Assim como aconteceu no ano passado com o drama de Santa Catarina, iniciamos o ano de 2010 sob o impacto das tragédias causadas pelas chuvas em várias partes do país. Dois destes acidentes foram deslizamentos de encostas ocorridos na cidade de Angra dos Reis e na Enseada do Bananal (Ilha Grande), destruindo parte da Pousada Sankay. Em ambos os acidentes, ocorreram mortes, que no total, somente no estado do Rio de Janeiro, foram em número maior que 70 fatalidades.
UMA REGIÃO VULNERÁVEL: A região da Costa Verde é muito vulnerável a essas catástrofes, devido às suas características naturais: relevo de montanhas escarpadas que se debruçam sobre o mar, chuvas frequentes e intensas, além de solos instáveis e muito suscetíveis à erosão e deslizamentos. O acidente da Enseada do Bananal é um exemplo didático do processo que leva ao deslizamento de grandes massas de terra, fenômeno que não é raro na região. As fotos do deslizamento mostram um embasamento rochoso, liso e muito elevado. O solo é raso, de pequena granulometria e alta capacidade de retenção de água. Em ocasiões de chuvas fortes, como verificou-se a partir do dia 30, a água percola o solo e, ao encontrar a rocha, tende a escorrer em direção à base da encosta. Gradativamente, esse movimento da água vai "lubrificando" o contato do solo com a rocha, fazendo com que se perca a aderência. O solo encharcado, com o seu peso aumentado, então, tende a se desprender. Forma-se o deslizamento, que costuma acontecer de forma muito rápida. Havendo residências no caminho, estas acabam sendo levadas pela avalanche de terra, rochas, troncos de árvores e outros detritos. No relato de alguns dos sobreviventes do acidente na Pousada Sankay, verifica-se que alguns sinais de que o problema aconteceria foram vistos mas não interpretados devidamente. Afirmaram que dias ou horas antes, viram o carreamento anormal de grande quantidade de sedimentos pelas drenagens naturais do terreno, a ponto de entulhar as praias próximas à pousada. Apesar disso, não é de se esperar que as pessoas - turistas frequentadores da pousada - pudessem antever a gravidade do problema. Foi uma fatalidade!!!!
UMA REGIÃO VULNERÁVEL: A região da Costa Verde é muito vulnerável a essas catástrofes, devido às suas características naturais: relevo de montanhas escarpadas que se debruçam sobre o mar, chuvas frequentes e intensas, além de solos instáveis e muito suscetíveis à erosão e deslizamentos. O acidente da Enseada do Bananal é um exemplo didático do processo que leva ao deslizamento de grandes massas de terra, fenômeno que não é raro na região. As fotos do deslizamento mostram um embasamento rochoso, liso e muito elevado. O solo é raso, de pequena granulometria e alta capacidade de retenção de água. Em ocasiões de chuvas fortes, como verificou-se a partir do dia 30, a água percola o solo e, ao encontrar a rocha, tende a escorrer em direção à base da encosta. Gradativamente, esse movimento da água vai "lubrificando" o contato do solo com a rocha, fazendo com que se perca a aderência. O solo encharcado, com o seu peso aumentado, então, tende a se desprender. Forma-se o deslizamento, que costuma acontecer de forma muito rápida. Havendo residências no caminho, estas acabam sendo levadas pela avalanche de terra, rochas, troncos de árvores e outros detritos. No relato de alguns dos sobreviventes do acidente na Pousada Sankay, verifica-se que alguns sinais de que o problema aconteceria foram vistos mas não interpretados devidamente. Afirmaram que dias ou horas antes, viram o carreamento anormal de grande quantidade de sedimentos pelas drenagens naturais do terreno, a ponto de entulhar as praias próximas à pousada. Apesar disso, não é de se esperar que as pessoas - turistas frequentadores da pousada - pudessem antever a gravidade do problema. Foi uma fatalidade!!!!
