segunda-feira, 21 de outubro de 2019

Mancha de óleo que polui o Nordeste pode chegar às praias do Rio



COMENTÁRIO:

Há 19 anos atrás, eu exercia o cargo de presidente da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente - FEEMA, órgão ambiental pioneiro e emblemático da gestão pública do meio ambiente no Brasil.

Na ocasião, enfrentei um dos maiores desastres ambientais do país: o vazamento de óleo na Baía de Guanabara causado pela Refinaria Duque de Caxias, a REDUC. Identificamos os responsáveis, combatemos as manchas de óleo, em conjunto com o IBAMA, aplicamos a maior multa ambiental aplicada até então - a multa máxima prevista pela Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), que recentemente havia sido promulgada.

Cobramos da Petrobras a responsabilidade da empresa pela limpeza da Baía, de reparação dos danos através de Compensações Ambientais e encaminhamos ao legislativo estadual um projeto de lei para a regulamentação da lei federal (produzido pelo então assessor Jurídico da FEEMA, o atual procurador do estado Rodrigo Mascarenhas), que resultou na  Lei Estadual 3.467/2000, que Dispõe Sobre as Sanções Administrativas Derivadas de Condutas Lesivas ao Meio Ambiente no Estado do Rio de Janeiro, e Dá Outras Providências.

No combate ao óleo, mobilizamos toda a equipe da FEEMA, outros órgãos governamentais, forças militares, trouxemos especialistas em resgate da fauna e organizamos a atuação dos voluntários. Reorganizamos o Plano de Emergência Ambiental da Baía de Guanabara e decidimos dar um freio nas frequentes ocorrências de derramamento de óleo na Baía de Guanabara, impondo uma estratégia de tolerância zero contra as "manchas de óleo".

Fazíamos pelo menos um voo semanal de helicóptero e passamos a fiscalizar diariamente a Baía de Guanabara, multando responsáveis e tomando a iniciativa de reportar à imprensa cada uma das manchas de óleo encontradas, mesmo as pequenas. Cada caso ganhava a primeira página dos jornais. Alguns nos acusavam de criar uma "paranóia" das manchas de óleo, mas o fato é que o número de ocorrências diminuiu muito.

Eu também era presidente da FEEMA quando houve a explosão e naufrágio da plataforma P-53 e depois o incidente com a P-07, ambas da Petrobras, e que resultaram em extensos vazamentos de óleo. Nos dois episódios, mobilizamos o plano de contingência e evitamos que grandes porções do óleo derramado no mar chegasse ao litoral, onde ecossistemas mais frágeis e vulneráveis, como manguezais, costões e outros, poderiam ser afetados.

Desastre nas praias do Nordeste

O que vemos agora é o maior desastre ambiental já visto no litoral brasileiro, que ocorre justamente durante uma gestão federal que decidiu promover o desmonte da estrutura governamental do país, da legislação ambiental e que extinguiu conselhos e desmobilizou os planos de respostas para acidentes. É o caso do Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo, criado por lei em 2013, cujos dois conselhos que o compunham foram extintos no início do Governo Bolsonaro. Como consequência, passados dois meses do aparecimento das manchas (borras) de petróleo, o governo foi incapaz de articular uma resposta e ainda não se vê os protocolos do PNC sendo devidamente acionados.

As cenas que temos assistido são grandes grupos de voluntários (pescadores, ambientalistas, moradores e até turistas), dedicados ao difícil e perigoso trabalho de retirada do óleo, trabalhando de forma improvisada, eventualmente com algum apoio de governos e empresas locais.

E o problema continua aumentando a cada dia. Áreas já limpas continuam a receber mais óleo e a extensão de litoral afetado segue aumentando. Como diz a matéria abaixo, do jornal O Dia, autoridades admitem que o óleo poderá chegar ao litoral norte do Rio de Janeiro.

Investigação e respostas

Após o acidente da REDUC e outros que ocorreram no país logo depois, como o acontecido poucos meses depois na refinaria em Araucária, no Paraná, motivaram um esforço legislativo que resultou na Lei 9.966/2000, a chamada Lei do Óleo.

Esta Lei, contrariando os órgãos ambientais, acabou por definir a responsabilidade sobre derramamentos de óleo no mar para a Marinha do Brasil.

Cumprindo essa missão, a Marinha do Brasil iniciou gestões para tentar apurar responsabilidades, enquanto outras autoridades federais, de forma açodada, confusa e irresponsável, davam declarações de cunho ideológico sobre a origem venezuelana do óleo, um dos países escolhidos como inimigo pela presidência da República e seus seguidores mais próximos.

Até agora, não se tem pistas dos responsáveis pelo lançamento do óleo. Pesquisadores da COPPE/UFRJ e outros centros de pesquisa tentam ajudar fazendo simulações com modelos matemáticos que apontam o possível foco de dispersão do óleo muitos quilômetros oceano a dentro. O Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais - INPE, que também poderia dar uma contribuição, acabou desmoralizado por acusações do próprio governo federal, durante outro episódio ambiental vexaminoso que são os incêndios na Amazônia.

