domingo, 9 de novembro de 2025

Presidência da COP divulga a 9ª Carta aos países para avanços no enfrentamento da Emergência Climática


O presidente designado da COP30 (assume a presidência oficialmente nesta segunda-feira), embaixador André Corrêa do Lago, publicou nesse sábado a Nona Carta da Presidência Brasileira. Leia o texto, a seguir:

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Prezadas amigas, prezados amigos,

Na continuidade do nosso Mutirão Global contra a mudança do clima, a Presidência brasileira da 30ª Sessão da Conferência das Partes (COP30) da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) apresenta sua nona carta à comunidade internacional. Esta carta trata do desafio decisivo de manter vivo o objetivo de 1,5 °C – respondendo à urgência climática por meio da aceleração da implementação e do fortalecimento da cooperação internacional.

Convido a comunidade internacional a enfrentar a verdade que nos aguarda em Belém. A COP30 representa um ponto de inflexão para o cumprimento do objetivo último da Convenção – o mesmo propósito que orienta o Protocolo de Quioto e o Acordo de Paris. Devemos escolher: permitir que a inércia nos conduza ao colapso, ou unir-nos, com coragem e cooperação, para conduzir o mundo ao avanço.

O Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) adverte que os riscos decorrentes da mudança do clima vão muito além do aumento na frequência e na intensidade dos eventos climáticos extremos. Cada incremento no aquecimento global eleva a probabilidade de mudanças abruptas e irreversíveis no sistema climático, inclusive aquelas desencadeadas quando pontos críticos de inflexão são alcançados. Essas transformações podem comprometer a resiliência dos sistemas sociais, econômicos e políticos, com consequências devastadoras. Em poucas palavras, desequilibrar os sistemas vitais da Terra pode precipitar um colapso sistêmico de economias, sociedades e instituições.
À beira dos pontos de inflexão: a Ciência se une ao nosso Mutirão Global

Lançado durante a Pré-COP30 (Brasília, outubro), o Relatório de 2025 sobre Pontos de Inflexão Globais confirmou que o mundo entrou em uma nova realidade. O aquecimento global caminha para ultrapassar 1,5 °C, empurrando a humanidade para uma zona de perigo na qual múltiplos pontos de inflexão podem desencadear transformações em cadeia e que se reforçam mutuamente. À medida que um sistema desestabiliza outro, o equilíbrio do qual depende a vida humana começa a se desfazer.

Os pontos de inflexão representam, portanto, uma interferência antrópica perigosa no sistema climático – exatamente o que a UNFCCC e o Acordo de Paris foram concebidos para evitar. A ciência adverte que minimizar o excedente além de 1,5 °C é essencial para evitar efeitos em cascata, mas a janela de ação está se fechando rapidamente. Cada fração de grau e cada ano além do limite de 1,5 °C fazem diferença.

A mesma ciência que nos alerta sobre os riscos também revela caminhos para a esperança. Ela mostra que é possível acionar pontos de inflexão positivos – limiares em que mudanças tecnológicas, comportamentais e sociais se aceleram em direção a um desenvolvimento de baixo carbono e resiliente. Quedas rápidas nos custos das energias renováveis já criam processos de retroalimentação positiva, impulsionando transformações mais velozes do que aquelas alcançadas por políticas públicas isoladamente. Ao conectar essas dinâmicas por meio da cooperação e da ação coletiva, a humanidade pode transformar a crise em regeneração. Entre as principais alavancas identificadas pelo Relatório sobre Pontos de Inflexão Globais estão infraestrutura pública digital, financiamento acessível para países em desenvolvimento, regeneração da natureza, instrumentos de política pública que orientam a transição energética e transições geridas pelas comunidades para enfrentar a fome, a pobreza e a desigualdade.

Pontos de inflexão positivos já começam a gerar efeitos em cascata em diferentes setores e regiões. Embora a janela de oportunidade esteja se estreitando, manter vivo objetivo de 1,5 °C ainda é possível – desde que a cooperação internacional seja direcionada para catalisar círculos virtuosos de transformação acelerada. Este é o momento de transformar o risco de pontos de inflexão planetários em oportunidade para uma guinada global.

De lacunas a alavancas: Acelerando a implementação, a solidariedade e a cooperação

Caminhos em direção a Belém ainda enfrentando grandes lacunas em ação e ambição climática global. O Relatório de Síntese das Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), publicado pelo Secretariado da UNFCCC, juntamente com o Relatório de 2025 sobre a Lacuna de Adaptação e o Relatório de 2025 sobre a Lacuna de Emissões, ambos do PNUMA, revelam um cenário preocupante.