A OCUPAÇÃO E SUAS CONSEQUÊNCIAS: Apesar da fragilidade, devido à sua especial beleza cênica, a região passou a ser justamente reconhecida como um paraíso, tornando-se, consequentemente, o foco de intensa cobiça imobiliária. Proliferaram hotéis, pousadas, marinas, condomínios e mansões que, mesmo cercadas de luxo, nem sempre seguiram os melhores cuidados ambientais. Hoje, pode-se dizer que a Costa Verde foi tomada por empreendimentos que abrigam “uma boa parte do PIB brasileiro”, considerando o alto poder aquisitivo dos proprietários e frequentadores da região. Os antigos moradores - pescadores e caiçaras - tiveram as suas posses adquiridas pelos novos interessados. Acabaram deixando as praias, onde habitavam tradicionalmente. Alguns se deslocaram morro acima, perto de onde moravam, e viraram caseiros dos donos de suas antigas terras. Outros migraram para Angra dos Reis e Parati, estabelecendo-se nas áreas disponíveis, ou seja, em áreas de risco, como encostas e manguezais. Lá, somaram-se a outros migrantes que chegaram à região atraídos pela expectativa de emprego na industria naval e pelas obras (usina nuclear, etc).
DEFICIÊNCIAS DA GESTÃO PÚBLICA: O problema é que o poder público nunca geriu o uso do solo com eficiência. Planejou mal, não implantou o pouco que planejou e permitiu a ocupação de áreas de risco como encostas, mangues e não foi capaz de impedir que áreas ambientalmente frágeis também tivessem o uso inadequado. E isso não aconteceu por falta de instrumentos, pois a região era uma das mais regulamentadas do país. Os municípios (Angra e Parati) tem a sua parte de responsabilidade, mas a maior parte da regulamentação é estadual (principalmente) e federal. Cerca de 80% do território de Parati é coberto por unidades de conservação federal (Parque Nacional da Serra da Bocaina e APA Cairuçu), enquanto cerca do mesmo percentual de Angra é coberta por unidades de conservação estadual (APA Tamoios, Parque Estadual da Ilha Grande, Reserva Biológica da Praia do Sul, Parque Estadual Cunhambebe). Isso tem sido mais um fator de conflito e confusão. É como se a regulação do uso do solo da região estivesse sob intervenção federal ou estadual. A Ilha Grande, por exemplo, chegou a ter vários instrumentos legais superpostos regulando o seu uso: Parque Estadual, APA, Reserva Biológica, Plano Diretor Municipal, etc. Em 1987, toda a ilha foi transformada em Reserva Biológica por um decreto assinado por Brizola. Pensava-se, na época, que por ser a mais restritiva de todas as categorias de unidades de conservação, a medida estancaria a ocupação da Ilha. O resultado foi péssimo. O Decreto “não pegou” e desmoralizou toda a legislação que incidia sobre a área, pois se era possível ignorar aquele instrumento legal, como fazer cumprir os demais? Por outro lado, a legislação, os procedimentos administrativos ou a ênfase das autoridades, nem sempre está com o foco certo, ou seja, voltada para as questões mais relevantes. Como exemplo, citamos a atenção que as autoridades tem dispensado (principalmente o Ministério Público), para o controle das irregularidade da construção de atracadouros (pier, ponte, cais, decks, etc.), apesar de quase sempre com razão, em detrimento de preocupação com os riscos geotécnicos das intervenções. Isso nas está na cultura das instituições e, agora, depois dos últimos acidentes, é prometido pelo governo.
APESAR DOS PROBLEMAS, A ILHA GRANDE AVANÇA: No atual governo, o imbróglio jurídico ganhou uma ótima medida para a sua solução. O governador Sergio Cabral providenciou a revogação de todos os decretos e leis conflitantes e a abrangência do Parque Estadual da Ilha Grande, antes restrito apenas a uma parte do sudeste da Ilha, passou a valer para quase toda a ilha. A excessão ficou apenas para as áreas já ocupadas e onde já era considerado Reserva Biológica da Praia do Sul. Além disso, a partir de um belo planejamento desenvolvido pelo biólogo Paulo Bidegain, o parque recebe um investimento que deve ser o maior em execução em uma unidade de conservação no país. Caso mantenha-se o ímpeto de ordenamento e de priorização, estaos certos que a Ilha Grande será um modelo de conservação e uso sustentável para o país.
