sábado, 25 de janeiro de 2025

NEGACIONISMO CLIMÁTICO DE TRUMP É UM CRIME CONTRA O PLANETA, MAS EUA SERÃO OS MAIORES PERDEDORES

Imagem ONU Brasil

Trump anunciou que boicotará novamente a agenda climática mundial, mas logo perceberá que não é o dono do mundo e nem o dono do seu próprio país. Suas atitudes encontram muitas resistências e o seu afastamento da agenda climática poderá causar um sério dano geopolítico para os EUA.

Postei aqui no blog há poucos dias o artigo DE VOLTA ÀS TREVAS: as sombras da volta de Trump, onde analisei as ameaças e riscos do retorno de Donald Trump à presidência dos EUA e os seus impactos sobre a agenda das mudanças climáticas liderada pela ONU. Trump é um negacionista climático, faz disso uma das suas bandeiras políticas e influencia conservadores do mundo todo com a sua retórica e atitudes. 

Em 01 de junho de 2017, no seu primeiro governo, Trump retirou os EUA do Acordo de Paris, ato que por sua vez foi revogado pelo democrata Joe Biden logo ao assumir o governo, após derrotar Trump. No dia 20 de janeiro de 2025, dia da posse do seu segundo mandato, Trump assinou uma Ordem Executiva (decreto) para retirar os EUA do Acordo de Paris pela segunda vez. No artigo, ponderei que na primeira vez que isso aconteceu, foi um grande abalo nos meios da diplomacia climática, como constatei pessoalmente na COP 26, em Glasgow. Diante da perplexidade de todos, houve de fato uma paralisia nos avanços da agenda climática, com prejuízos enormes nesta ação que é tão emergencial. Na ocasião, o Brasil também estava entre os vilões, com o negacionismo climático de Bolsonaro. Um enorme constrangimento!

Eleição de Trump é um evento climático extremo’, diz Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima. Entrevista à Infoamazônia.

No entanto, Trump não é mais novidade para ninguém e o mundo saberá se proteger dos seus devaneios, principalmente num tema tão emergencial e decisivo para as atuais e futuras gerações. 

Acredito que no cenário mundial, a ausência dos EUA não deixará um vácuo de liderança, mas abrirá espaço para que outros países assumam o protagonismo, isolando e reduzindo a influência geopolítica dos americanos. Possivelmente, a China e a Europa devem assumir essa liderança.

Imagem publicada pelo Governo da Califórnia.
"If you don’t believe in science, believe your own damn eyes". Governador da Califórnia Gavin Newsom, logo após Trump assinar o decreto tirando os EUA do Acordo de Paris. 

REAÇÃO NOS EUA - A posse de Trump foi marcada pela presença de Mark Zuckerberg, Jeff Bezos e Tim Cook e o histriônico e deslumbrado Elon Musk, com sua saudação nazista. Se existem bilionários no "lado sombrio da força", também existem figuras de muita influência do lado certo. Cabe destaque ao empresário Michael Bloomberg, ex-prefeito de Nova York por três mandatos (2002-2013) e dono de um império de comunicação, que reage mais uma vez a Trump. Ele anunciou que sua organização, Bloomberg Philanthropies, honrará os compromissos dos EUA perante a agenda climática. Diante da omissão do governo federal americano, assumirá as obrigações de elaborar os relatórios nacionais sobre os avanços nas políticas climáticas e ainda fará os repasses de recursos do governo americano para a secretaria-executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (em inglês, United Nations Framework Convention on Climate Change - UNFCCC). Trata-se do órgão que lidera e organiza as Conferência das Partes do Clima, as COP´s. 

Bloomberg já havia feito o mesmo na primeira gestão de Trump e anunciou que fará novamente para dar o necessário suporte financeiro para a continuidade das ações. A UNFCCC é financiada pelos cerca de 200 países signatários da Convenção do Clima, aprovada na Rio-92. Segundo os critérios da ONU, como os EUA são a maior economia do mundo, pagam a maior parcela. 

A primeira gestão de Trump, deixou uma dívida de US$ 8,3 milhões com o órgão climático da ONU, que só foi saldada por Joe Biden no ano passado. O governo Biden cumpriu com a sua contribuição com a UNFCCC. Em 2024, a Bloomberg Philanthropies já havia sido a maior doadora privada da UNFCCC, com U$$ 4,5 milhões.

Na primeira gestão de Trump, Bloomberg ajudou também a mobilizar lideranças nos EUA e foi criada a coalizão America Is All In, que conta atualmente com o apoio de 10 dos 50 estados americanos, 362 cidades (representam 46 estados e 60 milhões de habitantes), 2.978 empresas, 175 grupos de investimentos, 840 grupos religiosos, 428 instituições de ensino superior (Universidades) e 55 organizações da área da saúde. Segundo o site da America Is All In, trata-se da maior coalizão de lideranças climáticas nos EUA, e representa 2/3 da população e 3/4 do PIB do país. Em um press release divulgado no dia 20 de janeiro, dia da posse de Trump, estas lideranças reafirmaram o compromisso firmado na NDC americana (documento que expressa os compromissos voluntários de cada país diante do Acordo de Paris), que foi atualizado pelo governo Biden em dezembro de 2024. Ou seja, trabalharão para que a meta de redução de 61 a 66% das emissões que existiam em 2005 seja atingida em 2035. Estes líderes estão convencidos que a postura de responsabilidade climática, com o investimento em energia limpa, farão a economia crescer, vão reduzir as contas de energia das famílias, criará empregos bons e bem pagos e reduzirão as emissões levando o país a cumprir as suas metas.

Outra organização que merece destaque é a US Climate Alliance que reúne 24 governadores (54% da população e 57% do PIB) e que encaminharam uma Carta Aberta à ONU e à comunidade internacional reafirmando que seus estados continuarão trabalhando para que as metas dos EUA sejam alcançadas. 

REAÇÕES INTERNACIONAIS: No cenário internacional, a reação contra a política anunciada por Trump é enorme. Chefes de estado, ministros, cientistas de renome internacional e prefeitos como Sadiq Khan, de Londres; Anne Hidalgo, de Paris, mostraram indignação. Dirigentes da ONU, a Comunidade Europeia e uma porta-voz da governo da China criticaram os EUA e vozes das principais organizações da sociedade civil de atuação internacional também se manifestaram.

A prefeita de Paris, Anne Hidalgo, foi dura: "Eu exorto a todos os defensores do clima: precisamos estar firmes diante dos céticos climáticos (...) nunca nos faltará coragem e determinação. Mais do que nunca, continuaremos a inovar e adaptar as nossas cidades às mudanças climáticas".

Ani Dasgupta, presidente e CEO do World Resources Institute - WRI, uma organização de atuação global, que reúne mais de 1.900 pesquisadores e especialistas e que tem um ativo escritório no Brasil, declarou que "Estamos num esforço geracional para colocar o mundo num lugar mais seguro" e afirmou também que "Não faz sentido os EUA desistirem voluntariamente da influência política e repassar as oportunidades de estruturarem o mercado de energia verde que está explodindo no mundo".

Laurance Tubiana, CEO da Fundação Climática Europeia e um dos mais importantes articuladores e arquitetos do Acordo de Paris disse que "O contexto hoje é muito diferente de 2017. Há um momentum econômico irrefreável por trás da transição global que os EUA se beneficiaram por liderar mas agora abrem mão".

MOBILIZAÇÃO DOS GOVERNOS SUBNACIONAIS

Estive na COP 26, em Glasgow, conferência que foi marcada pelo boicote de Trump. Fui como prefeito de Niterói, como representante da Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos - FNP e também representando a organização Governos Locais pela Sustentabilidade - ICLEI. Esta última é uma organização que reúne mais de 2.800 cidades do mundo e da qual faço parte da governança regional (América do Sul) e global. Na ocasião, fiz parte de um grupo pequeno de prefeitos de várias partes do mundo que se reuniu com o secretário-geral da ONU, António Guterres. Levamos a reivindicação de que os governos subnacionais (cidades, províncias, estados, regiões) deveriam ter assento nas mesas de decisão climáticas. A ideia foi bem recebida por Guterres e seguiu avançando pelas COP´s seguintes. 

Participei com representantes de outras sete cidades do mundo de uma reunião com o secretário-geral da ONU, António Guterres, quando reivindicamos uma maior participação das cidades na tomada de decisão sobre clima.

Na COP 28, em Dubai, consolidou-se a Coalition for High Ambition Multilevel Partnerships (CHAMP) for Climate Change. A coalizão foi uma iniciativa de um conjunto de organizações: America Is All In, Bloomberg Philanthropies, C40 Cities, CDP, European Climate Foundation, the Global Covenant of Mayors for Climate & Energy, ICLEI, NDC Partnership, UN Climate Change High-Level Champions, Under2 Coalition, UN-Habitat, WRI Ross Center for Sustainable Cities e outros. A Frente Nacional de Prefeitas e Prefeitos - FNP assinou uma carta de apoio ao CHAMP, assim como outras organizações de cidades no mundo.

Costumo afirmar que estamos num Clinch Climático, pois os lobbies fizeram o seu trabalho e os avanços na agenda climática estão muito lentos e precisam ganhar mais tração. Para sair do atual estado de impasse e lentidão nos avanços, precisamos trazer para a mesa de negociação novos interlocutores e as cidades podem fazer a diferença. Não podemos ficar na mão apenas dos governos nacionais e corporações!

