terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Niterói, Piratininga e o Clube da Esquina

 

Pouca gente sabia que o Clube da Esquina, um das mais importantes obras da MPB teve origem em Niterói, graças a uma temporada que artistas de Minas Gerais passaram numa casa alugada na Praia de Piratininga. A informação ganhou mais visibilidade graças a um depoimento do genial Milton Nascimento na televisão, atribuindo a Niterói esse momento de grande inspiração.

Tudo isso aconteceu bem pertinho de onde estamos agora implantando o Parque Orla de Piratininga Alfredo Sirkis, as ciclovias de Piratininga e onde estamos trabalhando para ajudar o estado a desobstruir o Túnel do Tibau.

Marcos Sabino, músico de Niterói e presidente da Fundação de Artes de Niterói - FAN, fez o belo texto abaixo, que foi publicado no jornal A Tribuna e reproduzo aqui.

Temos aqui mais um motivo para nos encher de orgulho e comemorar ainda mais os 450 anos de Niterói.

Axel Grael


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As canções do Marazul, Niterói e o Clube da Esquina

Marcos Sabino
Presidente da Fundação de Arte de Niterói

“Coisas que a gente se esquece de dizer / Frases que o vento vem às vezes me lembrar / Coisas que ficaram muito tempo por dizer / Na canção do vento não se cansam de voar”


Esses versos da canção “O Trem Azul”, de Lô Borges e Ronaldo Bastos, retratam com fidelidade atemporal o sentimento de qualquer niteroiense. Desde os da geração 70/80 até os jovens que nasceram muito depois e se encantaram ao ouvir melodias e letras de um disco gravado entre 1971/72 e não sabiam que esse grupo de mineiros, cariocas e um niteroiense escolheu uma casa na encosta rochosa do Marazul, em Piratininga, para que se inspirassem na criação das canções desse que se tornaria um dos discos mais importantes da discografia do mundo: O Clube da Esquina.

“Coisas que ficaram muito tempo por dizer”. Há alguns dias, Milton Nascimento, numa propaganda de uma empresa de aluguel de imóveis no horário nobre da TV Globo, contara para todo o Brasil que foi numa casa no Marazul que Lô Borges, Beto Guedes e ele compuseram as canções desse disco que mudou a história da vida deles. É preciso falar que o movimento dos mineiros nasceu em Belo Horizonte, no bairro de Santa Tereza, onde os músicos se encontravam para tocar e essa história está escrita em bons livros como ”Os Sonhos não Envelhecem”, de Márcio Borges, e “Coração Americano”, de Andréa Estanislau. A história da importância de Niterói para esse movimento realmente ficou muito tempo por dizer.





As canções desse disco não tocaram muito nas rádios, mas aquele LP duplo com dois meninos sentados num barranco ilustrando a capa era o sonho de consumo de ouvidos ávidos por tanta beleza melódica, harmônica e poética, numa tríade perfeita. Os discos solo do Milton eram sempre muito esperados. Artistas como Beto Guedes tiveram seus primeiros discos solos anos depois. Em 1978, Beto lançou “A Página do Relâmpago Elétrico” e Lô Borges, em 1979, vinha com o seu segundo LP “Via Láctea”, que trazia a canção “Clube da Esquina nº 2” (Márcio Borges, Lô Borges e Milton Nascimento). Essa canção mostrava para o Brasil a importância do Clube da Esquina para o mundo.

Embora Milton tenha vindo para Niterói trazendo apenas Beto Guedes e Lô Borges, muitos personagens frequentaram a casa do Marazul. Alguns deles são Wagner Tiso, Fernando Brant, Ronaldo Bastos (nascido em Niterói), Toninho Horta e tantos outros sócios desse que foi para muita gente o Clube mais importante da música brasileira.

Como músico, saber que a minha cidade contribuiu para essa linda história, como o próprio Milton fala no comercial, me faz entender muitas coisas, mas, ao mesmo tempo, pensar em como teria sido importante para a minha e tantas gerações ter vivido esse momento e ter tido essa referência mais próxima.

Por várias vezes, tentei descobrir onde era a casa em que o Milton morou. No Tibau, local próximo da casa original, muitos moradores tinham referências erradas. A foto do Milton sentado na areia com sua mãe mostra a casa na encosta que hoje está muito habitada, sem ser possível o reconhecimento preciso do local.





Para mim, a passagem do Clube da Esquina por Nikiti é muito especial. Uma viagem no tempo que só mesmo a música pode nos proporcionar. Saber que tantas canções que se cristalizaram no tempo foram compostas no nosso Marazul.

Tenho em minhas lembranças mais bonitas um momento que vivi quando, com doze anos, em 1972, eu esperava junto ao meu pai na fila para a barcaça que fazia a travessia dos carros na Baía de Guanabara e avistei o Milton comprando o bilhete na estação Arariboia. Saí do carro correndo e fui lhe pedir um autógrafo. Ele, com toda sua timidez, acariciou meu cabelo e sorriu para mim. Nunca esqueci essa imagem. Muito tempo depois, num congresso de compositores em Araxá, pude contar essa história para ele. Disse-lhe que eu sempre imaginei que ele e Fernando Brant tinham feito a música “Travessia” inspirados na travessia das barcas Rio-Niterói e ele, outra vez tímido, sorriu e me falou: “Essa também é uma linda travessia”.

Fonte: A Tribuna




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