O texto abaixo é de autoria do biólogo e ambientalista Paulo Bidegain da Silveira Primo, um dos maiores especialistas em parques e o maior conhecedor da gestão dos parques no estado do Rio de Janeiro. Há anos, Paulo debate e apresenta propostas para a efetiva implantação das unidades de conservação fluminenses, já tendo também arregaçado as mangas ao ocupar a função de vice-presidente do antigo Instituto Estadual de Florestas (IEF-RJ) e a Superintendência de Biodiversidade da Secretaria Estadual do Ambiente.
Como ambientalista, Bidegain foi um dos principais mentores da criação do Parque Estadual da Serra da Tiririca e sua implantação. A sua ação no governo estadual fez o Parque Estadual da Ilha Grande ter importantes avanços, na expansão dos seus limites, no planejamento, na infraestrutura e gestão, embora a sua ambição de transformar aquela unidade em um modelo de área protegida no RJ frustrou-se pela falta de continuidade após a sua saída.
Paulo Bidegain publica um Blog cuja consulta é indispensável para quem se interessa pela gestão de unidades de conservação no Rio de Janeiro, no Brasil e no mundo. Mesmo residente no Canadá, Paulo Bidegain está permanentemente conectado com o RJ e atento à nossa agenda ambiental.
O ponto levantado por Paulo é que nenhum órgão está estruturado suficientemente para gerir todas as demandas de conservação no RJ e que é preciso unir forças. Há tudo por se fazer nos parques e não podemos mais perder tempo. Com as compensações ambientais e outras formas de financiamento dos parques, a falta de recursos financeiros não pode mais ser a desculpa. O gargalo está na capacidade executiva dos órgãos responsáveis pelos parques.
Portanto, na implantação das unidades de conservação, o que importa é a capacidade de executar. Que assuma a liderança quem tiver os melhores meios para isso e que se valorizem as sinergias, não a competiçao. A SMAC - a secretaria de meio ambiente carioca - tem estrutura e recursos para assumir o PEPB, liberando o órgão estadual (INEA) para atuar onde há mais carência de estrutura, de investimentos e, portanto, onde a sua presença é mais necessária: no interior.
Enfim, o pior que se pode fazer aos parques é não discutí-los. Como Paulo exemplifica com inúmeros casos em seu Blog, parques são instrumentos de desenvolvimento econômico e social em diversos países, enquanto que aqui no Brasil, ainda são vistos como sorvedores de dinheiro e meros territórios excluídos do processo de desenvolvimento.
As consequências desta visão torta, todos nós conhecemos: historicamente menosprezados pela sociedade, e consequentemente pela administração pública, os parques não cumprem o seu papel ambiental e social, sendo condenados ao abandono e à degradação.
Que venha o debate. Com ele virá a ação.
O Blog do Paulo Bidegain é http://www.paquespark.blogspot.com/
Axel Grael
Localização do Maciço da Pedra Branca, localizado no coração da Cidade do Rio de Janeiro e próximo de muitas das futuras instalações olímpicas da Rio 2016. |
Copa do Mundo, Olimpíadas e a Municipalização do Parque Estadual da Pedra Branca
Paulo Bidegain
O Parque Estadual da Pedra Branca (PEPB) tem importância histórica. Foi em seu território que o Major Archer coletava as sementes e produzia mudas para recuperar a Floresta da Tijuca. O Parque era a menina dos olhos do Professor Darci Ribeiro e somente em 1992-1994 recebeu seus primeiros investimentos. Entre 2002 e 2005, mesmo sem qualquer plano de manejo ou projeto para guiar os investimentos, o PEPB recebeu vultosos recursos de compensação ambiental, totalizando mais de R$ 4 milhões.
Um Centro de Visitantes foi montado na antiga casa projetada pelo Arquiteto Zanine, ao lado de prédios para servir a administração, lanchonete e bobagens como minhocário e broméliario, que obviamente na primeira crise financeira foram abandonados. Ao memo tempo, recursos adcionais de razoável monta foram empregados pelo PDBG para construção de uma sub-sede e para estudo fundiário. E ainda assim o PEPB continuou de papel!
Pessoas foram contratados pelo IEF com recursos de compensação ambiental. Quando o dinheiro acabou foram mandados embora e o Parque voltou a sua minúscula equipe. Como resultado, já em 2006 uma parte significativa dos investimentos estavam perdidos, com suas instalações apresentando sérios problemas devido a falta de manutenção e ao abandono.
Depois de tanta trapalhada, não tenho dúvidas que o PEPB estaria hoje muito melhor se tivesse sido municipalizado, pois a Prefeitura do Rio de Janeiro detém muito mais condições de estruturar um parque que em essência é urbano. A cessão que defendo é definitiva, para que Prefeitura crie um Parque Natural.
Ainda uma ficção apesar de seus quase 40 anos, o PEPB tem enorme potencial natural e recreativo, cronicamente mal inventariado, planejado e aproveitado. Por estar cercado por áreas urbanas com grande adensamento e apresentar múltiplas entradas, sua gestão demanda uma quantidade de recursos humanos que só a Prefeitura pode disponibilizar e médio a curto prazo. A Administração do Parque Nacional da Tijuca, também cercada de áreas urbanas, há muito tempo percebeu que é impossível operar um parque urbano sem apoio da Prefeitura. Obviamente, o Governo Federal jamais abrirá mão do PN da Tijuca, um símbolo do Brasil com o Corcovado e múltiplas atrações e oportunidades de gerar receitas.