DEFICIÊNCIAS DA GESTÃO PÚBLICA: O problema é que o poder público nunca geriu o uso do solo com eficiência. Planejou mal, não implantou o pouco que planejou e permitiu a ocupação de áreas de risco como encostas, mangues e não foi capaz de impedir que áreas ambientalmente frágeis também tivessem o uso inadequado. E isso não aconteceu por falta de instrumentos, pois a região era uma das mais regulamentadas do país. Os municípios (Angra e Parati) tem a sua parte de responsabilidade, mas a maior parte da regulamentação é estadual (principalmente) e federal. Cerca de 80% do território de Parati é coberto por unidades de conservação federal (Parque Nacional da Serra da Bocaina e APA Cairuçu), enquanto cerca do mesmo percentual de Angra é coberta por unidades de conservação estadual (APA Tamoios, Parque Estadual da Ilha Grande, Reserva Biológica da Praia do Sul, Parque Estadual Cunhambebe). Isso tem sido mais um fator de conflito e confusão. É como se a regulação do uso do solo da região estivesse sob intervenção federal ou estadual. A Ilha Grande, por exemplo, chegou a ter vários instrumentos legais superpostos regulando o seu uso: Parque Estadual, APA, Reserva Biológica, Plano Diretor Municipal, etc. Em 1987, toda a ilha foi transformada em Reserva Biológica por um decreto assinado por Brizola. Pensava-se, na época, que por ser a mais restritiva de todas as categorias de unidades de conservação, a medida estancaria a ocupação da Ilha. O resultado foi péssimo. O Decreto “não pegou” e desmoralizou toda a legislação que incidia sobre a área, pois se era possível ignorar aquele instrumento legal, como fazer cumprir os demais? Por outro lado, a legislação, os procedimentos administrativos ou a ênfase das autoridades, nem sempre está com o foco certo, ou seja, voltada para as questões mais relevantes. Como exemplo, citamos a atenção que as autoridades tem dispensado (principalmente o Ministério Público), para o controle das irregularidade da construção de atracadouros (pier, ponte, cais, decks, etc.), apesar de quase sempre com razão, em detrimento de preocupação com os riscos geotécnicos das intervenções. Isso nas está na cultura das instituições e, agora, depois dos últimos acidentes, é prometido pelo governo.
APESAR DOS PROBLEMAS, A ILHA GRANDE AVANÇA: No atual governo, o imbróglio jurídico ganhou uma ótima medida para a sua solução. O governador Sergio Cabral providenciou a revogação de todos os decretos e leis conflitantes e a abrangência do Parque Estadual da Ilha Grande, antes restrito apenas a uma parte do sudeste da Ilha, passou a valer para quase toda a ilha. A excessão ficou apenas para as áreas já ocupadas e onde já era considerado Reserva Biológica da Praia do Sul. Além disso, a partir de um belo planejamento desenvolvido pelo biólogo Paulo Bidegain, o parque recebe um investimento que deve ser o maior em execução em uma unidade de conservação no país. Caso mantenha-se o ímpeto de ordenamento e de priorização, estaos certos que a Ilha Grande será um modelo de conservação e uso sustentável para o país.
Outro fato a celebrar é a realização, em 2008, do concurso público para o INEA, o que permitiu equipar o órgão com um maior efetivo de técnicos para cumprir as suas atribuições legais. Só isso, já foi um grande avanço. Os órgãos ambientais do Estado do Rio de Janeiro, criados a partir de 1975, NUNCA tinham tido um concurso público!!!!
LICENCIAMENTO AMBIENTAL - RIGOR EM EXCESSO OU PERMISSIVIDADE? Na minha experiência de presidente da Feema por duas vezes e de subsecretário de Meio Ambiente do RJ, aprendi as dificuldades da atuação na região. A excessiva e restrita normatização do uso do solo da região requer uma revisão de procedimentos, não para diminuir o rigor, mas para que as regras sejam mais claras e o controle mais eficiente. Os órgãos ambientais sempre foram acusados de excesso de rigor pelos proprietários e empreendedores locais. Por outro lado, os mesmos interessados, depois que já compraram o seu pedacinho de paraíso (normalmente um lote, em um parcelamento de dezenas ou centenas de outros lotes), sentem-se afrontados quando o vizinho quer fazer o mesmo que ele, construir. Então, nesse caso o mesmo órgão que ele acusava de rigoroso, é omisso. E não é raro que certos "poderosos", que abundam na região, considerem ser possível burlar as regras estabelecidas, fazendo suas obras (algumas suntuosas e até assintosas, perigosas para o meio ambiente, desproporcionais e de péssimo gosto e sem harmonia com o paisagem), a revelia dos órgãos ambientais e depois tentando atuar junto aos amigos políticos para que a sua irregularidade seja relevada. Esses casos, quase sempre, em conflito com os órgãos ambientais e com o Ministério Público, acabam judicializados.
Uma coisa é certa. Não podemos culpar quem critica a falta de fiscalização e controle. A presença do estado precisa se intensificar. Urge a modernização nos recursos de monitoramento e a implementação de um processo mais participativo de tomada de decisão, de modo que as medidas de gestão e controle tenham um maior lastro social, maior legitimidade e, portanto, mais efetividade.