O pleito do CHAMP foi ouvido e a participação das instâncias subnacionais passou a constar dos documentos finais da COP 28.

COP 30: O Brasil prepara a COP 30 que será realizada em Belém, PA, no final de 2025. Acredito que seja a última oportunidade de se salvar o processo de debate climático internacional no formato que tem se mantido há mais de 30 anos e com resultados muito abaixo do esperado. O objetivo da COP 30 é a renovação das NDC´s dos países e, portanto, a renovação dos compromissos das nações com a agenda das mudanças climáticas.

Com Trump ou sem Trump, o mundo tem a obrigação de avançar e buscar caminhos para a redução das emissões de Gases do Efeito Estufa, a mitigação dos danos e atingir a resiliência climática.

Não há mais tempo a perder!

Axel Grael


quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

DE VOLTA ÀS TREVAS: as sombras da volta de Trump


Como dizia o Barão de Itararé, "... de onde menos se espera, dai é que não sai nada mesmo..."!

O novo mandato do Trump começou da forma esperada. Quando saiu o resultado do estranho processo eleitoral nos EUA, já sabíamos que viriam recuos criminosos nas agendas do clima, da sustentabilidade, dos direitos humanos, da paz, do comércio justo etc. Trump já havia feito isso antes, disse que faria novamente e já está cumprindo o que prometeu.

Talvez, a única vantagem - se é que algo de bom possa ser visto ali - é que Trump e sua turma resolveram rasgar a fantasia e estão sendo mais explícitos do que nunca. No evento de posse, o deslumbrado bilionário-patrocinador-amigo e agora ministro Elon Musk, o homem mais rico do mundo, fez a saudação nazista, enquanto o filho de Trump fez sinais suspeitos com as mãos até ser reprimido pela própria esposa. E o presidente fez um discurso ainda mais radical que o habitual. Trump reiterou as ameaças contra os países vizinhos (Canadá, México e até a Groelândia e Panamá) e, mais uma vez, com o seu discurso xenofóbico sobrou como sempre para os imigrantes.

Em entrevista, ao ser perguntado se ajudará a reconstruir Gaza, disse que "pode ser que sim" ("I might...!") e completou: "... vi numa foto que Gaza está toda destruída e precisará ser reconstruída. Mas, é um lugar na beira do mar. Dá para fazer muitas coisas interessantes lá!" Trump enriqueceu com negócios imobiliários. Deve estar pensando em resorts e não em refazer a cidade para os próprios milhares de desabrigados palestinos. Perguntado sobre a relação com a América Latina, desdenhou e disse: "Não preciso deles. Eles precisam de nós!"

Saudação nazista de Elon Musk. Foto Reuters.

O presidente que retorna já se manifestou a favor do estímulo do comércio de armas e também delimitou a sua percepção de mundo, bradando: "Só existem dois gêneros: masculino e feminino!" 

O governo Biden foi um fracasso, mas teve alguns avanços importantes na agenda do Clima, Transição Energética e Sustentabilidade.

Trump já anunciou que vai retirar os EUA novamente do Acordo de Paris, vai revogar todas estas medidas de Biden e com relação às limitações impostas à exploração de petróleo em lugares ambientalmente vulneráveis, disse que a sua regra será: "Drill, drill, drill!" ("Perfura, perfura, perfura!"). Ainda anunciou a retirada de todas as prioridades para a eletrificação da frota de veículos e mais outras vilanias contra o planeta.

Toda esta atitude de radicalização pode inflamar os seus seguidores mais radicais, mas aumenta as dissidências. As fichas começarão a cair para muita gente que acreditou na retórica de Trump.

Se os ambientalistas não estão surpresos com o que está acontecendo, passamos a imaginar o impacto sobre outros grupos da sociedade:

- O que estará pensando a parcela pró-Trump dos judeus, sempre tão influentes na política americana, sobre a atitude do bilionário-ministro fazendo a saudação nazista?

- O que estarão pensando as minorias que ao longo do tempo conquistaram com muita luta as políticas afirmativas de inclusão? O que os cidadãos americanos negros, das muitas minorias étnicas, deficientes etc. estarão pensando, diante da ameaça de voltar para o segundo plano social, diante de um presidente que diz que agora "será tudo pela meritocracia". Aliás, prática que ele prega, mas não adotou na escolha do seu ministério. Sua equipe é composta pelo simbólico Musk - um estranho no ninho no que se refere a politicas públicas, mas que aportou muitos milhões de dolares na campanha de Trump. Além dele, outros  doadores de campanha e amigos ganharam posições-chave no governo mais poderoso do mundo sem que se reconheça o excepcional mérito dessas pessoas para o cargo.

- O que o mundo todo está pensando de um chefe da nação mais poderosa do mundo ter arroubos xenófobos e até expansionistas sobre países vizinhos como Canadá, México, Groelândia (Dinamarca) e até o Panamá?


Trump é o oposto do estadista. O estadista fala para a sua nação, para o mundo. Trump só fala para os seus. Seu discurso nunca foi tão direcionado para a sua própria tropa e também nunca foi tão agressivo, irresponsável, sectário e excludente. Com isso, acredito que a tropa trumpista perderá preciosos batalhões, o que no equilíbrio da atual polarização mundial, poderá reforçar o lado dos que clamam pela ética e pela democracia.

Acompanho a agenda climática mundial e sei que na gestão anterior de Trump, houve uma paralisia da agenda por obra do boicote da diplomacia americana. Vejo dificuldades pela frente, mas Trump não é mais novidade e acredito que as mesas de negociação climáticas saberão como lidar melhor com a atitude americano sob o negacionismo trumpista. Os EUA sao fortes mas não são donos do mundo e o mundo sabe disso. Acredito que podemos ter uma reação de uma nova geopolítica climática, isolando os EUA. Outros paises podem assumir o protagonismo. Europa, China? Vamos ver...

Por um lado, a hegemonia de Trump no Congresso dos EUA (Senado e Câmara) preocupa pois o contraponto legislativo está comprometido e as leis também podem retroceder. Mas, uma coisa podemos ter certeza: ainda haverá muita disputa judicial e muita confusão pela frente.

No final, passado o pesadelo, o retrocesso civilizatório será derrotado pelo bom senso da democracia, da ciência e da boa política. Resta saber o tamanho do estrago e quanto custará a restauração. Infelizmente, possivelmente só as próximas gerações terão as respostas.

Axel Grael




quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

El Niño agrava impacto da seca em águas subterrâneas na Amazônia e eleva risco de incêndio, constata estudo

 

A ilustração mostra o impacto do El Niño nos níveis de água subterrânea do solo superficial (sfsm), da zona das raízes das árvores (rtzsm) e das águas subterrâneas (gws), e a relação com o risco de incêndio (crédito: Bruno Conicelli)


Pesquisadores conseguiram demonstrar relação entre o fenômeno climático e a propensão ao fogo, criando uma ferramenta que pode, no futuro, auxiliar em ações preventivas

Luciana Constantino | Agência FAPESP 

O risco de incêndio na Amazônia é maior em regiões onde o armazenamento de água subterrânea está comprometido, principalmente se o El Niño estiver agravando a seca. Usando imagens de satélite e dados de queimadas, pesquisadores conseguiram demonstrar a relação entre o fenômeno climático e a propensão ao fogo, criando uma ferramenta que poderá, no futuro, auxiliar em ações preventivas.

Os resultados do estudo, com base em informações de 2004 a 2016, revelam uma diminuição nas condições de umidade em três níveis – do solo superficial (sfsm), da zona das raízes das árvores (rtzsm) e das águas subterrâneas (gws), sendo este último o que apresenta maior severidade de aridez. São esses “reservatórios” que demoram mais para se recuperar quando afetados por secas consecutivas e extremas decorrentes do El Niño, um dos fenômenos climáticos de maior impacto na Terra.

Nas últimas décadas, incêndios florestais provocados pelo homem (antropogênicos) alteraram significativamente a dinâmica da vegetação na região amazônica. Essas atividades humanas são consideradas “ignições” para o fogo na floresta tropical, sendo que a escalada das queimadas está ligada às condições climáticas.

Somente em 2024, o total de focos de incêndio registrado de janeiro a 20 de novembro na Amazônia é o maior desde 2010 – foram 132.211 em pouco menos de 11 meses, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Com uma metodologia diferente da usada pelo Inpe, o Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais (Lasa), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), alerta que já foram queimados cerca de 128 mil km2 do bioma neste ano, o que corresponde ao território da Inglaterra.

“Resolvemos investigar o impacto da seca meteorológica e hidrológica dos incêndios na Amazônia com atenção no papel das águas subterrâneas e eventos do El Niño dentro do projeto Sacre, que tem foco maior em áreas urbanas, mas também olha para zonas rurais e florestas. E conseguimos demonstrar a relação”, comemora o professor Bruno Conicelli, do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (USP), autor correspondente da pesquisa.

Publicado na revista Science of the Total Environment, o artigo tem como coautor o pesquisador Ricardo Hirata, coordenador do “Sacre: Soluções Integradas de Água para Cidades Resilientes”. Um dos maiores projetos de pesquisa aplicada em recursos hídricos no Brasil, o Sacre tem como tema central as águas subterrâneas e o objetivo de reduzir a vulnerabilidade de cidades e do campo em crises associadas às mudanças climáticas globais. Recebe apoio da FAPESP por meio de um Projeto Temático.