Ainda assim, apesar dos desafios crescentes, a transição climática global já se afirma como uma tendência irreversível e um motor essencial do desenvolvimento sustentável – demonstrando que o Acordo de Paris está funcionando. A tarefa adiante é acelerar a implementação para manter 1,5 °C ao nosso alcance, ao mesmo tempo em que construímos resiliência aos impactos crescentes e compartilhamos os benefícios dessa transformação de forma justa e equitativa, entre países e dentro deles.

Registro meu apreço aos países que apresentaram novas NDCs em resposta ao primeiro Balanço Global (GST) e conclamo os demais a fazê-lo até a COP30.

Coletivamente, as novas NDCs apontam para uma redução projetada inédita nas emissões até 2035. Por meio da cooperação internacional e de esforços nacionais, a humanidade está curvando a trajetória das emissões para baixo pela primeira vez na história. Mas ainda não nos movemos rápido o suficiente. Nossa direção está melhorando, mas agora enfrentamos uma verdade inegável: precisamos de mais velocidade.

Esses resultados reforçam a urgência de transformar lacunas em alavancas de progresso. O desafio que se coloca não é apenas identificar o que falta, mas mobilizar o que impulsiona – converter os déficits de ambição, financiamento e tecnologia em forças de aceleração.

A ação climática já não pode mais se limitar a uma agenda linear de descarbonização. Ela deve ser impulsionada pelo desenvolvimento sustentável em todas as suas dimensões – social, econômica e ambiental – rumo a uma transformação não linear, exponencial em velocidade e escala. Essa abordagem multidimensional constitui a base das três prioridades interligadas definidas pela Presidência da COP30: (1) reforçar o multilateralismo e o regime climático sob a UNFCCC; (2) conectar o regime climático à vida real das pessoas e à economia real e; (3) acelerar a implementação do Acordo de Paris.

Na COP30, manter vivo o objetivo de 1,5 °C deve, portanto, continuar sendo nossa Estrela Polar. Para alcançá-la, devemos mobilizar as cinco dimensões da ação climática – mitigação, adaptação, financiamento, tecnologia e capacitação – orientados pelo Cruzeiro do Sul, nossa bússola de cooperação e equidade. Que as estrelas se alinhem em Belém. Que os hemisférios se encontrem rumo à transformação. Norte e Sul, Leste e Oeste – uma só humanidade, um só planeta.

De soluções ilusórias a um ecossistema de soluções

A COP30 não oferecerá uma única resposta às lacunas de implementação e ambição do mundo – porque nenhuma resposta isolada é capaz de corresponder à escala e à diversidade desse desafio. Em vez disso, Belém reunirá um conjunto de respostas, entrelaçadas entre as negociações, a Agenda de Ação, a Cúpula de Líderes e uma mobilização global – todas voltadas a acelerar a implementação e fortalecer a cooperação internacional.

A implementação acelerada deve tornar-se nosso novo parâmetro de ambição diante da urgência climática. Conclamamos todos os atores a trabalharem juntos para ampliar e acelerar significativamente a ação climática em todo o mundo, em todos os setores, níveis e esferas de atuação, como parte de uma mobilização global contra a mudança do clima.

Na COP30, nossa resposta coletiva à urgência climática deve se materializar por meio da implementação acelerada, da solidariedade e da cooperação internacional. Essas ações nos darão confiança, recursos e capacidade para estabelecer metas ainda mais ambiciosas. Financiamento, tecnologia e fortalecimento de capacidades devem evoluir de instrumentos de negociação para alavancas de transformação, permitindo que os países em desenvolvimento avancem com mais rapidez e alcance. Desde a mobilização do financiamento climático até a integração da agenda climática no sistema financeiro, precisamos avançar simultaneamente na provisão de recursos e no alinhamento de fluxos financeiros rumo a um desenvolvimento de baixa emissões e resiliente ao clima. Juntamente com a Presidência da COP29, a Presidência da COP30 espera que o “Mapa do Caminho de Baku a Belém para 1,3T” sirva tanto como um caminho para liberar esse potencial como uma ponte entre ambição climática e mudança sistêmica em nossa arquitetura financeira internacional.