UMA LAMENTÁVEL TRAPALHADA: Contraditoriamente com os avanços recentes que já comentamos, cometeu-se um grande erro que foi a publicação do Decreto 41.921/09, tornando as regras da ocupação da APA Tamoios mais permissivas do que antes. E, pior, a sua publicação foi feita à revelia do Conselho Gestor da APA, que vinha há anos debatendo um Plano de Manejo para a unidade. Em entrevista à Rede Globo, a secretária do Ambiente, Marilene Ramos, assumiu a responsabilidade pela iniciativa e admitiu que nenhuma medida administrativa (entende-se que licenciamentos ambientais, principalmente) foi tomada com base no referido Decreto. Apesar de não admitir que a apresentação do Decreto para a assinatura do governador tenha sido um erro, a declaração (do tipo: "sugerimos a medida ao governador mas, fiquem tranquilos, não estamos adotando as regras do Decreto") é o reconhecimento que, na verdade, a SEA entende o oposto, ou seja: equivocou-se.
CORRUPÇÃO: Há ainda mais um grave problema que a região precisa se livrar: a corrupção. O mais recente escândalo foi a Operação Cartas Marcadas, em 2007, que desvendou um esquema de fraudes em licenças ambientais. E a corrupção é um mal com duas faces. Não há corrupção sem corruptor. E a região da Costa Verde sempre foi uma das mais preocupantes quanto às irregularidades e desvios de conduta. De certo, a presença de um grande número de proprietários e empreendedores de alto poder econômico, estimula a corrupção. O problema é crônico e precisa ser combatido, pois a consequência das irregularidades é, quase sempre, a autorização indevida de atividades em desacordo com a legislação e com os cuidados ambientais que a região requer. Perde o meio ambiente, perde a coletividade.
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UMA LAMENTÁVEL TRAPALHADA: Contraditoriamente com os avanços recentes que já comentamos, cometeu-se um grande erro que foi a publicação do Decreto 41.921/09, tornando as regras da ocupação da APA Tamoios mais permissivas do que antes. E, pior, a sua publicação foi feita à revelia do Conselho Gestor da APA, que vinha há anos debatendo um Plano de Manejo para a unidade. Em entrevista à Rede Globo, a secretária do Ambiente, Marilene Ramos, assumiu a responsabilidade pela iniciativa e admitiu que nenhuma medida administrativa (entende-se que licenciamentos ambientais, principalmente) foi tomada com base no referido Decreto. Apesar de não admitir que a apresentação do Decreto para a assinatura do governador tenha sido um erro, a declaração (do tipo: "sugerimos a medida ao governador mas, fiquem tranquilos, não estamos adotando as regras do Decreto") é o reconhecimento que, na verdade, a SEA entende o oposto, ou seja: equivocou-se.
CORRUPÇÃO: Há ainda mais um grave problema que a região precisa se livrar: a corrupção. O mais recente escândalo foi a Operação Cartas Marcadas, em 2007, que desvendou um esquema de fraudes em licenças ambientais. E a corrupção é um mal com duas faces. Não há corrupção sem corruptor. E a região da Costa Verde sempre foi uma das mais preocupantes quanto às irregularidades e desvios de conduta. De certo, a presença de um grande número de proprietários e empreendedores de alto poder econômico, estimula a corrupção. O problema é crônico e precisa ser combatido, pois a consequência das irregularidades é, quase sempre, a autorização indevida de atividades em desacordo com a legislação e com os cuidados ambientais que a região requer. Perde o meio ambiente, perde a coletividade.
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Enfim, todos devem lamentar as tragédias do Reveillon de Angra, as mortes, os danos patrimoniais e ambientais. Como sempre acontece, e é compreensível, diante da indignação com a tragédia, que sempre expõem os erros na ação pública e privada, o momento é de cobranças por parte da sociedade e de se registrarem novas promessas dos governantes da vez. Mas, para que as promessas de agora não sejam esquecidas no tempo, como as do passado, é preciso a mobilização da sociedade em torno das mudanças e reparações necessárias.
E, como dizia Darci Ribeiro: que venham logo os “fazimentos”.
Com base na nota "Tragédia no paraíso", da Coluna Rumo Náutico, de Axel Grael. Jornal O Fluminense, Niterói, 09/01/10.
Com base na nota "Tragédia no paraíso", da Coluna Rumo Náutico, de Axel Grael. Jornal O Fluminense, Niterói, 09/01/10.
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