Base de dados

Para a caracterização da seca hidrológica, os pesquisadores utilizaram informações de satélite da missão GRACE, sigla em inglês para Gravity Recovery and Climate Experiment, que permite detectar o armazenamento de água terrestre integrando umidade do solo, água superficial e a subterrânea.

Cruzaram com dados sobre a gravidade da seca em cada local analisado. Com isso, conseguiram identificar áreas com menor concentração de umidade no nordeste da bacia amazônica, além de uma diminuição da umidade em direção ao leste.

As maiores áreas queimadas coincidiram com regiões que enfrentaram seca durante eventos extremos do El Niño, com um aumento entre 2015 e 2016. À época, o fenômeno foi considerado um dos três mais intensos já registrados (juntamente com 1982/83 e 1997/98). O de 2023/2024 está entre os cinco mais fortes, segundo a Organização Meteorológica Mundial (WMO, na sigla em inglês).

O El Niño é caracterizado pelo aquecimento anormal da superfície do oceano Pacífico devido à diminuição da intensidade dos ventos alísios. Os padrões da circulação atmosférica sobre o Pacífico são alterados, com mudança também na distribuição de umidade e das temperaturas em várias partes do planeta. Relatórios internacionais apontam que haverá um crescimento na frequência e intensidade desse evento nas próximas décadas.

“Sabemos que as queimadas na Amazônia têm origem antrópica. No entanto, quando há o registro de um El Niño mais intenso, como ocorreu em 2016, que investigamos, e novamente em 2024, as secas meteorológicas e hidrológicas tornam-se mais severas na floresta. Nessas condições, a vegetação depende intensamente da água subterrânea para sobreviver. As árvores menores, com raízes menos profundas, são as primeiras a sofrer com a falta de água”, diz Conicelli, que foi orientador da primeira autora do artigo, Naomi Toledo. Quando a pesquisa começou, ela era aluna de graduação da Universidad Regional Amazônica Ikiam, no Equador, onde Conicelli foi professor durante quatro anos.

Em agosto, um grupo internacional publicou o primeiro relatório State of Wildfires, mostrando que os incêndios na Amazônia Ocidental – que inclui Amazonas, Acre, Roraima e Rondônia – entre março de 2023 e fevereiro de 2024 foram impulsionados por secas prolongadas ligadas ao El Niño. Aliadas às condições meteorológicas, as secas explicaram 68% desses incêndios, seguida da influência de ações antrópicas, como desmatamento, agricultura e fragmentação de paisagens naturais (leia mais em: https://agencia.fapesp.br/52493).

Sistema de alerta

Com base no resultado do trabalho, o grupo desenvolve um índice de risco de incêndios adaptado à região amazônica, incluindo tanto indicadores meteorológicos (ligados às chuvas) quanto hidrológicos (água no solo, rios, aquíferos e outras reservas). O modelo pode ser aplicado em outros ecossistemas.

Ao demonstrar a interconexão entre as condições meteorológicas e hidrológicas e o agravamento dos incêndios florestais, os resultados podem contribuir com estratégias destinadas a mitigar o risco de queimadas e ações de prevenção. “Estudos como esses são importantes também para a conscientização do quanto a floresta fica vulnerável com eventos climáticos extremos, cada vez mais frequentes e intensos”, completa o pesquisador.

Segundo Conicelli, a expectativa é no futuro acrescentar dados coletados em campo para que o sistema sirva como um alerta quando as águas subterrâneas ficarem em níveis baixos.

O artigo Dynamics of meteorological and hydrological drought: The impact of groundwater and El Niño events on forest fires in the Amazon pode ser lido em: https://www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0048969724067688.

Fonte: Agência FAPESP



Mundo ultrapassa a marca de 1,6°C: entenda o que isso significa para o clima e quais os impactos para o Brasil

Primeiro dia sem gelo no Ártico pode acontecer em 2027, alerta estudo

Especialistas explicam que calor recorde afeta mais países subdesenvolvidos e tropicais, como o Brasil, e expõe à população a extremos. Dados do Cemaden mostram que, em 2024, regiões no país ficaram até 2,2°C mais quente.

Por Poliana Casemiro

O mundo está ficando mais quente e isso está acontecendo muito antes do esperado. O ano de 2024 foi o mais quente já registrado na Terra e, pela primeira vez, a temperatura média global aumentou 1,6ºC em relação aos níveis pré-industriais, superando o que é considerado limite seguro para o planeta.

➡️ Você pode pensar que o ano ser o mais quente já visto pode não ser uma novidade – e não é. Há uma década, os anos vêm marcando recordes de temperatura. Por exemplo: 2023 já tinha sido considerado o ano mais quente vivido na Terra.

🔴 O problema é que, agora, esse aumento chegou a um patamar acima do limite do que é considerado seguro. A previsão dos pesquisadores há quase uma década para quando isso acontecesse é que sofreríamos extremos de chuva, seca e mortes. E foi o que vimos em 2024:
🔴 Chuvas intensas como as que devastaram cidades inteiras no Rio Grande do Sul e na Espanha, que viveu a pior tempestade da história;
🔴 A pior temporada de furacões da história dos Estados Unidos;
Chuvas que mataram centenas de pessoas na África e mudaram a paisagem do deserto;
🔴 Ao mesmo tempo, secas extremas, deixando pessoas sem água e isoladas, como vimos no Norte do Brasil;
🔴 Incêndios florestais de grandes proporções, como os que aconteceram no Brasil e cobriram o país de fumaça por meses.

O que especialistas dizem é que todo esse cenário pode ser apenas uma amostra do que podemos esperar no futuro caso a Terra continue tão quente como está.

➡️ O 1,5°C foi definido no Acordo de Paris, em 2015, após pesquisas indicarem que esse seria o “limite seguro” das mudanças climáticas. Isso porque, se o índice atingisse a marca de 2°C, que era o que estava sendo previsto com o avanço das emissões, a Terra estaria em risco.

Para que esse limiar fosse mantido, no entanto, era necessário conter o avanço das emissões de gases do efeito estufa, causadores do aquecimento global. Esses gases, como o dióxido de carbono, fazem parte do dia a dia do mundo e de operações que são pilares da economia – o que torna tudo mais difícil.

O que os especialistas dizem é que ter chegado a 1,6°C mais quente em relação aos níveis pré-industriais em 2024 é um indício de que podemos estar mais perto dos 2°C.

"A indústria e os países estão fracassando no compromisso de reduzir as emissões e, agora, superamos um marco limite. Se a gente não reduzir rapidamente, vamos bater os 2°C em breve e isso vai ser um suicídio ecológico"

— Carlos Nobre, climatologista e referência mundial em estudos sobre mudanças climáticas.

🔴 É importante lembrar que o cálculo é uma média, que leva em conta as temperaturas registradas no mundo todo, que tem lugares mais quentes que outros. Os países mais vulneráveis são os tropicais, como o Brasil. Um levantamento feito pelo Cemanden a pedido do g1 mostra que há locais no país que ficaram 2,2°C mais quentes nos últimos 80 anos. (Leia mais abaixo)

O g1 conversou com Carlos Nobre, climatologista e referência mundial em estudos sobre mudanças climáticas; Paulo Artaxo, pesquisador e membro do IPCC, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU; e José Marengo, membro do IPCC e coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden) para explicar o que esse cenário pode causar e o que devemos esperar do futuro.

O que significa ultrapassar 1,6°C na temperatura para o clima?

Cientistas no mundo todo vêm alertando sobre o aumento da temperatura global. O calor é um risco à saúde humana e à natureza, muda o clima e pode até fazer países desaparecerem, como as Ilhas no Pacífico que podem sumir com o aumento do nível das águas – consequência do aquecimento global.

Quando foi feito o Acordo de Paris, em 2015, o que as pesquisas apontavam era que seria necessário reduzir essas emissões para evitar que o planeta chegasse aos 2°C de aquecimento. Ou seja, o esperado era que a Terra chegasse a temperatura atual apenas décadas de 2025.

No entanto, desde o acordo, a transição energética — para que o mundo usasse menos combustíveis fósseis em sua produção — andou a passos lentos. As emissões continuaram a subir. (Veja o gráfico abaixo)

Dados mostram que 2024 atingiu recorde de emissões de gases do efeito estufa — Foto: Arte/g1

À época do acordo, o ano de 2015 tinha sido o mais quente já registrado na Terra e a temperatura média global tinha aumentado em 0,90°C – o que já era considerado um alerta. Mas não parou por aí: os últimos 10 anos seguiram batendo recordes, ano a ano. Com isso, ficando mais perto do limite.

🔥 Por exemplo: em 2021, o aumento da temperatura média global tinha sido de 1,11°C em relação aos níveis pré-industriais. Em 2022 esse número foi para 1,15°C, superado em 2023 para 1,48°C e, agora, 2024 ultrapassa todos os índices ao chegar a 1,6°C.

Ou seja, enfrentamos “uma década de calor mortal”, como declarou a Organização das Nações Unidas (ONU) e esse calor significa que podemos estar mais perto de atingir níveis em que não é mais possível reverter.

Para Paulo Artaxo, membro do IPCC, painel ligado à ONU, o índice pode indicar que chegamos ao limite, avançando décadas em relação ao que a ciência havia previsto.