Em minha sexta carta, de 19 de agosto, lancei as Consultas da Presidência da COP30, antecipando discussões que de outra forma ficariam restritas às duas semanas da Conferência. Essas consultas incluíram reuniões virtuais e encontros presenciais à margem da 80ª Assembleia Geral das Nações Unidas (Nova York, setembro) e da Pré-COP30. Senti-me honrado e inspirado pelo que ouvi. De todas as Partes, escutei um compromisso inabalável com o multilateralismo, com o Acordo de Paris e com resultados bem-sucedidos na COP30, capazes de enviar uma forte mensagem de unidade na celebração do décimo aniversário do Acordo de Paris. Todos reconhecemos que a transição climática é a tendência do nosso tempo, como observou o presidente da China, Xi Jinping. Há muito mais que nos une do que nos separa.

Também ouvi das Partes uma determinação clara de enfrentar as lacunas de implementação e ambição na COP30, por meio da aceleração da implementação e do fortalecimento da cooperação internacional, em especial nos meios de implementação – como parte dos esforços contínuos para limitar o aumento da temperatura global a 1,5 °C, levando em consideração as diferentes circunstâncias nacionais, trajetórias e abordagens, bem como as disposições legais, princípios e objetivos de longo prazo do Acordo de Paris.

Ouvi igualmente das Partes o quão orgulhosos estamos da arquitetura do Acordo de Paris que construímos juntos. Convido os países a chegarem à COP30 de cabeça erguida: o progresso e o legado institucional alcançados desde a adoção do Acordo de Paris na COP21 (Paris, 2015) são uma realização monumental. Com a conclusão do Livro de Regras de Paris na COP29 (Baku, 2024), a COP30 marcará a primeira conferência em que o ciclo de políticas do Acordo de Paris estará plenamente em funcionamento. NDCs, NAPs e GSTs periódicos, bem como a Estrutura Aprimorada de Transparência (ETF) – incluindo o primeiro ciclo de Relatórios Bienais de Transparência (BTRs) e a Consideração Multilateral Facilitadora do Progresso (FMCP) – não são meros processos burocráticos, mas uma demonstração inegável da sofisticação institucional do multilateralismo climático. Para além da UNFCCC, esse ciclo de políticas serve como sinal e guia para que atores e instituições se alinhem a decisões multilaterais e repositórios de recursos.

Conclamo todas as Partes a fazerem de nosso trabalho sob a agenda de negociações um verdadeiro Mutirão, capaz de transformar o ciclo de políticas do Acordo de Paris do desenho à entrega. A COP30 pode representar a maturidade do regime climático – a passagem da negociação para a implementação coordenada, ancorada na equidade, na ciência e na cooperação.

Uma Agenda de Ação Acelerada

Conectando ambição e implementação em seis eixos – de florestas, oceanos e sistemas alimentares a energia, transporte, cidades, finanças, empregos e tecnologia –, a Agenda de Ação foi concebida como uma plataforma para canalizar a cooperação e a coordenação globais em torno de pontos de inflexão positivos, guiada pelo resultado do primeiro Balanço Global (GST), acordado na COP28.

Mais do que um repositório de instrumentos, o celeiro de soluções torna-se agora um integrador de soluções. Combinadas, soluções existentes e emergentes podem tornar-se maiores do que a soma de suas partes. Ao mesmo tempo em que fortalece a transparência de iniciativas lançadas em COPs anteriores, os planos de aceleração da transição funcionarão como planos de ação para pontos de inflexão positivos – conectando iniciativas entre setores e regiões, de modo que se reforcem e multipliquem transformações, em vez de competirem por visibilidade.

Por meio dessa abordagem em rede, a COP30 encarnará a transição da governança pela negociação para a governança pela ativação – onde decisões se traduzem em implementação e compromissos evoluem em colaboração. A Agenda de Ação funcionará como um ecossistema vivo de implementação, conectando atores, recursos, mecanismos e processos a soluções concretas.

Ao longo dos dias temáticos da Agenda de Ação, a Presidência da COP30, em parceria com diversos atores, anunciará iniciativas emblemáticas voltadas a responder à urgência climática por meio da implementação acelerada e do reforço da cooperação internacional. A redução do metano e a restauração de florestas e ecossistemas representam medidas de ação rápida e de grande impacto. Elas são capazes de atuar como freios de emergência acionados pela humanidade – desacelerando o aquecimento global na década crítica que temos pela frente, mantendo 1,5 °C ao nosso alcance e protegendo os mais vulneráveis ao redor do mundo.