Exponho a seguir alguns motivos que reforçam a necessidade de municipalização.
Questão de Justiça
O Parque Estadual da Pedra Branca foi criado em 1974 pelo Governo do Estado da Guanabara, ex-Distrito Federal, através da Lei nº 2.377, de 28 de junho. Com a fusão em 1975, ao invés de seguir para o patrimônio do Município do Rio de Janeiro, como seria lógico, já que esta integralmente situado em seu território, foi incorporado como bem do Estado do Rio de Janeiro e entregue a então Secretaria de Estado da Agricultura. Esta injustiça fez com que sobrassem apenas espaços extremamente reduzidos para criar unidades de conservação municipais, já que o Governo Federal gerencia o Parque Nacional da Tijuca (PNT), no outro maciço.
A municipalização corrige a injustiça. A medida possibilitaria a Prefeitura administrar um espaço capaz de abrigar uma razoável diversidade biológica, já que hoje ela está restrita a gerir parques muito pequenos, quase que praças grandes, com capacidade muito limitada de manter biodiversidade. Junto com o Parque é necessário também ceder o Horto Florestal para que ele passe a funcionar sem tantas interrupções e com a minima condição.
Capacidade Operacional
Desde 1974, por nada menos que 37 anos, o Governo Estadual tem sido responsável pelo parque mais próximo da sede do órgão gestor (DRNR e IEF) e nem assim conseguiu implantá-lo. Entre 2002 e 2004 foram investidos mais de R$ 4 milhões, principalmente em infra-estrutura, sem qualquer visão estratégica. O Plano de Manejo não foi concluído. E nenhum esforço adicional foi feito para garantir a sustentabilidade do Parque, como parcerias com a Prefeitura e empresas privadas, concessões e diversas outras atividades. A WWF realizou estudo apontando dezenas de empresas ao redor. Ao que tudo indica, nenhuma delas foi contactada em busca de parceria.
Não tem lógica alguma, para o INEA, gastar somas consideráveis de recursos e alocar grande quantidade de pessoas para implantar e operar o PEPB, quando tem um desafio imenso de planejar e implantar os Parques no interior, a grande maioria em municípios economicamente debilitados que precisam deste tipo de empreendimento. O INEA tem que por empenho nos diversos parques existentes e que estão sendo criados e necessitam de quase tudo.
A Prefeitura do Rio de Janeiro tem plenas condições técnicas, operacionais e financeiras para assumir a gestão. A Fundação Parque e Jardins, com mais de 100 anos, tem mais experiência com Parques que o INEA, e pode muito bem cuidar do PEPB. Além disso, a Prefeitura dispõe da Guarda Municipal Ambiental.
Conclusão
A municipalização do Parque Estadual da Pedra Branca apóia-se nos seguintes motivos:
• Foi criado em 1974 pelo Estado da Guanabara; portanto, no processo de fusão deveria ter sido repassado ao município e não ao Estado;
• Situa-se integralmente no município do Rio de Janeiro;
• A Prefeitura do Rio de Janeiro, a segunda do país em receita, tem plena capacidade técnica e financeira de operar o parque e pode investir os recursos de ICMS Verde na tarefa;
• Os principais problemas a serem enfrentados são decorrentes da expansão urbana, detendo o município, melhores condições para enfrentar o desafio e promover uma gestão mais eficiente, como o Instituto de Parques e Jardins e a Guarda Municipal Ambiental;
• Permitiria ao Estado concentrar investimentos hoje dispersos em várias unidades de conservação naquelas mais estratégias, que detém maior biodiversidade e se encontram no interior;
O processo de municipalização pode ser gradativo, pois a Prefeitura não pode assumir imediatamente a gestão do Parque. A primeira ação pode ser a assinatura de Termo de Cooperação Técnica, com a criação de Grupo de Trabalho reunindo INEA, SMAC e Instituto Pereira Passos para definir os passos e avançar. O Plano de Manejo poderá propor novos limites para exclusão de favelas e outras ocupações antigas, além de ser ampliação para viabilizar a conexão com o PN da Tijuca. E o INEA pode ceder recursos a Prefeitura para os investimentos nos primeiros quatro anos.
Não estou propondo ao INEA livrar-se de um parque, mas sim entregá-lo para uma instância que pode melhor administrá-lo. A Prefeitura do Rio de Janeiro tem plenas condições de assumir o Parque da Pedra Branca e fazer a diferença, dotando-o da infra-estrutura e dos recursos humanos que ele merece.
Uma idéia factível seria criar um único parque natural setorizado, abragendo não só a área do PEPB, mas também as superfícies dos parques da Cidade, Chacrinha, Grajaú e Prainha, acrescido da Reserva Biológica de Guaratiba, que poderia ser chamado de Parque Natural do Rio de Janeiro. Depois de 36 anos, chegou a hora de transformar o Parque problema em Parque solução.
Em poucos anos teremos Copa do Mundo e Olimpíadas no Rio de Janeiro e o que estamos fazendo de significante para aproveitar a onda e preparar os “parques da copa”, como os Parques Estaduais da Pedra Branca e da Tiririca para visitação, ambos na região metropolitana? Muito pouco no primeiro e nada no segundo. Hora de agir e fazer ações que efetivamente mudem a realidade. E o melhor projeto é municipalizar.
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Leia também a opinião de Paulo Bidegain sobre a gestão das APAs do Rio de Janeiro.
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