sábado, 29 de novembro de 2025

PL DA DEVASTAÇÃO É A MAIOR DAS "BOIADAS": Congresso Nacional promove vergonhoso desmonte do licenciamento ambiental


Publicado pelo ClimaInfo.

Em 2020, num vídeo que tornou pública uma sombria reunião ministerial, o famigerado (anti)ministro do Meio Ambiente do governo Bolsonaro, Ricardo Salles, - de péssima recordação - dizia que aproveitaria que "a atenção da mídia estava voltada para a crise sanitária da COVID-19" para "abrir a porteira e passar a boiada" e promover o desmonte da legislação ambiental brasileira. Não conseguiu, mas seus colegas nos segmentos mais retrógrados do parlamento nacional conseguiram alcançar a nefasta façanha.

A lei foi engendrada pelo Centrão, pelos ruralistas e outras forças reacionárias, principalmente de atuação na Amazônia, reforçados por políticos de outras regiões do país e ligados a setores econômicos, como mineração e outros. Havia em seus defensores um objetivo explícito de remover os "obstáculos" que a legislação do licenciamento ambiental impõe a projetos lesivos ao meio ambiente. 

Importante entender que o licenciamento ambiental foi concebido como uma forma de fazer a mediação entre os empreendimentos e a sociedade, para dar transparência a intervenções que podem mudar lugares, cidades e regiões, assegurar o cumprimento da legislação, confirmar a qualidade do projeto e o uso da melhor técnica, prevenir impactos ambientais evitáveis e garantir de que não haverá maiores riscos para a população e ao meio ambiente. Sem esse instrumento, a sociedade e o meio ambiente estarão desprotegidos e estaremos a mercê de um "liberou geral". Portanto, o licenciamento ambiental é um mecanismo de garante a busca pela sustentabilidade.

Com a nova lei, o caminho estará aberto para a implantação de megaprojetos polêmicos e de grande potencial impactante, como a pavimentação da BR 319, uma estrada federal que conecta Manaus (AM) e Porto Velho (RO) por uma extensão de 885 km através da Floresta Amazônica, facilitando o desmatamento e ocupação da parte mais bem conservada da Amazônia. É o caso também da implantação de hidrovias e da exploração do petróleo na Amazônia (objeto de duras críticas recentemente na COP30) e outras iniciativas que, sem os devidos cuidados e gerenciamento público - com transparência e controle social - poderão resultar na destruição da Amazônia. Importante lembrar que estes projetos têm apoios graúdos dentro do próprio governo federal, tão infiltrado das mesmas forças retrógradas no Congresso Nacional.

Outros biomas, como a Mata Atlântica, também foram afetadas, uma vez que a Lei da Mata Atlântica foi enfraquecida. Importante lembrar que muitas das iniciativas e metas apresentadas ao mundo pelo governo brasileiro na COP30,  como a contenção do desmatamento e controlar as queimadas, serão inviabilizadas.

Derrubada dos vetos

Como avaliei aqui no Blog, o PL é muito ruim e continha muitas inconstitucionalidades e equívocos técnicos. Por isso, 63 dos seus artigos foram vetados. As bancadas do Centrão e bolsonaristas, sob o comando do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) e seus aliados ruralistas, promoveram uma vergonhosa e irresponsável derrubada de 56 vetos, ou seja, quase todos os vetos feitos pelo presidente Lula, sem ouvir os argumentos técnicos e jurídicos da Presidência, sem ouvir o clamor da sociedade e a ciência. De forma sorrateira e covarde, esperaram passar a COP30 para evitar uma repercussão ainda maior, que certamente a medida alcançaria com mais força a imprensa internacional.

Com a derrubada dos vetos, voltam a valer medidas polêmicas que foram muito criticadas, como as seguintes: 

  • Autolicenciamento (Licença por Adesão e Compromisso): prevista para atividades a serem consideradas de baixo impacto ambiental.
  • Isenção de licença para atividades rurais: atividades agrosilvopastoris em propriedades que tenham o CAR, mesmo que pendente de análise, ficam dispensadas de licenciamento ambiental.
  • Terras indígenas e quilombolas: a consulta a esses povos só será obrigatória se as terras estiverem homologadas ou tituladas.