"O que estamos observando é que estamos ultrapassando todos os limites e isso significa que podemos já estar no caminho dos 2°C, o que não pode acontecer. Isso significa um colapso, principalmente para países tropicais como o nosso".

— Paulo Artaxo, pesquisador e membro do IPCC, o painel sobre mudanças climáticas da ONU.
Carlos Nobre, referência mundial em estudos sobre mudanças climáticas, também reforça que o índice indica que, caso as emissões não sejam reduzidas, é possível que não consigamos impedir a Terra de chegar a uma temperatura de “colapso”.

Rio Madeira em meio á seca — Foto: DNIT

Como isso afetou o Brasil e quais os riscos para o país?

De acordo com o centro europeu Copernicus, todos os continentes pelo mundo foram afetados pelas altas temperaturas. No Brasil, análises de órgãos locais como o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) mostram que o país viveu o ano mais quente de sua história.

Um levantamento do Centro Nacional de Desastres Naturais (Cemaden), órgão do governo federal que apoia na tomada de decisões sobre extremos climáticos, feito a pedido do g1 mostra que nos últimos 80 anos há regiões no país que ficaram até 2,2°C mais quentes.

A análise usou os dados do Copernicus, mas com o recorte nacional, por bioma, representando as regiões do país, e observou a diferença de temperatura entre 2024 e o que foi observado em 1940, início da série histórica.

Veja os índices por bioma:

🔥 No Pantanal, o aumento da temperatura nos últimos 84 anos foi de 2,2°C, o que abrange regiões do Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, por exemplo.
🔥 Na Mata Atlântica, que fica na região Sudeste, o índice foi de 1,72°C.
🔥 No Cerrado, que cobre parte do Centro-Oeste e Nordeste, as temperaturas ficaram 1,61°C mais altas.
🔥 Na Caatinga o aumento foi de 1,3°C no período de 80 anos;
🔥 No Pampa, que fica na região Sul, o aumento foi de 0,62°C.

O aumento das temperaturas também causou extremos. Em 2024, o país viveu a pior seca já registrada em sua história recente. A estiagem fez a terra aparecer em meio aos rios do Norte, maior bacia do mundo. A falta de chuva fez a vegetação secou e vivemos incêndios recordes que cobriram parte do país de fumaça e tornou difícil respirar por meses.

Prédios praticamente somem no horizonte devido à camada de poluição e fumaça em São Paulo — Foto: Paulo Pinto/Agencia Brasil

Isso tudo aconteceu ao mesmo tempo em que na outra ponta do país, no Rio Grande do Sul, chuvas torrenciais se formassem, devastando cidades que ficaram completamente alagadas e matando dezenas de pessoas.

O que José Marengo, um dos principais especialistas do país sobre clima, explica é que o Brasil experimentou dos extremos que eram previstos quando a terra aquecesse além do patamar limite.

O Rio Grande do Sul foi prejudicado pelo grande volume de chuva que atinge o estado — Foto: Reprodução/TV Globo.

Marengo alerta que o Brasil é um dos países vulneráveis a esses extremos com o aumento das temperaturas e que se o patamar não for revertido, será como cair de um “penhasco alto”.

"O calor altera o clima e nos deixa expostos a desastres como ondas de calor intensas, seca, chuvas difíceis de conter os estragos. Passar desse patamar é como cair de um penhasco alto".

— José Marengo, pesquisador sobre o clima.

Um relatório recente do Cemaden, que faz o alerta de desastres no país, levando em conta desastres ligados às chuvas, aponta que apesar das oscilações, o volume de ocorrências chegou a patamares elevados. Em 2024, foram 1,6 mil ocorrências. (Veja o gráfico abaixo)

Os pesquisadores alertam que nesse período houve melhorias no monitoramento, o que fez com que os números crescessem. Ainda assim, o aumento das ocorrências de desastres se tornou uma realidade. Reforçam ainda que os dados são de ocorrências e não representam a magnitude. O caso do Rio Grande do Sul, por exemplo, é um dos piores desastres na história do país, o que faz de 2024 um marco quando se fala em tragédias por extremos.

Cestas de alimentos foram destinadas às famílias ribeirinhas afetadas pela seca extrema — Foto: Divulgação

Para além do risco à saúde e à vida, ainda há o risco para a economia. De um lado, há um gasto dos cofres públicos que precisam encontrar verba em meio às crises para apoiar as cidades afetadas. Entre 2011 e 2023, o governo federal perdeu R$485 bilhões com desastres naturais.

De outro, as perdas econômicas aos setores produtivos no país. Segundo a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), em um balanço que reuniu dados apenas de 2024 sobre a seca nos estados do Norte, região mais afetada pela crise, os prejuízos financeiros chegam a R$ 2 bilhões.

E se a média global superar os chegar aos 2°C mais quentes que a era pré-industrial?

O que os especialistas apontam é que as previsões são de que cidades pelo país fiquem até 4°C mais quentes. Isso significa um calor insuportável.


Fumaça de queimadas contribuem para o aquecimento do globo — Foto: REUTERS/Adriano Machado

O que é preciso fazer para frear o avanço das temperaturas?

A única maneira de conter o avanço das temperaturas e evitar que o mundo atinja a marca de risco de 2°C é frear as emissões de gases do efeito estufa.

De acordo com os dados divulgados nesta sexta-feira (10) pelo Copernicus, as emissões vem aumentando em 2024 e podem ter chegado a patamares maiores dos que já registrados antes.

🔴 Você pode se perguntar: como isso acontece se há um acordo internacional para redução desses índices? Isso acontece porque o compromisso não vem sendo cumprido e não é uníssono entre os países.

Empresas têm anunciado há alguns anos projetos de redução de emissão, mas especialistas apontam que isso não está sendo feito na velocidade que o mundo precisa.

A humanidade como um todo, em particular os países desenvolvidos e a indústria do petróleo, fracassou em reduzir as missões e acabar com a exploração de combustíveis fósseis.

— Paulo Artaxo, membro do IPCC.

Na COP 30, que acontece no Brasil, os países vão ter que anunciar as novas metas, atualizando o acordo de Paris. Para Carlos Nobre, essa edição da conferência, em que novas metas são estabelecidas, acontecendo depois de um anúncio como esse, torna o evento no Brasil um dos mais importantes desde a sua criação, mas é também um desafio.

“Os desafios do país são muito grandes para essa COP. A edição vai ser muito estratégica para mudar o patamar do aquecimento global que estamos observando atualmente”, reforça Carlos Nobre.

País é o sexto maior emissor de gases do efeito estufa — Foto: Reprodução/TV Globo

O Brasil já anunciou uma atualização do seu compromisso do Acordo de Paris e afirmou que prevê reduzir suas emissões de gases de efeito estufa entre 59% e 67% até 2035.

No entanto, o que especialistas citam é que, com os índices atuais do clima, já não seriam o suficientes. Segundo o Observatório do Clima, o Brasil deveria se comprometer a reduzir as emissões líquidas em 92% até 2035. Isso significa chegar até a metade da próxima década emitindo, no máximo, 200 milhões de toneladas de gases de efeito estufa.

Para se ter ideia, atualmente, a emissão líquida do Brasil é de cerca de 2,3 bilhões de toneladas de gases – o país é o sexto maior emissor do planeta.

China, Estados Unidos, Índia, União Europeia (UE), Rússia, Brasil, Indonésia, Japão, Arábia Saudita e Canadá foram os 10 maiores emissores de gases de efeito estufa (GEE) em 2023 de acordo com o relatório mais recente do EDGAR (Emissions Database for Global Atmospheric Research) da União Europeia.

Um ponto de atenção para o país é a questão da Foz do Amazonas. No ano passado, a Petrobras descobriu uma acumulação de petróleo em águas ultraprofundas da Bacia Potiguar, no poço exploratório Anhangá, na margem equatorial brasileira.

➡️ A margem equatorial se estende por mais de 2.200 km ao longo da costa entre o Rio Grande do Norte e o Oiapoque, no Amapá. A região é considerada a mais nova fronteira exploratória brasileira em águas profundas e ultraprofundas, e já foi chamada de "novo pré-sal".

A possibilidade de explorar petróleo nessa região é criticada por ambientalistas que apontam riscos de tragédias ambientais, afetando o território amazônico. A exploração depende da autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) – o que a Petrobras ainda não teve. Segundo o órgão, a empresa ainda não retornou ao último pedido de esclarecimentos para a avaliação, que estava em aberto desde 2024.

A possibilidade de explorar petróleo em meio à transição pode parecer contraditória em meio ao anúncio de redução de emissões – e foi exatamente isso que Lula disse em uma entrevista em junho de 2024. E completou que “o Brasil tem que ganhar dinheiro com esse petróleo”.

