domingo, 1 de abril de 2012

Mapa das áreas de risco aumenta do outro lado da Baía

Quase um terço dos moradores de Niterói, São Gonçalo e Itaboraí vivem onde empresas de serviços não entram devido à violência

POR FELIPE FREIRE, JOÃO ANTONIO BARROS

Rio - O crime atravessou a Baía de Guanabara e desembarcou de fuzil na mão. Os números da violência em Niterói, São Gonçalo e Itaboraí mostram cidades sitiadas pelas armas. Quase um terço da população dos municípios vive em áreas classificadas como de risco por prestadoras de serviço, concessionárias e distribuidoras de bebidas, eletroeletrônicos e móveis. Os números indicam que o crime cresce do outro lado da Ponte Rio-Niterói na medida que os morros e favelas das zonas Sul e Norte do Rio são pacificados.

Neste sábado de manhã, mais uma vítima das estatísticas: o médico Carlos Vieira de Carvalho Sobrinho, 65 anos, foi morto com um tiro no peito por assaltantes que roubaram seu carro, um Cerato preto, na porta de casa onde morava há 30 anos, em Icaraí.


O Morro do Preventório, em Charitas, Niterói, teria sido invadido por bando da Mangueira
Foto: Carlos Eduardo Cardoso / Agência O Dia
 O estudo, feito este ano pelas empresas que prestam serviço à Endesa, detectou que das 391 mil residências atendidas só em São Gonçalo, pelo menos 119 mil (30,36%) ficam em áreas controladas por traficantes. E em 20% dessas áreas, até 2010 os técnicos não relatavam presença de homens armados. A mesma média vale para Niterói. Lá, das 229 mil casas e apartamentos, ao menos 65,6 mil (28,68%) estão em regiões conflagradas.

Mais roubos

O aumento de homens armados não se limita à geografia. Está traduzido em mais roubos. Os dados do Instituto de Segurança Pública mostram roubos a cargas em Niterói, São Gonçalo, Itaboraí e Maricá mais do que dobraram em três meses.

Em só 61 dias (dezembro de 2011 e janeiro de 2012) foram registrados 63 assaltos na 72ª DP (São Gonçalo), quase um caso por dia. Se somar as ocorrências da Grande Niterói e Itaboraí, o número é ainda mais assustador: 131 roubos nos dois meses. No mesmo período dos anos anteriores foram 52 ataques.

Como antídoto, as empresas de eletroeletrônicos adotaram uma tática, em acordo com associações de moradores, para não riscar as comunidades em áreas de risco do mapa de entrega. Criaram central de depósito — um endereço residencial fora dos morros e favelas onde as compras são recolhidas.

As cervejarias, para escapar de ataques, seguem cartilha conhecida dos cariocas: escolta-armada e recusa de atendimento a comerciantes no coração das favelas.
 
 
 
Bandidos dominam áreas que antes eram tranquilas

Se em algumas comunidades, nos últimos meses, houve a expansão das atividades criminosas e o reforço do poderio de bandidos, em outras a tranquilidade deu lugar às armas. O Morro do Preventório, em Charitas, Niterói, foi invadido por bandidos que seriam da Mangueira. Com isso, serviços básicos como água, luz e telefone ficaram mais distantes dos moradores.

Comunidades como os complexos do Caramujo e Santa Rosa, além do Morro do Cavalão também se reforçaram. “Na Região Oceânica de Niterói, o entorno da Lagoa de Piratininga, o Caniçal, o Inferninho e o Jacaré estão com tráfico pesado”, disse o presidente do Conselho de Segurança dos bairros, Renan Lacerda.

Algumas áreas do Fonseca, como o entorno da Rua 22 de Novembro, antigos pontos de concentração de casas populares foram dominadas por bandidos. Há cenários semelhantes nas regiões do Coelho, Miriambi, Coruja, Morro dos Martins, em São Gonçalo; Rua 100, Parque Industrial, Barreiro e Vila Progresso, em Itaboraí; e favelas Saco da Lama, Cocadinha, Itaipuaçu e Boqueirão, em Maricá.

“Ouvimos relatos de moradores de onde antes você não via nem um revólver enferrujado, e agora tem inúmeros fuzis e gente com granada até o ‘pescoço’", detalhou o secretário de Segurança de São Gonçalo, Marcus Jardim.

Medidas de segurança adotadas dificultam dia a dia da população

Com a entrega de mercadorias em locais distantes, moradores precisam carregar os produtos do jeito que podem. “Normalmente são entregues nas associações de moradores, ONGs ou casas de líderes comunitários nas partes planas”, destacou morador do Preventório, em Charitas.

Quando o assunto é bebida, os traficantes adotaram uma tática de lucro: passaram a comprar a mercadoria direto da fábrica para revendê-la a preços mais altos a comerciantes dos bares localizados no meio das favelas. Tudo isso para garantir o fornecimento.

O mercado de gás e antenas de TV por assinatura também é controlado na base da mira das armas. Em várias comunidades dos quatro municípios, são os criminosos que conduzem as comercializações. “Quando temos problemas de luz ou água, os funcionários das empresas não sobem”, diz um morador.Dados de firma especializada em venda de eletrodomésticos nas regiões confirmam aumento de 88,69% de casos de violência e saques nos últimos meses.

“A gente ouve comentários de que seriam bandidos vindos do Rio, mas ninguém sabe ao certo se vieram de áreas pacificadas ou de Niterói. Geralmente eles se movimentam muito”, enfatizou o comandante do 7º BPM (São Gonçalo), tenente-coronel Gilberto Tenreiro Jesus.

Médico é morto em assalto em Icaraí

Por volta das 6h deste sábado, o médico Carlos Vieira de Carvalho Sobrinho, 65 anos, foi morto com um tiro no peito por assaltantes que roubaram seu carro, um Cerato preto, na porta de casa onde morava há 30 anos, em Niterói. Ele e a mulher tinham acabado de levar um filho à rodoviária. “Ele não reagiu, mas o assaltante atirou no peito e ele morreu na hora”, contou um parente.

Dois homens em uma moto teriam abordado a vítima quando ela tentava chegar à garagem de casa, na Rua Comandante Miguelotte Viana, em Icaraí, um dos acessos ao Morro do Cavalão. Carlos tentou dar ré, mas um carro com comparsas dos assaltantes teria atrapalhado a passagem.

Carlos, então, desceu para entregar o carro e teria tentado argumentar para pegar documentos, quando levou o tiro. A mulher dele, que abria a porta de casa na hora, está em choque. Policiais da 77ª DP (Icaraí) buscam imagens de câmeras próximas para identificar os criminosos.

A família conta que no último ano outros dois carros foram roubados na porta de casa. “Vizinhos também já foram vítimas de violência. Estamos desprotegidos”, disse um familiar. Carlos era obstetra e tinha empresa de medicina do trabalho. O corpo será enterrado neste domingo em Itaipu.
 
Fonte: O Dia Online

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