A argumentação mais ouvida de "suas excelências", os defensores do PL da Devastação, é que ele viria para destravar e acelerar a implantação da infraestrutura tão desejada ao país. Aqui temos mais uma falácia: o licenciamento ambiental é uma atividade muito conflitiva por sua finalidade de mediação. Atividades que mudam a realidade, a vida das pessoas e o meio ambiente sempre serão conflitivas, tendo quem ganha e quem perde. Portanto, o melhor que se pode fazer é buscar a conciliação dentro do processo de licenciamento ambiental. Caso não aconteça, o conflito persistirá, causará injustiças ou será mediado em outras instâncias. O mais provável é que seja judicializado! Portanto, ao contrário do que se argumenta, o enfraquecimento do licenciamento levará à insegurança jurídica e a uma maior demora na aprovação de empreendimentos.

Importante lembrar ainda, que o retrocesso da legislação ambiental brasileira causará prejuízos nas negociações comerciais brasileiras, como o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, importante para a economia brasileira, que já se arrasta há anos. Portanto, o ataque à legislação ambiental poderá ser mais um "tiro no próprio pé" de setores que apoiaram a medida. 

Veja aqui os parlamentares do RJ que votaram contra o meio ambiente e contra o Brasil:

DEPUTADOS DO RJ QUE VOTARAM CONTRA O MEIO AMBIENTE E NÃO MERECEM O SEU VOTO NA PRÓXIMA ELEIÇÃO

  • Carlos Jordy (PL)
  • General Pazuello (PL)
  • Ricardo Abrão (União Brasil)
  • Roberto Monteiro (PL)
  • Sargento Portugal (Podemos)
  • Sóstenes Cavalcanti (PL)
  • Luiz Carlos Gomes (Republicanos)
  • Dani Cunha (União Brasil)
  • Altineu Cortes (PL)
  • Bebeto (PP)
  • Chris Tonietto (PL)
  • Doutor Luizinho (PP)
  • Gutemberg Reis (MDB)
  • Hugo Leal (PSD)
  • Hélio Lopes (PL)
  • Murillo Gouvea (União Brasil)
  • Jorge Braz (Republicanos)
  • Júlio Lopes (PP)
  • Juninho do Pneu (União)
  • Max Lemos (PDT)
  • Luiz Lima (Novo)
  • Luiz Antônio Correa (PP)

O que mostra ainda mais a irresponsabilidade dos parlamentares, é que a ação de desmonte da legislação ambiental teve também como forte motivação a retaliação contra o governo devido a interesses contrariados na disputa pela indicação do futuro ministro a ser nomeado em vaga aberta no Supremo Tribunal Federal - STF. É o futuro do país e do planeta utilizado como moeda de troca politiqueira! 

O Governo Federal e ambientalistas preparam-se para questionar a lei aprovada na Justiça. Novos rounds virão e que a razão e a responsabilidade com o futuro finalmente prevaleçam.

Axel Grael
Engenheiro florestal
Ambientalista
Prefeito de Niterói (2021-2024)
Presidente da FEEMA (1999-2000 e 2007-2008)

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LEIA TAMBÉM:

Agressão à ministra Marina e a tentativa de desmonte da política de licenciamento ambiental no Brasil
CONGRESSO APROVA O PL DA DEVASTAÇÃO: VETA, LULA!!!!!!!

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Congresso destrói licenciamento e derruba quase todos os vetos do PL da Devastação

Especialistas classificam decisão como "derrota histórica para o brasileiro"; governo e ambientalistas irão recorrer na Justiça.

O Congresso Nacional enterrou de vez o licenciamento ambiental brasileiro na 5ª feira (27/11). Deputados e senadores derrubaram 56 dos 63 vetos feitos pelo presidente Lula em agosto à Lei Geral do Licenciamento Ambiental – que os parlamentares transformaram no PL da Devastação. A derrota, ao contrário do que pensam os “nobres” congressistas, não é do governo. É de todos os brasileiros – inclusive dos lobbies econômicos que boa parte deles defendem.

A análise dos vetos foi convocada pelo presidente do Congresso, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e a votação semipresencial aconteceu menos de uma semana depois da COP30. Na Câmara, foram 268 votos para derrubar os vetos de Lula, contra 190 para mantê-los. No Senado, o placar foi de 50 a 18 pela derrubada.

