão do atendimento e a qualificação da atenção. Vamos criar também um conselho gestor e acompanha tudo da forma mais transparente possível. Ainda tem o controle externo, como MP e TCE.”

Cirurgia infantil no Orêncio de Freitas

“O Hospital Orêncio Freitas está preparado para receber cirurgia infantil. É um hospital cirúrgico. Tem laboratório, raio-X etc. Esta semana já teremos a primeira cirurgia lá. Casos complexos continuarão sendo mandados para os hospitais Azevedo Lima e Antonio Pedro.”

Mario Monteiro virando UPA

“A cidade não perde com esse modelo que adotamos. Pelo contrário. Vamos aumentar a capacidade de atendimento. Lá é uma unidade pré-hospitalar. Será uma unidade de urgência e emergência como é hoje, só que qualificadíssima. Não vai funcionar como UPA. Essa adequação às diretrizes do Ministério da Saúde possibilitou, pela primeira vez, recurso para custeio. Com isso, sobra recursos para o município comprar mais equipamentos. Posso, por exemplo, colocar respirador em maior quantidade nas instalações. Vamos melhorar as enfermarias, trabalhar com a lógica de mão de obra não precarizada, com OS. Vamos abrir o processo licitatório. Ela hoje não tem as benesses de uma unidade de urgência e emergência para custeio e o município tem o ônus de arcar com tudo. Por isso, esse hospital se degradou. Eu posso dizer que aumentará em 30% o número de atendimentos da unidade. Vai voltar a ser uma unidade limpa, arrumada e qualificada, e não aquela coisa que está hoje, degradada. A Região Oceânica terá uma emergência nova.”

Dever de casa

“Temos que fazer a nossa parte e estamos fazendo. No Carlos Tortelly, recuperamos um financiamento que eu consegui em 2006 e que estava sendo contestado pelo Ministério da Saúde. A obra lá estava parada há dois anos. Readequamos o projeto, convencemos o Ministério a liberar mais recursos. Vamos ter no Carlos Tortelly uma emergência qualificada com 24 leitos de observação, além de três de UTI e nove de UI (unidade intermediária) apenas no setor de emergência (hoje são 18 leitos de observação). Isso não é gogó. Foi dinheiro que conseguimos, cerca de R$ 1,6 milhão para essa reforma do Carlos Tortelly, além de mais verbas para equipamentos. Ainda temos na conta verba para a ampliação da UPA do Mário Monteiro e para a construção de novas unidades básicas. Só este ano são mais R$ 40 milhões em novos investimentos. Inauguramos ainda uma central de regulação. Isso permite saber onde é possível encontrar leitos. Eu tinha dois caminhos: ou eu ficava na zona de conforto ou enfrentava os desafios de recursos humanos, qualificava e abria leitos. Com dez meses num cenário de crise, não tem como fazer milagre.”

Antonio Pedro

“Deixar fechar o Antonio Pedro foi um erro. Se eu sou o secretário, não deixava fechar. No limite máximo da negociação, a prefeitura teria que ter pedido dois anos para reorganizar o atendimento na cidade. Mas essa discussão da reabertura da emergência do Hospital Universitário Antonio Pedro não está esgotada. Não joguei a toalha. É claro que é preciso também haver uma decisão da universidade, reconhecendo a necessidade de reabrir a unidade. E acho que eles não estão surdos a isso. Há um sentimento, uma vontade na cidade e uma cobrança para reabrir. Nós temos agora o novo POA (Plano Operativo Anual), em que repactuamos recursos federais para o hospital. Pode ser esse o momento de colocar as cartas na mesa. E vamos colocá-la na pauta de discussão. Lá, teremos a oportunidade de assinar uma pactuação com o MEC e o Ministério da Saúde. Aliás, seria uma boa oportunidade de ele (Tarcísio Rivello, diretor do hospital) assinar, já que é aniversário da cidade.”

Fonte: O Globo Niterói


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