Fonte: G1






segunda-feira, 6 de janeiro de 2025

Mais de 80% das espécies de árvores exclusivas da Mata Atlântica estão ameaçadas de extinção

 

Árvores como a araucária, espécie do Sul do Brasil antes bastante comum, tiveram declínio de pelo menos 50% e foram classificadas como “Em Perigo” (foto: Anderson Kassner-Filho/Floresta SC)

Estudo publicado na revista Science aponta, pela primeira vez, grau de ameaça de todas as espécies arbóreas do bioma, que mostrou ainda que 65% do total destas espécies está nas categorias de risco. Pesquisadores afirmam que dados são conservadores e quadro pode ser ainda mais preocupante

André Julião | Agência FAPESP – Um estudo liderado por pesquisadores brasileiros e publicado hoje (11/01) na Science aponta que 82% das mais de 2 mil espécies de árvores exclusivas da Mata Atlântica sofrem algum grau de ameaça de extinção. Do total de 4.950 espécies arbóreas presentes no bioma (incluindo as que ocorrem também em outros domínios), 65% estão com suas populações ameaçadas.

É a primeira vez que todas as populações das quase 5 mil espécies arbóreas da Mata Atlântica têm seu grau de ameaça avaliado segundo os critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), maior referência global em espécies ameaçadas.

“O número [de 82% de espécies endêmicas ameaçadas] foi um susto para nós, porque usamos uma abordagem conservadora. Levamos em conta se as espécies tinham ou não floresta disponível, independentemente de ser ou não uma floresta saudável, por exemplo. Mas nem todas as espécies conseguem se manter em fragmentos degradados. É possível, portanto, que a realidade seja ainda mais preocupante”, conta Renato Lima, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), em Piracicaba, e coordenador do estudo.

Parte do trabalho é fruto do pós-doutorado do pesquisador no Instituto de Biociências da USP, financiado com bolsa da FAPESP.

O levantamento foi realizado em mais de 3 milhões de registros de herbários e inventários florestais. Os pesquisadores adicionaram ainda o maior número possível de informações, como usos comerciais das espécies e séries temporais de perdas de hábitat, entre outros. Os dados dos inventários florestais foram armazenados no repositório TreeCo, administrado por Lima.

Outro dado preocupante encontrado é que apenas 7% das espécies endêmicas tiveram declínio populacional abaixo de 30% nas últimas três gerações. A IUCN considera que, acima desse patamar, a espécie já pode ser considerada “Vulnerável”, a primeira categoria de ameaça de extinção. Acima dessa estão “Em Perigo” e “Criticamente em Perigo”.

Entre as ameaçadas, 75% estão na categoria “Em Perigo”. Já o emblemático pau-brasil (Paubrasilia echinata) foi listado como “Criticamente em Perigo”, dada a redução estimada de 84% das suas populações selvagens.

Árvores antes comuns, como a araucária (Araucaria angustifolia), o palmito-juçara (Euterpe edulis) e a erva-mate (Ilex paraguariensis), tiveram declínios de pelo menos 50% e por isso foram classificadas como “Em Perigo”.

Espécies exclusivas da Mata Atlântica, entre elas a canela (espécies como Ocotea odorifera e O. porosa), sofreram reduções de 53% a 89%, sendo classificadas como “Em Perigo” ou “Criticamente em Perigo”.
A Ocotea porosa foi uma das espécies de canela listada no levantamento (foto: Anderson Kassner-Filho/Floresta SC)

Levantamento inédito

A IUCN conta com uma série de critérios para definir o grau de ameaça de uma espécie, seja animal ou vegetal, divididos entre A, B, C e D. No estudo atual, os pesquisadores observaram que, quanto mais dados eram inseridos, o grau de ameaça aumentava.

Em linhas gerais, o critério A avalia o declínio da população nas últimas três gerações; o critério B, o tamanho da área ocupada pela espécie; e os C e D se a população é pequena e em declínio ou muito pequena, com menos de 10 mil indivíduos adultos.

“Quando preenchemos menos critérios da IUCN nas avaliações, o que geralmente tem sido feito até então, temos seis vezes menos espécies ameaçadas. O uso de critérios que incorporam os impactos do desmatamento aumenta drasticamente o nosso entendimento sobre o grau de ameaça das espécies da Mata Atlântica, que é bem maior do que pensávamos anteriormente”, explica Lima.

Para ilustrar a diferença, o grupo separou um conjunto de espécies que possuía dados para todos os critérios e avaliou o grau de ameaça. Levando em conta todas as espécies desse subgrupo, se considerado apenas o critério A, 91,4% do total de espécies estariam ameaçadas e 90,3% das exclusivas da Mata Atlântica.

Ao utilizar apenas o critério B, muitas vezes o único usado em levantamentos do tipo, só 10,7% das espécies ou 16,6% das endêmicas estariam ameaçadas. Tendo os critérios C e D como referência, então, 3,2% das endêmicas seriam consideradas ameaçadas e, no máximo, 2,5% do total.

O método inovador será utilizado a partir de 2024 para avaliar o grau de ameaça das cerca de 12 mil espécies vegetais presentes exclusivamente no Brasil e que ainda não passaram por esse tipo de avaliação. O trabalho é realizado pelo Centro Nacional de Conservação da Flora, do Jardim Botânico do Rio de Janeiro, onde atuam alguns dos coautores do estudo.

Os autores propõem ainda que o método possa ser utilizado em escala global. Em uma simulação usando dados de outras florestas tropicais, os pesquisadores atestaram que 30% a 35% das espécies de árvores do planeta podem estar ameaçadas apenas pelo desmatamento.

“Informações desse tipo são primordiais para a criação de políticas públicas de conservação e reflorestamento. Pode-se priorizar áreas mais degradadas e espécies mais ameaçadas, sem deixar de considerar locais em que há florestas que podem não ser mais viáveis no longo prazo se algo não for feito agora”, comenta o pesquisador.

A boa notícia é que cinco espécies consideradas extintas na natureza foram redescobertas no estudo. Por outro lado, 13 espécies de árvores exclusivas da Mata Atlântica foram reclassificadas como possivelmente extintas.

O artigo Comprehensive conservation assessments reveal high extinction risks across Atlantic Forest trees pode ser lido por assinantes em: www.science.org/doi/10.1126/science.abq5099.

Fonte: Agência FAPESP



sábado, 4 de janeiro de 2025

PRAÇAS DO POP HOMENAGEIAM PERSONALIDADES RELACIONADAS À LAGOA DE PIRATININGA E À CRIAÇÃO DO PARQUE

 

Praças do Parque Orla de Piratininga Alfredo Siris recebem nomes em homenagem a pessoas relevantes 

No dia 21 de dezembro de 2024, publiquei o Decreto 15.664/2024 para "Nominar as praças que compõem o conjunto arquitetônico, paisagístico, e urbanístico do espaço denominado Parque Orla de Piratininga Alfredo Sirkis". Estas praças foram criadas ou requalificadas no processo de urbanização e estruturação de equipamentos públicos por ocasião da implantação do parque, que protege o entorno da Lagoa de Piratininga.  

Ao todo, seis praças receberam nomes que homenageiam personalidades que contribuíram para a criação do Parque Orla de Piratininga Alfredo Sirkis (POP), uma das iniciativas do Programa Região Oceânica Sustentável (PRO Sustentável), para a proteção da Lagoa de Piratininga ou tiveram importância para as comunidades do entorno do parque.

Saiba, a seguir, quais são as seis praças e os respectivos homenageados:

Recanto Boechat.

Ao centro, a Sra. D. Mercedes Boechat, mãe de Carlos Boechat.

Engenheiro Carlos Boechat próximo a um dos acessos ao POP.

1- Praça Recanto Boechat

Carlos Alberto Boechat (1950 - 2020) 

Engenheiro e ex-secretário regional da Região Oceânica. Servidor público, valoroso profissional empenhado na administração cidade tendo contribuído no desenvolvimento, planejamento, execução e finalização das obras e projetos da Região Oceânica de Niterói. Foi fundamental no processo de planejamento, estruturação e diálogos com a sociedade para a implantação do Parque Orle de Piratininga Alfredo Sirkis. Como engenheiro dos quadros da Prefeitura de Niterói, participou de muitas obras de infraestrutura da cidade. Grande liderança política e comunitária, com personalidade marcante, seu grande sonho era ser eleito vereador de Niterói, o que aconteceu nas eleições municipais de 2020. Infelizmente, Boechat faleceu de COVID-19, aos 70 anos, no dia 12 de dezembro de 2020, dias antes de tomar posse. Em reverência à sua imagem, a Justiça Eleitoral o diplomou como vereador post-mortem. A Praça Recanto Boechat foi inaugurada no dia 17 de junho de 2023


Angelino Conceição, importante liderança nas comunidades Ciclovia e Barreira.

Angelino Conceição.

2- Praça Angelino Conceição (Osiris)

Angelino Conceição (1986 – 2020) 

Produtor cultural, liderança comunitária na Comunidade da Ciclovia, diretor do projeto "A juventude Viva", desenvolveu diversos serviços sociais para crianças, jovens e idosos da Comunidade da Ciclovia/Barreira. Angelino foi importante interlocutor entre a equipe da Prefeitura, principalmente os técnicos do Programa Região Oceânica Sustentável (PRO Sustentável) e as comunidades, nos diálogos e esclarecimentos sobre o POP, os benefícios do parque.


Paulo Sérgio Manhães Peixoto

3- Praça Paulo Peixoto (Arrozal) 

Paulo Sérgio Manhães Peixoto (1950 - 2020) 

Servidor público, fundou o Grupo Espírita Paz e Renovação (GEPAR) e Creche Meimei, ambos nos limites do POP. Dedicou a vida para caridade, transformação social através do acolhimento e educação, atuando intensamente na Comunidade da Ciclovia/Barreira. Foi liderança muito atuante no movimento ecumênico de Niterói.


