sábado, 25 de janeiro de 2025

NEGACIONISMO CLIMÁTICO DE TRUMP É UM CRIME CONTRA O PLANETA, MAS EUA SERÃO OS MAIORES PERDEDORES

Imagem ONU Brasil

Trump anunciou que boicotará novamente a agenda climática mundial, mas logo perceberá que não é o dono do mundo e nem o dono do seu próprio país. Suas atitudes encontram muitas resistências e o seu afastamento da agenda climática poderá causar um sério dano geopolítico para os EUA.

Postei aqui no blog há poucos dias o artigo DE VOLTA ÀS TREVAS: as sombras da volta de Trump, onde analisei as ameaças e riscos do retorno de Donald Trump à presidência dos EUA e os seus impactos sobre a agenda das mudanças climáticas liderada pela ONU. Trump é um negacionista climático, faz disso uma das suas bandeiras políticas e influencia conservadores do mundo todo com a sua retórica e atitudes. 

Em 01 de junho de 2017, no seu primeiro governo, Trump retirou os EUA do Acordo de Paris, ato que por sua vez foi revogado pelo democrata Joe Biden logo ao assumir o governo, após derrotar Trump. No dia 20 de janeiro de 2025, dia da posse do seu segundo mandato, Trump assinou uma Ordem Executiva (decreto) para retirar os EUA do Acordo de Paris pela segunda vez. No artigo, ponderei que na primeira vez que isso aconteceu, foi um grande abalo nos meios da diplomacia climática, como constatei pessoalmente na COP 26, em Glasgow. Diante da perplexidade de todos, houve de fato uma paralisia nos avanços da agenda climática, com prejuízos enormes nesta ação que é tão emergencial. Na ocasião, o Brasil também estava entre os vilões, com o negacionismo climático de Bolsonaro. Um enorme constrangimento!

Eleição de Trump é um evento climático extremo’, diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima. Entrevista à Infoamazônia.

No entanto, Trump não é mais novidade para ninguém e o mundo saberá se proteger dos seus devaneios, principalmente num tema tão emergencial e decisivo para as atuais e futuras gerações. 

Acredito que no cenário mundial, a ausência dos EUA não deixará um vácuo de liderança, mas abrirá espaço para que outros países assumam o protagonismo, isolando e reduzindo a influência geopolítica dos americanos. Possivelmente, a China e a Europa devem assumir essa liderança.

Imagem publicada pelo Governo da Califórnia.
"If you don’t believe in science, believe your own damn eyes". Governador da Califórnia Gavin Newsom, logo após Trump assinar o decreto tirando os EUA do Acordo de Paris. 

REAÇÃO NOS EUA - A posse de Trump foi marcada pela presença de Mark Zuckerberg, Jeff Bezos e Tim Cook e o histriônico e deslumbrado Elon Musk, com sua saudação nazista. Se existem bilionários no "lado sombrio da força", também existem figuras de muita influência do lado certo. Cabe destaque ao empresário Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York por três mandatos (2002-2013) e dono de um império de comunicação, que reage mais uma vez a Trump. Ele anunciou que sua organização, Bloomberg Philanthropies, honrará os compromissos dos EUA perante a agenda climática. Diante da omissão do governo federal americano, assumirá as obrigações de elaborar os relatórios nacionais sobre os avanços nas políticas climáticas e ainda fará os repasses de recursos do governo americano para a secretaria-executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (em inglês, United Nations Framework Convention on Climate Change - UNFCCC). Trata-se do órgão que lidera e organiza as Conferência das Partes do Clima, as COP´s. 

Bloomberg já havia feito o mesmo na primeira gestão de Trump e anunciou que fará novamente para dar o necessário suporte financeiro para a continuidade das ações. A UNFCCC é financiada pelos cerca de 200 países signatários da Convenção do Clima, aprovada na Rio-92. Segundo os critérios da ONU, como os EUA são a maior economia do mundo, pagam a maior parcela. 

A primeira gestão de Trump, deixou uma dívida de US$ 8,3 milhões com o órgão climático da ONU, que só foi saldada por Joe Biden no ano passado. O governo Biden cumpriu com a sua contribuição com a UNFCCC. Em 2024, a Bloomberg Philanthropies já havia sido a maior doadora privada da UNFCCC, com U$$ 4,5 milhões.

Na primeira gestão de Trump, Bloomberg ajudou também a mobilizar lideranças nos EUA e foi criada a coalizão America Is All In, que conta atualmente com o apoio de 10 dos 50 estados americanos, 362 cidades (representam 46 estados e 60 milhões de habitantes), 2.978 empresas, 175 grupos de investimentos, 840 grupos religiosos, 428 instituições de ensino superior (Universidades) e 55 organizações da área da saúde. Segundo o site da America Is All In, trata-se da maior coalizão de lideranças climáticas nos EUA, e representa 2/3 da população e 3/4 do PIB do país. Em um press release divulgado no dia 20 de janeiro, dia da posse de Trump, estas lideranças reafirmaram o compromisso firmado na NDC americana (documento que expressa os compromissos voluntários de cada país diante do Acordo de Paris), que foi atualizado pelo governo Biden em dezembro de 2024. Ou seja, trabalharão para que a meta de redução de 61 a 66% das emissões que existiam em 2005 seja atingida em 2035. Estes líderes estão convencidos que a postura de responsabilidade climática, com o investimento em energia limpa, farão a economia crescer, vão reduzir as contas de energia das famílias, criará empregos bons e bem pagos e reduzirão as emissões levando o país a cumprir as suas metas.

Outra organização que merece destaque é a US Climate Alliance que reúne 24 governadores (54% da população e 57% do PIB) e que encaminharam uma Carta Aberta à ONU e à comunidade internacional reafirmando que seus estados continuarão trabalhando para que as metas dos EUA sejam alcançadas. 