A COP30 também representa uma oportunidade histórica para unir as transições digital e climática em uma única transformação planetária. As tecnologias digitais podem oferecer a velocidade e a escala necessárias para acelerar o desenvolvimento de baixo carbono e resiliente ao clima em todo o mundo. A Presidência do G20 da Índia em 2023 demonstrou que uma infraestrutura pública digital (DPI) bem desenhada, ampliada pela inteligência artificial, pode viabilizar o uso de dados para acelerar o progresso rumo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) por meio de uma transformação digital inclusiva. Em apenas alguns anos, o ecossistema de pagamentos digitais PIX, no Brasil, transformou profundamente a economia e a sociedade brasileiras, impulsionando a inclusão financeira, o empreendedorismo e a prosperidade de empresas e cidadãos. No enfrentamento da mudança do clima, as aplicações de DPI podem abranger desde o compartilhamento de dados em tempo real para alertas precoces e resposta a desastres, até a geração de renda para pequenos agricultores que recebam pagamentos por práticas agrícolas sustentáveis, e para famílias que comercializam a energia que produzem por meio de sistemas descentralizados. O acesso aberto a dados e a interoperabilidade podem nos permitir criar uma rede inédita de inteligência planetária, capaz de acelerar a implementação e conectá-la às pessoas.

Aproveitando a transparência radical, a modularidade, a escala e a velocidade proporcionadas pela infraestrutura pública digital (DPI), a Presidência da COP30 tem trabalhado de perto com parceiros internacionais para fortalecer instituições e construir capacidades estatais. Instituições mais robustas – especialmente nos países em desenvolvimento – são fundamentais não apenas para o desenho e a implementação dos NAPs, NDCs e BTRs, mas também para o planejamento de longo prazo, a resposta a crises e a preparação para transições integradas em toda a administração pública, a sociedade e a economia rumo ao futuro. Com o apoio da cooperação internacional, instituições nacionais sólidas de planejamento e implementação podem permitir que os países em desenvolvimento aproveitem plenamente as oportunidades da transição climática, transformando NAPs e NDCs em planos nacionais de investimento de propriedade dos países, conectados ao financiamento internacional, aos mercados de capitais e às tecnologias de ponta.

O mundo vem à Amazônia: Quando fazemos a virada juntos

A COP30 acontecerá no coração da Amazônia, um ecossistema que sustenta a vida – e que hoje se encontra à beira de um ponto de inflexão irreversível. O Relatório de 2025 sobre Pontos de Inflexão Globais adverte que a mudança do clima e o desmatamento, em conjunto, colocam a floresta amazônica sob o risco de um colapso ecológico generalizado acima de 1,5 °C e abaixo de 2 °C, com consequências capazes de devastar a biodiversidade, desestabilizar os sistemas de chuvas em toda a América do Sul e ameaçar a vida de mais de cem milhões de pessoas que dependem da floresta para sua água, alimento e cultura.

A Amazônia encarna a verdade que nos aguarda em Belém: o futuro da humanidade e a saúde do planeta são inseparáveis. A floresta não é uma fronteira distante, mas sim um centro vivo do sistema climático global, o coração pulsante dos ciclos hidrológicos e uma guardiã do equilíbrio de carbono do mundo. Se a Amazônia ultrapassar seu ponto de não retorno, o planeta lutará para recuperar o equilíbrio.

Ainda assim, há esperança nos dados mais recentes. Em 2025, o Brasil registrou o terceiro ano consecutivo de queda no desmatamento da Amazônia, alcançando a terceira menor taxa da série histórica. Desde o início do governo do Presidente Lula, o desmatamento no bioma caiu 50% em termos acumulados. O Cerrado também registrou o segundo ano consecutivo de redução do desmatamento.

À medida que os esforços para combater o desmatamento avançam, o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF) inaugura uma nova forma de financiar a proteção das florestas tropicais – um mecanismo baseado em resultados, que recompensará os países com florestas tropicais por cada hectare conservado, ajudando a corrigir a falha de mercado que ainda torna as florestas mais valiosas destruídas do que em pé. O Brasil comprometeu-se com 1 bilhão de dólares para o TFFF, acolhe compromissos já anunciados e convida outros países e parceiros a apresentarem contribuições igualmente ambiciosas.

Como disse o Presidente Lula, a COP30 deve ser a COP da Verdade. Em Belém, a verdade deve encontrar a transformação, e a ciência deve tornar-se solidariedade. Podemos transformar nossa luta climática do colapso ao avanço. A COP30 pode ser a COP em que mudamos o rumo da luta climática.

Vamos puxar as alavancas juntos. Vamos mover o mundo. Mudando por escolha, juntos.

André Aranha Corrêa do Lago
Presidente Designado da COP30

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