segunda-feira, 25 de março de 2013

Marina da Glória: Alfredo Sirkis apresenta a sua opinião sobre a polêmica das obras

Reproduzo aqui um artigo elucidativo de autoria do deputado Alfredo Sirkis, sobre a polêmica envolvendo as obras na Marina da Glória. Sirkis apresenta fatos, detalhes e a sua opinião sobre o projeto e ajuda aos interessados no debate a formar a sua própria opinião:

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Blog do Sirkis: Marina inglória

Alfredo Sirkis

Acompanho o conflito envolvendo a Marina da Glória há muitos anos. É mais um desses imbróglios tipicamente cariocas, jogo de soma zero. Mas afinal, o que querem fazer na Marina? Um espigão? Um shopping center? Uma “privatização” que impeça os cariocas comuns de frequenta-la tornando-a propriedade exclusiva dos milionários donos de iates? Já ouvi isso tudo de furiosos detratores dos vários projetos apresentados ao longo do tempo. Muitos logo confessavam que, afinal, não conheciam o projeto (“não vi e não gostei”) mas que isso não era relevante pois se tratava de uma “questão de princípio”.
 
Na origem dos conflitos, desde os anos 90, havia uma posição, de princípio, de um dos veteranos membros do Conselho do IPHAN, Ítalo Campofiorito. Durante muito tempo ele se recusava a examinar os projetos sugeridos argumentando que era “área tombada”, desde 1965, e que como tal nada poderia ser feito ali. Respeitado e bem relacionado, Ítalo mobilizou alguns “formadores de opinião”, colunistas, que passaram o bombardear os vários projetos que iam se sucedendo.

Um outro vetor de impasse foi a relação hostil entre o então concessionário da marina, desde 1996, e o corpo técnico do IPHAN resultante de uma liminar que ele conseguira na justiça contra o órgão. Somaram-se à contestação o Ministério Público alguns ambientalistas e políticos. Para o grande público ficou a impressão que algo de enorme, grotesco e excludente estava sendo urdido para tomar um pedaço do Parque do Flamengo dos cariocas.

Pouco antes de deixar a secretaria de urbanismo, no início de 2006, tive de lidar com o problema e estuda-lo. Ele acabou ficando para meu sucessor. Coube-me começar a avaliar um projeto do arquiteto Paulo Casé encomendado pelo então concessionário. Estudei o projeto bem como todos os anteriores.

Nunca tive uma posição “de princípio” contrária a qualquer projeto ali. Afinal, do lado oposto do Parque, bem em frente ao Pão de Açucar --em área paisagisticamente muito mais nobre que aquela enseada junto à cabeceira da pista do Santos Dummont-- temos, desde os anos 70, o restaurante Porcão/Rio’s , que não chega a ser um primor visual.

O projeto de Paulo Casé era bem resolvido do ponto de vista paisagístico com uma boa preservação da visada do Pão de Açucar. Fiz uma série de críticas e restrições sobretudo à volumetria, na minha visão excessiva para o local, e à solução dada ao estacionamento. Advoguei, por exemplo, uma redução dos quase 36 mil m2 que para algo mais próximo dos 19 mil do único projeto anterior aprovado pelo IPHAN, em 1987, de Roberto Burle Marx, o autor do estupendo projeto paisagístico do parque do Flamengo e Garcia Roza.

O projeto de Casé, junto com uma plataforma de barcos prevista para o outro lado da enseada, junto ao aeroporto, sofreram bombardeio intenso com algumas críticas pertinentes e outras desinformadas. Bateu na trave.

E a Marina continuou com suas áreas semi-baldias, suas tendas brancas encardidas --estruturas “provisórias” que vão se perpetuando-- com um programa parecido ao denunciado nos projetos mais recentes: lojas, restaurante, feiras, shows, eventos. Mas tudo toleravelmente mambembe...

O então concessionário, cansado de tantos conflitos e temendo ainda maiores prejuizos desistiu da briga e vendeu sua concessão para o empresário Eike Batista. O flamboyant Eike inseriu a Marina num contexto mais geral integrado com a recuperação do Hotel Glória. Sua capacidade de investimento é muito maior, mas, por outro lado, atrai mais hostilidade pela sua peculiar imagem pública.

Encomendou um novo projeto ao arquiteto Índio da Costa. Atualmente assistimos a uma aparente reprise do ocorrido em 2006 mas, na verdade, a situação evoluiu.

Recentemente tive oportunidade de examinar uma versão atualizada do projeto de Indio da Costa. Com 26 mil m2 ela apresenta uma volumetria mais próxima do que eu aconselhava na época para o projeto do Casé e resolve a contento o problema do estacionamento que me preocupava. É um projeto de qualidade do ponto de vista paisagístico e ambiental.

É de justiça reconhecer que a resistência ao projeto do Casé dos técnicos do IPHAN, de Campofiorito e da promotora Gisele Porto acabaram contribuindo para uma solução melhor para a Marina. Pelo que me informaram a posição deles evoluiu de uma rejeição de princípio que me parecia equivocada para uma discussão do projeto, em si. O ganho que o mesmo teve com isso é evidente.

Paisagisticamente --minha grande preocupação-- é de todos projetos o melhor resolvido. Interfere menos e preserva mais sua harmonia que os de Burle Marx, de 1987 e o de Casé, de 1996, que já tinham essa preocupação.