Considerações

Tenho ouvido algumas versões de amigos, oficiais da Marinha, sobre algumas hipóteses que explicariam a origem do óleo, admitindo a possibilidade de derramamento acidental ou criminoso de um navio em movimento, ou uma operação clandestina de transferência de um navio para outro em alto-mar.

O que teria acontecido? Um naufrágio? Poderia um navio naufragar na atualidade sem que se tivesse qualquer notícia ou capacidade de se identificar através dos modernos mecanismos de monitoramento de rotas? Um navio clandestino? Mas, transportando petróleo cru? Qual refinaria aceitaria tal encomenda?

Não quero aqui lançar mais hipóteses especulativas, mas me chama a atenção a quantidade de óleo que vem chegando ao litoral. É muita coisa para ser desperdiçado em eventual acidente ou simples descarte.

Acho que ainda vamos sofrer muito com os impactos deste acidente, mas também vamos aprender muito. Mas, que a lição mais importante seja que a questão ambiental seja encarada de forma responsável e por profissionais competentes. A imprevidência e desleixo do governo brasileiro com a segurança ambiental do país tem custado um elevado prejuízo ao patrimônio natural do país e nos desmoralizado perante a comunidade internacional.

Que as investigações avancem com competência e com a devida transparência e que o Governo Federal acione o Plano de Contingência como era esperado e que repare os danos mesmo que tardiamente. É o que a sociedade brasileira deseja e, por falta de escuta nos gabinetes do Planalto, tem exigido através do Ministério Público e da Justiça.

Que o Brasil saia da inércia e sobreviva!

Axel Grael




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Mancha de óleo que polui o Nordeste pode chegar às praias do Rio

No litoral de Alagoas, um grupo de trabalho retira óleo da praia - Felipe Brasil/Fotos Públicas


Especialista diz que entrada poderá ser por São Francisco de Itabapoana, Barra de São João e Quissamã

Por GUSTAVO RIBEIRO

Rio - A partir desta semana, pesquisadores da Coppe/UFRJ investigarão quais áreas do país ainda poderão ser atingidas pelo óleo que já se espalhou pelo litoral de nove estados do Nordeste. Será a segunda fase de um estudo que apontou a possível origem do material poluente: uma área entre 600 e 700 quilômetros da costa brasileira, na fronteira entre Sergipe e Alagoas.

"Considerando os pontos onde foi localizado óleo, foi feito um trabalho de modelagem inversa. A partir das condições hidrodinâmicas, calculamos a trajetória do óleo voltando no tempo para tentar achar a origem", ressaltou Carina Bock, pesquisadora do Laboratório de Métodos Computacionais em Engenharia da Coppe/UFRJ.

O próximo passo será fazer a mesma modelagem para frente. O objetivo é descobrir para onde o óleo pode se deslocar. Será possível saber, por exemplo, se ele chegará ao Estado do Rio, em quanto tempo e possíveis pontos de entrada. A primeira fase do estudo concluiu que o material deve ter começado a se espalhar entre julho e agosto.

O oceanógrafo David Zee, da Uerj, se preocupa com a falta de ações de contenção por parte do governo federal e vê grandes chances de o Espírito Santo e o Rio de Janeiro serem atingidos. A mancha se estende do Maranhão ao Norte da Bahia.

"As praias do Norte e Nordeste vão ficar com resquícios do óleo pelos próximos 20 anos. Se chegar ao Sul da Bahia, o Espírito Santo é a bola da vez", comentou Zee. No Rio, segundo ele, a entrada se daria pelos municípios de São Francisco de Itabapoana, Barra de São João e Quissamã, no Norte do estado. "Se chegar àquela região, a pesca vai ser afetada e muita gente faz pesca de subsistência nessas cidades".

Segundo o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), o Ibama garantiu que não foi identificada mancha em alto mar nem tendência de deslocamento nas proximidades do Estado do Rio. O órgão informou que possui um plano de contingência que abrange o cenário de surgimento de óleo em praias, e que mantém a vigilância.

Marinha e PF investigam o acidente ambiental

Levantamento divulgado pelo Ibama na quinta-feira mostrou que 187 localidades do Nordeste foram atingidas pela mancha em 76 municípios de nove estados: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe. De acordo com o órgão, a investigação da origem do material poluente está sendo conduzida pela Marinha. Já a investigação criminal é objeto da Polícia Federal.

Ainda segundo o Ibama, o poluente se concentra em camada sub-superficial da água. "Por essa razão, as manchas não são visualizadas em imagens de satélite, sobrevoos e monitoramentos com sensores para detecção de óleo, sendo detectadas apenas quando alcançam a costa", explicou o Ibama. O órgão informou que os prejuízos para a fauna e a flora estão sendo avaliados.

Na quinta-feira, o Ministério Público Federal ajuizou ação contra a União por omissão no desastre ambiental. A Procuradoria pede que seja colocado em prática o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Água. "Tudo que se apurou é que a União não está adotando as medidas adequadas em relação a esse desastre ambiental que já chegou a 2.100 quilômetros dos nove estados da região", afirma o MPF, que pede multa diária de R$ 1 milhão em caso de descumprimento.


Fonte: O Dia









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