Lejeune Henriques Pacheco de Oliveira.

4- Praça Lejeune de Oliveira (Centro de Esporte e Lazer do Camboatá) 

Lejeune Henriques Pacheco de Oliveira (1915 - 1982) 

Médico, pesquisador em Parasitologia e Limnologia, professor, conferencista e escritor, tendo publicado vários trabalhos resultantes de excursões cientificas pelo Estado do Rio de Janeiro, especialmente nas baias de Ilha Grande, Sepetiba e Guanabara. Publicou interessantes estudos sobre as lagoas/lagunas do estado do Rio de Janeiro, inclusive sobre Piratininga e Itaipu. Saiba mais sobre Lejeune de Oliveira.


Patrícia Bello (Tia Paty). Foto cedida por familiares.

5- Praça da Tia Paty 

Patrícia Bello (1971 - 2021) 

Professora, dedicou sua vida ao bem-estar das crianças e aos cuidados com a comunidade, onde instalou brinquedos infantis para o lazer dos pequenos, sendo este espaço conhecido como Praça da Tia Paty.


6- Praça Omar Serrano (Cotovelo) 

Omar Serrano ( - 2010) 

Líder comunitário, ambientalista, que recebeu o título de cidadão niteroiense em 1990 por sua atuação na preservação do patrimônio socioambiental do município de Niterói. Atuou na Federação das Associações de Moradores de Niterói - FAMNIT, no Movimento de Resistência Ecológica - MORE e Movimento Cidadania Ecológica - MCE, tendo participado ativamente de mobilizações pela Baía de Guanabara, pela criação do Parque Estadual da Serra da Tiririca - PESET, pela proteção do Sistema Lagunar de Piratininga e Itaipu e debates no Legislativo Municipal por ocasião da aprovação da Lei Orgânica de Niterói, do Plano Diretor de Niterói (1992) e outras leis.

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Além das praças, o POP também homenageia outras duas personalidades importantes para a causa ambientalista e de proteção ao patrimônio ambiental do Brasil e de Niterói:


Alfredo Hélio Sirkis

Sirkis e Al Gore em evento internacional sobre mudanças climáticas.

Alfredo Sirkis (1950 - 2020)

O Parque Orla de Piratininga (POP) recebeu o nome de Alfredo Sirkis em homenagem à importância e ao trabalho deste para a causa ambiental e das mudanças climáticas. Ambientalista, político, jornalista e escritor, Sirkis foi um dos pioneiros na luta pela preservação do meio ambiente no Brasil, e um dos fundadores do Partido Verde. Sirkis foi um dos pioneiros na luta pela preservação do meio ambiente no Brasil, e um dos fundadores do Partido Verde, em janeiro de 1986. Em 1991, assumiu a presidência nacional do partido.

Como o primeiro secretário de Meio Ambiente do Rio de Janeiro, em 1996, foi o responsável pelo reflorestamento de 660 hectares (mais de 6 milhões de m2 de área desmatada), em 47 comunidades da capital fluminense. Por sua orientação, foram construídos 80 quilômetros de ciclovias no Rio de Janeiro. Entre outubro de 2016 e maio de 2019, foi o coordenador Executivo do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima (FBMC), até o colegiado ser extinto pelo presidente Jair Bolsonaro. Fundou e foi diretor executivo do Centro Brasil no Clima, que hoje tem a liderança do seu filho, Guilherme.

Autor de nove livros, ganhou o Prêmio Jabuti de 1981, por "Os Carbonários" (1980). A minha última oportunidade de estar com ele foi por de forma on-line, poucos dias antes do seu falecimento, por ocasião do lançamento do seu último livro, intitulado "Descarbonário" (2020), uma obra importante onde conta histórias interessante e com muito humor da sua própria trajetória, mas também debate o papel e como o Brasil pode se beneficiar de um mundo em descarbonização. Outro livro valioso é "Pólis ou Babel: Megalópolis: reflexão e ação em grandes cidades" (2012), onde debate a importância e a responsabilidades na crise climática global.


Centro EcoCultural Sueli Pontes, sede do Parque Orla de Piratininga.

Sueli Pontes (  - 2020)

Sueli Pontes era ambientalista e arquiteta. Moradora do Jardim Imbuí (Tibau) foi uma ativa defensora da proteção e recuperação da Lagoa de Piratininga. Seu nome foi escolhido para homenagem no Centro EcoCultural Sueli Pontes, sede do Parque Orla de Piratininga Alfredo Sirkis (POP), oferecendo um programa de educação ambiental focado no próprio POP e seus equipamentos, como os jardins filtrantes, contando com uma exposição permanente sobre os ecossistemas da Lagoa de Piratininga e da Bacia Hidrográfica da Região Oceânica de Niterói. O Centro EcoCultural (chamado pela população de  EcoPOP) também é o primeiro equipamento cultural público da Região Oceânica.

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Um outro equipamento público do POP disponível para o uso da população é a Ilha do Tibau, onde a Prefeitura desenvolve o Núcleo Avançado de Sustentabilidade, Cultura e Esporte - NASCE. O POP também oferece trilhas e passeios como o da Rua Estrela, que se estende até às margens da Lagoa de Piratininga, a trilha do Pontal e como é limítrofe ao Parque Natural Municipal de Niterói - PARNIT, Setor Morro da Viração, há ainda a oportunidade de muitas atrações de ecoturismo a ser explorada pelos visitantes.

Axel Grael
Prefeito de Niterói
(2021-2024)
 

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LEIA TAMBÉM:

Alfredo Sirkis: a despedida de um campeão da sustentabilidade 




quarta-feira, 1 de janeiro de 2025

Clin retira cerca de 90 toneladas de resíduos da orla no pós-Réveillon


A Companhia de Limpeza de Niterói (CLIN) recolheu cerca de 90 toneladas de resíduos das vias públicas e praias no pós-Réveillon. Deste total, cerca de 50 toneladas foram retiradas apenas da praia de Icaraí. A operação foi iniciada às 6h e a limpeza foi concluída antes das 10h do dia primeiro de janeiro de 2025.

Foram cerca 800 funcionários realizando o serviço de limpeza das vias, sendo cerca de 600 concentrados na área da praia de Icaraí. Os materiais mais encontrados foram: garrafas pet, garrafas de vidro e latas de alumínio.

Para auxiliar o trabalho manual a CLIN utilizou diversos equipamentos específicos. Foram disponibilizados para a operação, 200 contêineres e cerca de 100 equipamentos, entre caminhões basculantes, pás mecânicas, retroescavadeiras, além de pipa d’água, utilizando água de reuso, para 2 lavagens que concluíram a limpeza com desodorizador de eucalipto.

Fonte: Prefeitura de Niterói


DISCURSO NA TRANSMISSÃO DE CARGO PARA RODRIGO NEVES E ISABEL SWAN





Hoje, com muita emoção e sentimento de dever cumprido, transmiti o cargo de prefeito a Rodrigo Neves e dei as boas-vindas à querida Isabel Swan, que assume a vice-prefeitura.

A cerimônia ocorreu no Teatro Municipal. Seguindo o cerimonial do novo governo, fiz o discurso de Transmissão de Cargo e, junto com Christa, me despedi do público presente, composto pela equipe que compôs o meu governo, da nova equipe e convidados para a cerimônia. Acompanhados até a porta pelo novo prefeito Rodrigo Neves, deixamos a cerimônia que teve continuidade com a posse da nova equipe.

Encerrei o ciclo que considero o mais importante da minha trajetória de vida, de militância ambiental, social e profissional. Foram 12 anos dedicados a transformar a cidade de Niterói na direção daquilo que sempre sonhamos: uma cidade com qualidade de vida, inclusiva, com justiça social, de oportunidades para todos e uma referência de sustentabilidade urbana, de resiliência climática, de zelo pela sua cultura e seu patrimônio histórico.

Para isso, dedicamos todos os nossos esforços nos últimos 12 anos, principalmente no período que tive a honra de ser o prefeito da cidade, entre 2021 e 2024.

O prefeito não é o dono da cidade nem manda sozinho, enfrenta muitas dificuldades e avança de acordo com a mediação de forças que faz com a sociedade. Mas, tem muitas ferramentas nas mãos para promover a transformação. Assim, chegamos a este momento podendo olhar para o legado que deixamos e ter a sensação que a cidade agora tem muito da nossa cara. Muito do que sempre sonhamos.

Sonhos alcançados...! Foi a ênfase do discurso que fizemos e que reproduzimos para registro aqui.

O nosso agradecimento a todos que estiveram conosco nessa caminhada e ajudaram a construi-las.

A nossa eterna gratidão!

Viva Niterói!!!!!

Axel Grael
Prefeito de Niterói
(2021-2024)


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Senhoras e senhores,

Neste momento em que encerro o mais encantador desafio da minha vida pública, SER PREFEITO DE NITERÓI, olho para trás e me permito sentir orgulho dos passos que me trouxeram até aqui.

Minha luta pelo desenvolvimento com respeito ao meio ambiente e justiça social teve início ainda nos anos 70, quando comecei a estudar engenharia florestal. Em 1980, fundei o Movimento de Resistência Ecológica – MORE, organização histórica do movimento ambientalista. Nosso foco inicial era combater a poluição da Baía de Guanabara. Na época, pouco se falava de meio ambiente, sobre mudanças climáticas ou mesmo em sustentabilidade, termo que só se tornou mais conhecido 20 anos depois. Sequer era usual o termo “ambientalista”. Éramos chamados de “ecologistas”.