Curiosamente, dos três o que mais interferia verticalmente na paisagem era o primeiro. Possuía, restaurante, auditório, “prédio da marina”, “umbráculo”, anfiteatro de golfinho, 150 aquários e um elemento vertical --um farol-- um seis metros mais alto que o atual que tem 14,3 metros no ponto mais alto.

O projeto de Burle Marx e Garcia Roza provavelmente encontraria hostilidade semelhante nos dias de hoje. Aliás, o próprio Aterro do Flamengo concebido e executado por Lotta Macedo Soares, Eduardo Reidy e Burle Marx, seria atualmente impensável! E, no entanto, quem poderia dizer em sã consciência que seria melhor para o Rio de Janeiro se o Parque do Flamengo não existisse?

Um pouco mais baixo que as tendas atuais e quase seis metros que o prédio do MAM o projeto atual interage bem com a paisagem inclusive em função dos seus telhados verdes gramados. Possui uma área de lojas (24 espaços para abrigar 50 lojas) restaurantes (2) e uma área de eventos variados, separada por uma promenade.

Dizer que ali haverá um “espigão” ou um “shopping center” é simplesmente delirante. A acessibilidade ao público à Marina ficará bem melhor resolvida que na situação atual, eliminando-se o conflito entre os carros e a faixa compartilhada de pedestres e ciclistas.

O estacionamento permanece exatamente no lugar do atual, diferente do projeto anterior que o ampliava para a área dita de “piquenique”, na concepção original de Reidy e que agora volta a sua destinação original.

Qualquer olhar com um mínimo de boa fé admitirá que o projeto, depois de tanta polêmica, ficou bem resolvido. Mas as outras objeções? As “de princípio”? A Marina está sendo “privatizada”? Está sendo seccionada do Parque do Flamengo?

Do período em que foi desmembrada do Parque, nos anos 70, até 1996, quando sua operação foi concedida, a Marina fora diretamente administrada pela Prefeitura. Aquela foi sua pior fase de abandono e degradação ao fio ao cabo de sucessivas administrações. Era mal gerida, insegura e suja. As pessoas tinham medo de frequenta-la. Sua concessão trouxe um ganho de gestão.

Não há razão objetiva alguma para uma marina ficar sob administração direta da prefeitura gastando do seu orçamento --que tem outras prioridades-- e limitada por um regime de execução orçamentária, compras e contratações sem a menor agilidade. É muito mais lógico desonerar a prefeitura de gerir diretamente uma marina e permitir que um concessionário o faça.

Isso, no entanto, implica em permitir algumas atividades como restaurantes, comércio e eventos, compatíveis, para financiar a atividade de guarda e manutenção das embarcações que, por si só, não sustentaria uma marina a não ser que se cobrasse tarifas que só os donos de iates conseguiriam pagar. Elas também permitem que o público usufrua daquele espaço, não apenas dos donos das embarcações.

A marina é “tombada” portanto intocável ? Está claro, juridicamente que, desde os anos 70, ela não faz parte da área tombada do Parque. Mas como fica no “entorno de bem tombado” os órgãos de patrimônio continuam a ter ingerência sobre o projeto. Mas cai por terra a argumentação de que ali “nada pode” --salvo aquelas horríveis tendas encardidas, “provisórias” que o jeitinho brasileiro torna permanentes.

Os desavisados ainda são uns tantos quantos. Outro dia ouvi no rádio uma feroz diatribe contra os coitados dos técnicos do IPHAN --de cuja correção ética nunca duvidei, mesmo quando criticava sua postura rígida-- agora acusados de “levar grana do Eike Batista” ou o prefeito, que pouco apita no projeto, mas torna-se alvo de imaginários anátemas de além túmulo. Há também a imprensa grã-paulistana e os políticos protestadores (hay protesto, soy a favor!) sempre querendo tirar sua casquinha no Rio de Janeiro.

E temos, sobretudo, o “fator Eike”... Os que são contra o projeto da marina porque não gostam dele ou porque que ataca-lo lhes propicia boa exposição na mídia. Pessoalmente prefiro combater suas usinas a carvão. Em relação as suas variadas intervenções na cidade vou me reservar o direito de julgar caso a caso: o mérito de cada uma delas. Seu estilo empresarial, sua persona, seu personagem, simplesmente não me vêm ao caso.

Prefeiro analisar a Marina da Glória e seus sucessivos projetos com objetividade, sem idiossincrasias ou subjetividade pessoal ou ideológica. O fato é que nunca estivemos tão perto de uma solução para a Marina da Gloria. De tantos projetos sucessivos, questionados, darwinianamente, chegou-se pouco a pouco a uma solução.

Espero que não tenhamos mais uma partida "soma zero", até porque a Marina faz parte dos encargos olímpicos do Rio de Janeiro e com isso não convém brincar. Chega de inglória na Marina.
 
Para discutir a Marina é indispensável visualizar o que estamos discutindo:
 

A Marina hoje com suas estruturas "provisórias" mambembes: restaurantes, lojas e eventos, além da guarda de barcos.

O projeto de Burle Marx e Garcia Roza, aprovado pelo IPHAN, nos anos 80. Com 19 mil m2 e farol vertical.

O projeto de Paulo Casé: 36 mil m2...

...e uma interferência discreta na visada frontal.

Vista aérea da Marina, hoje, com suas tendas e terreno baldio ocasionalmente ocupado por tendas de eventos mambembes.

Pelo mesmo ângulo: o atual projeto de Indio da Costa.

Outro ângulo. O estacionamento permanece (ganha um espaço embaixo).
 
 Fonte: Blog do Sirkis

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