REAÇÕES INTERNACIONAIS: No cenário internacional, a reação contra a política anunciada por Trump é enorme. Chefes de estado, ministros, cientistas de renome internacional e prefeitos como Sadiq Khan, de Londres; Anne Hidalgo, de Paris, mostraram indignação. Dirigentes da ONU, a Comunidade Europeia e uma porta-voz da governo da China criticaram os EUA e vozes das principais organizações da sociedade civil de atuação internacional também se manifestaram.

A prefeita de Paris, Anne Hidalgo, foi dura: "Eu exorto a todos os defensores do clima: precisamos estar firmes diante dos céticos climáticos (...) nunca nos faltará coragem e determinação. Mais do que nunca, continuaremos a inovar e adaptar as nossas cidades às mudanças climáticas".

Ani Dasgupta, presidente e CEO do World Resources Institute - WRI, uma organização de atuação global, que reúne mais de 1.900 pesquisadores e especialistas e que tem um ativo escritório no Brasil, declarou que "Estamos num esforço geracional para colocar o mundo num lugar mais seguro" e afirmou também que "Não faz sentido os EUA desistirem voluntariamente da influência política e repassar as oportunidades de estruturarem o mercado de energia verde que está explodindo no mundo".

Laurance Tubiana, CEO da Fundação Climática Europeia e um dos mais importantes articuladores e arquitetos do Acordo de Paris disse que "O contexto hoje é muito diferente de 2017. Há um momentum econômico irrefreável por trás da transição global que os EUA se beneficiaram por liderar mas agora abrem mão".

MOBILIZAÇÃO DOS GOVERNOS SUBNACIONAIS

Estive na COP 26, em Glasgow, conferência que foi marcada pelo boicote de Trump. Fui como prefeito de Niterói, como representante da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos - FNP e também representando a organização Governos Locais pela Sustentabilidade - ICLEI. Esta última é uma organização que reúne mais de 2.800 cidades do mundo e da qual faço parte da governança regional (América do Sul) e global. Na ocasião, fiz parte de um grupo pequeno de prefeitos de várias partes do mundo que se reuniu com o secretário-geral da ONU, António Guterres. Levamos a reivindicação de que os governos subnacionais (cidades, províncias, estados, regiões) deveriam ter assento nas mesas de decisão climáticas. A ideia foi bem recebida por Guterres e seguiu avançando pelas COP´s seguintes. 

Participei com representantes de outras sete cidades do mundo de uma reunião com o secretário-geral da ONU, António Guterres, quando reivindicamos uma maior participação das cidades na tomada de decisão sobre clima.

Na COP 28, em Dubai, consolidou-se a Coalition for High Ambition Multilevel Partnerships (CHAMP) for Climate Change. A coalizão foi uma iniciativa de um conjunto de organizações: America Is All In, Bloomberg Philanthropies, C40 Cities, CDP, European Climate Foundation, the Global Covenant of Mayors for Climate & Energy, ICLEI, NDC Partnership, UN Climate Change High-Level Champions, Under2 Coalition, UN-Habitat, WRI Ross Center for Sustainable Cities e outros. A Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos - FNP assinou uma carta de apoio ao CHAMP, assim como outras organizações de cidades no mundo.

Costumo afirmar que estamos num Clinch Climático, pois os lobbies fizeram o seu trabalho e os avanços na agenda climática estão muito lentos e precisam ganhar mais tração. Para sair do atual estado de impasse e lentidão nos avanços, precisamos trazer para a mesa de negociação novos interlocutores e as cidades podem fazer a diferença. Não podemos ficar na mão apenas dos governos nacionais e corporações!

O pleito do CHAMP foi ouvido e a participação das instâncias subnacionais passou a constar dos documentos finais da COP 28.

COP 30: O Brasil prepara a COP 30 que será realizada em Belém, PA, no final de 2025. Acredito que seja a última oportunidade de se salvar o processo de debate climático internacional no formato que tem se mantido há mais de 30 anos e com resultados muito abaixo do esperado. O objetivo da COP 30 é a renovação das NDC´s dos países e, portanto, a renovação dos compromissos das nações com a agenda das mudanças climáticas.

Com Trump ou sem Trump, o mundo tem a obrigação de avançar e buscar caminhos para a redução das emissões de Gases do Efeito Estufa, a mitigação dos danos e atingir a resiliência climática.

Não há mais tempo a perder!

Axel Grael


2 comentários:

  1. Muito boa a avaliação, como sempre aliás, Axel, continuando como essa voz sábia sobre a questão ambiental e sinalizando, como luz de popa os caminhos a seguir.

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  2. Apesar do cenário ambiental global ser de enorme preocupação, o mundo precisará estar de olho nas oportunidades. A escolha do Trump é pelo atraso, por aquilo que não mais se sustenta, aproveitando-se de uma situação de ruptura dos eleitores americanos com o atual modelo político democrático, porém insatisfatório. Contudo, Trump não tem nada de inovador para produzir melhores resultados em qualquer área. A opção pelo uso dos combustíveis fósseis e o desprezo dele pela geração de energia limpa, por exemplo, fará com que os EUA se distanciem daquilo que amanhã será o futuro do planeta. Até porque as fontes que Trump pretende usar são caras e o mundo tende a descartá-las, substituindo o petróleo e o gás por parques eólicos, energia solar e outros meios. Aliás, a China tende a liderar o mundo nessa corrida, podendo ajudar Europa, África e América do Sul. Depois de muitas trampolinadas, os americanos vão precisar correr atrás do tempo perdido e, talvez, serão superados.

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