Entre os pontos mais problemáticos vetados pelo presidente e liberados pelos parlamentares está a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que permite a possibilidade de licenciamento simplificado para projetos de médio potencial poluidor. Barragens como as de Brumadinho e Mariana entram nessa categoria. Com isso, cerca de 90% dos licenciamentos ambientais estaduais poderão ser feitos automaticamente, num clique. O autolicenciamento, assim, vira regra.

A Folha lista outros pontos problemáticos: toda atividade agropecuária extensiva passa a ser dispensada de licença ambiental, mesmo que tenha seu Cadastro Ambiental Rural (CAR) pendente de homologação; também ficam dispensadas de licenciamento grandes obras como a pavimentação da BR-319, que pode gerar emissão de 8 bilhões de toneladas de CO2 equivalentes (quatro vezes a emissão anual do Brasil), segundo o Observatório do Clima; estados e municípios podem agora estabelecer regras próprias de licenciamento; a Lei da Mata Atlântica foi enfraquecida com a flexibilização do corte das matas primárias e secundárias – agora, qualquer órgão estadual ou ambiental poderá autorizar a derrubada da vegetação.

“O Congresso Nacional acabou de enterrar o licenciamento ambiental, ao derrubar os vetos do Poder Executivo. Além de retrocesso criminoso na legislação ambiental, com simplificaçäo excessiva e prioridade para o autolicenciamento, os dispositivos que retornaram com a derrubada dos vetos colidem com os direitos dos indígenas e quilombolas, dão um cheque em branco para os entes subnacionais fazerem o que quiserem com o licenciamento, restringem o campo da aplicação do licenciamento ambiental e reduzem a responsabilidade das instituições financeiras, entre outros absurdos”, reforçou a coordenadora de Políticas Públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo.

Em comunicado, a FUNAI alertou que o PL da Devastação ameaça cerca de 297 Terras Indígenas e aumenta a vulnerabilidade das comunidades. N’O Globo, André Guimarães, diretor executivo do IPAM e enviado especial da sociedade civil para a COP30, considerou a derrubada dos vetos como uma “derrota histórica para o brasileiro”.

“Precisamos ser mais eficientes com o licenciamento ambiental, mas jamais ao custo de insegurança e riscos atuais e futuros para a população. Será que os ilustres senadores não entenderam o recado que a Natureza está nos dando? A COP30 deixa claro que ultrapassamos limites. Temos que repensar nossa relação com nossos rios e florestas”, afirma.

Sete vetos de Lula que não foram derrubados nesta sessão serão apreciados na próxima semana. É o caso da Licença Ambiental Especial (LAE), que foi incluída pelo presidente em uma medida provisória à parte. A MP tem mais de 800 emendas que também ressuscitam o PL da Devastação.

Entidades ambientais e o governo federal estudam ir à Justiça contra a lei. “Além de inconstitucional, expõe a risco a saúde e a segurança dos brasileiros, libera a destruição ampla dos nossos ecossistemas e viola as metas climáticas do país, que acabou de sediar a COP30”, declara o Observatório do Clima.

“Já falei com a ministra [do Meio Ambiente] Marina Silva e vamos conversar com a Casa Civil e com o nosso jurídico para ver o que podemos fazer para corrigir o curso dessa situação”, disse a ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, informa o Valor.

Agência Pública, CBN, Jota, Terra, Veja e Poder 360 também noticiaram a derrubada dos vetos de Lula ao PL da Devastação.

Em tempo: O Conversation chama de "descompasso ambiental" as decisões do Congresso Nacional em relação à vontade da maioria da população brasileira. Segundo estudo do Policy Brief Brasil, a maioria da população apoia políticas ambientais rigorosas e prioriza o combate ao aquecimento global. Enquanto isso, entre 2019 e 2023, as ações legislativas na Câmara dos Deputados foram predominantemente conduzidas por representantes com um perfil climático associado à emissão de gases de efeito estufa (GEE). O estudo também destaca a desinformação climática como um problema capaz de produzir efeitos relevantes.

Fonte: ClimaInfo



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