Há 26 anos, tive a satisfação de ver o Projeto Grael se tornar realidade. Hoje, mais de 20 mil crianças e jovens estudantes da rede pública de educação já foram beneficiados por este programa que tive oportunidade de implantar com meus irmãos, Torben e Lars Grael. O Projeto Grael me aproximou ainda mais da Educação e das outras causas sociais.

Foram décadas de trabalho e dedicação, seja como militante, voluntário, como servidor público concursado, ou em diferentes cargos públicos, como presidente da FEEMA, do IEF, ou como subsecretário de Meio Ambiente do estado do RJ. Sempre estive na defesa dos preceitos legais, dos conceitos éticos e valores morais para a construção de uma sociedade cada vez mais sustentável, livre, justa e igualitária.

Apesar de tão longa caminhada, os últimos 12 anos foram os mais produtivos em termos de realizações e conquistas. De 2013 a 2020, estive ao lado do prefeito Rodrigo Neves em seus dois primeiros mandatos.

Com o apoio do PDT, do prefeito Rodrigo Neves, do nosso grupo político, dos demais partidos que compuseram a nossa aliança e de muitas pessoas que acreditaram em nosso projeto, fui eleito prefeito de Niterói com 62,5% dos votos, no primeiro turno, tendo ao meu lado o vice-prefeito Paulo Bagueira. Servi como prefeito à cidade que eu amo de 2021 a 2024 com muito empenho, dedicação e vontade de dar continuidade à construção da Niterói que sempre idealizamos.

Assim, muitos sonhos antigos foram conquistados:
  • Como disse, comecei a minha militância ambientalista na década de 1970, defendendo a Baía de Guanabara. Portanto, como cidadão, como profissional e como ambientalista lutei contra a poluição e a favor do saneamento. Como vice-prefeito e depois como prefeito, ajudei Niterói a se aproximar da universalização da coleta e tratamento do esgoto e se tornar uma das melhores cidades do país no assunto. Destaco aqui os resultados do programa Ligado na Rede: só na comunidade da Boa Esperança e na Bacia do Rio Jacaré, fizemos 550 ligações à rede coletora de esgoto, beneficiando 2 mil pessoas e evitando que 7,1 milhões de litros de esgoto sem tratamento chegassem à Lagoa de Piratininga. Com o programa, a comunidade do Boa Esperança passa a ser a primeira 100% saneada em Niterói.
  • Como engenheiro florestal e ambientalista lutei pela criação do Parque Estadual da Serra da Tiririca e pela criação de mais parques em Niterói. Hoje temos mais de 56% do território da cidade protegido e temos o Parque Orla de Piratininga Alfredo Sirkis, o mais inovador e premiado parque natural municipal do país. Como prefeito, criei ainda o Parque do Morro do Morcego Dora Negreiros, o Parque das Águas Escondidas, da Floresta do Baldeador, de Pendotiba e o Monumento Natural do Morro da Pedreira, em Icaraí. Fomos reconhecidos pela FAO como referência mundial em florestas urbanas. Só nas ruas da cidade, temos uma arborização com 55 mil árvores catalogadas no SIGEO, através do projeto Arboribus.
  • Outra grande prioridade dos tempos de ambientalista era a recuperação do Sistema Lagunar de Piratininga e Itaipu: uma agenda que esperamos mais de 40 anos para conseguir tirar do papel. Idealizei e como prefeito inaugurei o POP Sirkis, com os seus jardins filtrantes – que é o maior investimento nas Américas em Soluções Baseadas na Natureza - SBN. Os jardins filtrantes evitam que a lagoa de Piratininga continue a se degradar, retendo sedimentos, nutrientes e outros poluentes. Como parte dos cuidados com a Lagoa de Piratininga, fizemos a renaturalização do Rio Jacaré, a primeira iniciativa de recuperação de um rio urbano no Brasil. Iniciamos também a obra de estabilização do Canal de Itaipu, desenvolvemos o projeto e licitamos a obra de recuperação do Túnel do Tibau e implantamos o Centro Ecocultural Sueli Pontes, o primeiro equipamento cultural público da Região Oceânica e um grande e belo espaço dedicado à educação ambiental e à compreensão dos ecossistemas da Bacia das lagoas de Piratininga e Itaipu.
  • Na década de 1980, lutei também por ciclovias em Niterói, organizando “bicicleatas” pela cidade. Era como pregar no deserto. Diziam que ninguém ia andar de bicicleta em Niterói. Mas, como vice-prefeito e prefeito implantamos o programa Niterói de Bicicleta e chegamos a 86 km de ciclovias. Somos referência no país, temos a ciclovia mais movimentada do Brasil, implantamos as já famosas “roxinhas”, que segundo o site da NitBike já proporcionou mais de 530.000 viagens, prevenindo a emissão de 214,65 t de CO2. Temos ainda a maior proporção de mulheres e idosos pedalando no país.
  • Como ambientalista e profissional de meio ambiente, acompanho desde a Rio-92 os debates sobre a evolução da emergência climática. Somos a primeira cidade a se preparar para enfrentar os desafios das mudanças climáticas! Como prefeito, criei a primeira Secretaria Municipal do Clima e Niterói se tornou uma referência nacional e internacional sobre políticas climáticas locais. Desenvolvemos o Plano de Mitigação, Adaptação e Resiliência Climática, estabelecendo as metas de redução das emissões líquidas de CO2e em 34% até 2030, 40% até 2040 e 100% até 2050. Uma referência de compromisso climático local. No aspecto da resiliência climática, lembro que quando assumimos em 2013, ainda éramos conhecidos como a cidade da tragédia do Morro do Bumba. De lá para cá, fizemos o maior investimento em resiliência no país, com 1 bilhão de reais investidos em contenção de encostas nos últimos 12 anos. Só na atual gestão, foram investidos 700 milhões em obras de contenção de encostas. Estamos muito perto de resolver os principais problemas de drenagem de Niterói. Na Região Oceânica já realizamos quase 100% das iniciativas planejadas e estamos executando agora a maior de todas estas obras, que é a drenagem do Barreto/Engenhoca. Os investimentos em drenagem e pavimentação na atual gestão alcançaram mais de 367 milhões de reais. Deixamos para a nova gestão o estudo já contratado e que está em andamento para a solução da última das grandes pendências da cidade: a drenagem do Rio Icaraí, que afeta a Avenida Roberto Silveira.
  • Como gestor público me aproximei, na época da FEEMA, das políticas de emergências e riscos ambientais. Como vice-prefeito e prefeito uma boa parte da minha atenção esteve em construir a melhor Defesa Civil do país. Hoje, temos uma equipe de competência reconhecida e bem treinada, um radar meteorológico (o mais moderno do país), uma rede de pluviômetros, uma rede de monitoramento hidrológico, além de estações meteorológica e rede de monitoramento da qualidade do ar.
  • Pertencendo a uma família de atletas, tendo a clara convicção da importância do esporte em todas as suas dimensões – inclusão social, educação, saúde e economia - viabilizei a implantação do Parque Esportivo e Social do Caramujo, do Parque Esportivo de Niterói, na Concha Acústica – que em breve ganhará a Arena Poliesportiva -, a reforma do Complexo de Atletismo Aída dos Santos, em parceria com a UFF, além do Parque Esportivo do Viradouro e os equipamentos esportivos nas comunidades. Implantamos o Niterói Esporte na Comunidade - NEC, que atende quase 2.000 alunos e inauguramos recentemente o Educação Joga em Rede, proporcionando mais um espaço esportivo de qualidade para a cidade. No POP implantamos o NASCE, na Ilha do TIBAU, para tambem oferecer oportunidades de esportes, recreacao e cultura.
  • Com a experiência do Projeto Grael, sempre quis avançar mais na união do meio ambiente, formação profissionalizante e inclusão social num mesmo projeto: concebemos então o Niterói Jovem Ecosocial, uma das mais belas e inovadoras iniciativas em desenvolvimento pela Prefeitura e que já beneficiou 1.500 jovens das comunidades de Niterói.
  • Como militante do PDT, inspirado na experiência de ter trabalhado com Brizola e Darcy Ribeiro, no segundo governo Brizola, implantei projetos sociais como a Moeda Social Arariboia – que hoje já beneficia 45 mil famílias e já injetou R$ 500 milhões na economia. O somatório das políticas sociais atingiu 868 milhões no atual governo. Também iniciamos o maior programa de obras de infraestrutura em comunidades de Niterói, beneficiando 15 comunidades e investindo cerca de R$ 150 milhões. Iniciamos o que talvez seja o maior programa de regularização fundiária em curso no país, que entregará 10.000 títulos. Na educação, o grande tema dos trabalhistas, entregamos 31 escolas em 12 anos, fizemos concurso para professores, climatizamos todas as escolas e avançamos muito.
  • Sempre tive um olhar especial para a cultura, para as artes e para o patrimônio histórico da cidade. Praticamos na atual gestão o maior investimento da história na proteção patrimonial, com a entrega da Ilha da Boa Viagem, do Mercado Municipal, da Casa Norival de Freitas, do Castelinho do Gragoatá e demos início à restauração do Cinema Icaraí, além de desapropriar e iniciar as obras de restauro da Cantareira e do Casarão da Alameda. Estes investimentos somaram 63 milhões de reais. Com os editais de fomento apoiamos as artes e a cultura na cidade e com o Projeto Aprendiz Musical, saímos de 2.400 alunos em 2021 para 10.000 alunos aprendendo a tocar um instrumento musical em Niterói.
  • Preocupado com a questão ambiental, da qualidade de vida e das características urbanas de cidade, sempre participei ativamente dos processos de planejamento urbano de Niterói. Após a aprovação do novo Plano Diretor de Niterói, em 2019, fizemos um amplo debate sobre a Lei Urbanística de Niterói, que foi finalmente aprovada no início de 2024. A nova lei traz muito do nosso sonho de ver a cidade desenvolver-se nas próximas duas décadas sob conceitos de sustentabilidade, resiliência e das melhores soluções urbanísticas. A Lei Urbanística garante definitivamente a proteção dos parques e das áreas ambientalmente mais sensíveis.

