segunda-feira, 23 de maio de 2011

Dora Negreiros registra um passado da Praia de São Francisco que se perde com a demolição do LIDO


Bonde que ligava a Praia de São Francisco a outros bairros de Niterói. O Lido era o ponto final. Foto de Carlheinz Hahmann, 1947.

Reproduzo, a seguir, o texto escrito por Dora Negreiros, engenheira química, ambientalista, fundadora da FEEMA e presidente do Instituto Baía de Guanabara. Seu texto nos convida a voltar aos anos 1940 e 1950 e viver no bairro de São Francisco, em Niterói, um bucólico paraíso que, à semelhança de Paquetá, recebia visitantes vindos do Rio de Janeiro em busca das belezas locais. Os visitantes chegavam a Niterói pelas barcas, de onde pegavam o bonde para chegar a São Francisco, onde o programa era passear de bicicleta e nadar na praia ainda de águas limpas.

As palavras da Dora o levarão também a lamentar a demolição do último casarão remanescente do Lido, um empreendimento turístico - hotel e restaurante - que recebia os visitantes da Praia de São Francisco.

Axel Grael


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E o Lido se foi...

Por Dora Hees de Negreiros

Derrubaram o último dos prédios do Hotel Lido, uma pequenina casinha verde no final da Praia de São Francisco. Tinha uma varandinha e o nome na fachada. Era o que restava do grande conjunto que ocupava toda a esquina até encontrar a Padaria N.Sa de Lourdes. O Lido era enorme e lembro bem do seu grande restaurante. Ocupando seu espaço já existem dois “shoppings” e vamos ver o que mais virá agora!

O hotel recebia os “veranistas” visitantes que, nas décadas de 40 e 50, vinham do Rio de Janeiro para uma temporada, um fim de semana ou um “pic nic”, passeio de um dia. Vinha-se a São Francisco como ainda hoje se vai a Paquetá. Para apreciar a vista, um banho de mar, um passeio de bicicletas. Assim como as bicicletas, as roupas de banho podiam ser alugadas no Lido que era onde se tomava banho, vestia-se e fazia uma refeição antes da volta.

O passeio dos cariocas começava na Praça XV, pela viagem de Barca acompanhada dos botos que apareciam muito mais naquela época. O bonde “Canto do Rio” levava os veranistas das Barcas até o fim da linha, local que embora ainda guarde o nome, não se vê mais o rio. Lá havia uma estação, um abrigo, semelhante ao que no Rio era chamado de Tabuleiro da Baiana e onde se aguardava o bonde “São Francisco”.

Para o bonde São Francisco só havia um trilho. Dois bondes faziam o trajeto. Um vinha e o outro ia. Na estrada Fróes, próximo ao Iate Clube Brasileiro eles se cruzavam. O bonde que ia entrava em um desvio e ficava esperando o da volta passar. O fim da linha era uma grande volta que faziam onde hoje existem o Prédio da Caixa Econômica e o shopping em frente a ela. Não havia estação de passageiros em São Francisco. Esperava-se pelo bonde na Padaria que era onde o motorneiro também aguardava o momento de partir para, na hora certa, deixar o outro passar no desvio da Estrada Fróes .

A Padaria Na Sra de Lourdes continua lá, sempre se adaptando aos tempos modernos. Mas a chaminé, antes usada para o forno a lenha, continua de pé. Hoje podem ser comprados lá até acessórios para computador como teclados e “pen-drives”. Sinal dos tempos.

E também continuam de pé as árvores do tempo dos bondes e do Lido. Aquela calçada central, no início da Av. Rui Barbosa e que divide as suas pistas, era destinada às pessoas que subiam e desciam dos bondes. Na Praia de São Francisco ela foi unida à estreita calçada anterior e formou um calçadão. As árvores felizmente foram poupadas e continuam nos dando sombra. Mas o Lido, já era.

Dora, 22 de maio de 2011

Terreno onde localizava-se o último remanescente do casario do antigo Hotel e Restaurante LIDO, na Praia de São Francisco, Niterói. A demolição leva ao châo os últimos vestígios de um passado cada vez mais distante. Ainda restam algumas construções da época, como o Velho Armazém. Por quanto tempo resistirá à pressão imobiliária? Foto de Axel Grael, 23/05/2011.



 
 
 
 
 






6 comentários:

  1. O sensacional, além do texto da Dora, é que a foto do bonde dá o resultado do jogo do bicho: cavalo, 13. Bons tempos.

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    1. Amigo,
      Cavalo 13 era o nome de uma fábrica de bebidas que havia na R.Mal.Deodoro, em frente a Oficina dos Bondes

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    2. Amigo
      Cavalo 13 era o nome de um brandy fabricado
      pela Industria de Bebidas Cavalo Preto, existente na R. Mal.Deodoro e foi destruida por um incendio seguido por explosao

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  2. eh aproveitem moradores de niteroi para registrar os ultimos momentos em de lugares com toques antigos e onde vc ainda consegue ver uma casa na zona sul hoje e amanha ela sera mais um edificio, aproveite junto do caio martins com fotos e ultimos momento pq ja estamaos proximo de mais essa tb !!!!!eh uma pena mais estamos virando uma pequena Sao Paulo onde onde o transito esta cada vez pior junto a poluiçao.Eh uma pena que junto com esses edificeis que nao para em niteroi a inteligencia nao acompanha saidas buscando resultados!

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  3. Um grande abraço a Sra.Dora Negreiros,defensora e estudiosa das relações ambientais, mãe de um grande amigo nosso querido "Palito".

    Parabéns pelo artigo, que tanto nos orgulha em saber que alguém está resgatando parte de nossa cultura.

    Há muito venho acompanhando,e até enviei sugestões para alguns contatos em Niterói, sobre a gravidade do assunto, que tem como objetivo a expansão imobiliária etc.

    Criado em Santa Rosa, peladeiro do campo da Barreirinha,onde hoje é o Centro Cultural La Salle, e que revelou nosso craque Gérson na década de 70, fico estarrecido com os fatos, quando presencio,leio e visualizo, dezenas de casas, mobiliários urbanos, que contam a história de nossa cidade, e que estão sumindo sem nenhum registro histórico,arqueológico e cultural, que temos acesso,casarões em Santa Rosa,com mais de 100/150 anos, que simplesmentem somem do dia para noite.

    Então bravo Grael, deixo minha sugestão, que as Licenças e Autorizações da Prefeitura,sejam expedidas, e que tenham como condicionantes prioridades em se registrar tecnicamente estes locais,apresentar relatório arqueológico e histórico,para conhecimento público,e arquivo para enriquecimento de nossa cultura, resgatando os passos de nossos bisa e avós que chegaram a esta cidade maravilhosa.

    O ambiente inteiro agradece.

    Sds,

    Ilzomar Soares

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  4. O texto da Dora me fez lembrar as histórias de S.Fco e Charitas, que meu pai contava. Morador de Charitas neste período a que a Dora se refere, atravpés dele tive a sorte de conhecer um passado bucólico. Os cajueiros que existiam, o bonde, o Lido... A farmácia de manipulação de propriedade do tio dele e a vida pacata que se leva naquela época...
    Infelizmente esta meória se perde com o tempo, os mais velhos se vão e com eles o pouco que resta deste período, como é o caso do Lido. Niterói uma cidade sem capacidade de locomoção agora também, cada vez mais vai se tornando uma cidade sem memória...

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