Poderia ficar muitas horas aqui falando - com orgulho - sobre os muitos sonhos alcançados. Os desafios são enormes e, sem sonhos e ideologia a nos impulsionar não há como superar todas as dificuldades. A vida pública, quando levada a sério, é de muito trabalho, dedicação e perseverança e precisamos dessa motivação. O amor por Niterói não nos deixa esmorecer.

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“FELICIDADE É VIVER AQUI!” diz o slogan da nossa última campanha publicitária. Ajudar a construir a felicidade dos niteroienses através de políticas públicas e serviços eficientes também faz parte dos sonhos de qualquer gestor que ama a cidade e o seu povo. Na primeira reunião de secretariado, estabelecemos um prazo para que cada dirigente apresentasse a avaliação dos serviços prestados pela sua pasta. Isso desdobrou num Portal de Serviços ao Cidadão, que possibilitou atendimentos mais rápidos e eficientes.

Nunca se ouviu tanto o cidadão como nesses últimos 12 anos. Foram audiências públicas, consultas pelo COLAB, diálogos com lideranças sociais, pesquisas de opinião e muita conversa pelas ruas. Priorizamos aquilo que o cidadão demandou.

Na segurança pública, liderados pelo prefeito Rodrigo Neves e com o Niterói Presente e investimentos estratégicos como o CISP e o Pacto Niterói Contra a Violência, reduzimos os indicadores de violência e criminalidade para índices históricos. De longe, os melhores da Região Metropolitana. Interferências político-eleitoreiras tentaram atrapalhar, mas não deixamos que acontecesse e mantivemos a nossa cidade protegida.

Na Saúde, enfrentamos a COVID-19 e coube à atual administração enfrentar alguns dos momentos mais difíceis da pandemia, superando uma conjuntura política criminosamente negacionista, mas sem deixar de proteger a população. Coube-nos a responsabilidade de proceder a vacinação e desenvolver as políticas de retomada econômica, com destaque para o Plano Niterói 450 Anos.

Desapropriamos, em 2022, o Hospital Oceânico, que recebeu o nome de Dr. Gilson Cantarino, em homenagem ao grande médico e gestor público niteroiense. Modernizamos a gestão do Hospitais Carlos Tortelli e Mário Monteiro, reformamos e entregamos novas unidades de saúde. A Maternidade Alzira Reis está com as suas obras civis prontas restando apenas a instalação de equipamentos e poderá ser inaugurada em poucas semanas. Mas, igualmente importante foi o concurso público para o ingresso de mais de 1.000 profissionais de saúde, resolvendo o problema histórico da precariedade das relações de trabalho que era baseado há muitos anos em contratações por RPA. Com isso, temos um novo serviço de atenção básica, com um Médico de Família renovado e mais eficiente.

Uma das principais demandas da sociedade sempre foi o trânsito e a mobilidade. Aprovamos recentemente o subsídio para as passagens de ônibus, de forma a fortalecer e a incentivar o uso do transporte coletivo. Buscamos soluções estruturantes para a mobilidade e para o trânsito. Foi o caso dos recursos garantidos para a primeira fase da implantação do VLT de Niterói e a aquisição dos ônibus elétricos, já licitados. Fizemos obras importantes para resolver problemas pontuais, como a Praça Stuessel Amora (conhecida como a Rotatória de Camboinhas) e a Praça José Bedran, em Icaraí. Ambas resolveram gargalos do trânsito de Niterói. Também cabe repetir aqui a aposta de Niterói no transporte ativo por bicicletas, que já nos referimos aqui.

O Centro da cidade recebe obras que transformarão a sua realidade. O Novo Centro (entre a Visconde do Rio Branco e o Caminho Niemeyer), o Projeto Orla, a Nova Praça Arariboia, a Casa Norival, o Mercado Municipal e ganhará a Cantareira, além da já licitada recuperação da Avenida Amaral Peixoto. O Parque Esportivo do Centro, na Concha Acústica, e a pista de atletismo Aída dos Santos, na UFF, marcam a nova vocação do Centro de Niterói.

Outras iniciativas de grande impacto na economia da cidade é a dragagem do Canal de São Lourenço, que é um investimento de 150 milhões de reais da Prefeitura e a Parceria Público Privada que estruturamos para o funcionamento do Porto Pesqueiro de Niterói. As atividades fortalecerão os setores da construção naval, a logística offshore e a atividade portuária e o Porto Pesqueiro tem potencial para fazer com que atividade da pesca seja uma das mais fortes na economia de Niterói.

Enfim, foram 4,3 bilhões de reais investidos na infraestrutura de Niterói, no que eu chamo da Década de Ouro do Investimento Público em Niterói. Deste total, 2,6 bilhões de reais foram investidos só na gestão que se encerra. Quase 1 bilhão só em 2024, em mais de 500 frentes de obras em toda a cidade.

Nada disso teria sido possível sem o trabalho incansável dos profissionais da Prefeitura de Niterói. Quero aqui registrar meu especial agradecimento a cada um que se dedica a esta cidade, que faz com que a cada dia ela fique ainda mais bonita, bem cuidada, pujante e encantadora.

Também quero agradecer a parceiros fundamentais, como a Universidade Federal Fluminense, este patrimônio de Niterói, a Organizações Não-Governamentais, a Federação das Associações de Moradores, Câmara de Dirigentes Lojistas e demais organizações representativas, que tanto contribuem com a Prefeitura de Niterói.

Não posso deixar de dedicar especial agradecimento ao meu vice-prefeito, Paulo Bagueira, aos deputados e lideranças políticas niteroienses. Agradeço ao Poder Judiciário e à Câmara de Vereadores de Niterói pelo relacionamento cooperativo, alicerçado em valores republicanos, que pudemos manter nos últimos quatro anos.

Meu muito obrigado também a cada cidadão niteroiense pela confiança, apoio e até pelas cobranças, tão essenciais para o avanço de nossa sociedade. Como costumo dizer, se não fosse a busca pelo melhor, nós – seres humanos - ainda estaríamos vivendo nas cavernas... Por isso, o que desejo é que esta cidade continue sendo crítica, democrática e consciente.

Quero pedir licença a todos para fazer um agradecimento especial à minha esposa, sempre a meu lado como fonte de energia e inspiração. Christa, te amo.

Gente, ser prefeito de Niterói é bom demais! É um sonho administrar a cidade que a gente ama! No entanto, não é uma tarefa fácil. É uma corrida sem linha de chegada. A cidade não fica pronta nunca. Quanto mais a gente faz, mais é preciso fazer. Surgem novos desafios, novas realidades, novas expectativas que precisam ser atendidas.

Deixo hoje o cargo de prefeito de Niterói com a certeza do dever cumprido. Deixo para meu sucessor, meu amigo e irmão Rodrigo Neves, uma cidade ainda mais conectada às demandas dos niteroienses e pronta para enfrentar os novos desafios.

Mas, não vou parar por aqui. Niterói, o Estado do Rio e o Brasil podem ter certeza de que continuarei minha trajetória de luta por meus ideais democráticos, de sustentabilidade e igualdade social. Continuarei trabalhando para preparar nossa cidade, o País e o mundo para a nova realidade que já chegou.

Rodrigo, como costumamos brincar, você me entregou a cidade com o sarrafo lá no alto. Com muito trabalho, conseguimos colocá-lo mais acima. Estou deixando um superavit financeiro projetado de 2.9 bilhões de reais, 240% maior do que eu recebi. Só o valor acumulado pelo Fundo Previdenciário, Fundo Financeiro, Fundo de Oscilação de Riscos e Fundo da NiteróiPrev chega a 1,985 bilhão de reais. O crescimento patrimonial de 2012 a e 2024 chegou a 150 mil vezes. O FER superou a marca de 1,2 bilhões de reais.

Agora, tenho convicção de que, com toda sua experiência, espírito público, competência, obstinação e amor por nossa gente, implantará mais um ciclo de investimentos que fará de Niterói o melhor lugar do Brasil pra se viver e ser feliz!

Bons ventos a você, Rodrigo, a toda sua equipe e a Niterói!

Viva Niterói!

Discurso proferido por Axel Grael, no Teatro Municipal de Niterói, no evento de transmissão de cargo para o prefeito Rodrigo Neves e Isabel Swan, no dia 01 de janeiro de 2025.