O ano de 2025 marca a metade da Década da Nações Unidas de Restauração dos Ecossistemas. Um de seus motes alerta: “Nunca foi tão urgente reviver os ecossistemas danificados como é agora”. Ele não poderia ser diferente dado a importância da restauração para frear a emergência climática e impedir a extinção de diversas espécies. Ao observar os dados de desmatamento nos trópicos (área em que ocorre 96% da remoção de florestas do mundo), a situação é alarmante. Segundo dados mais recentes do Global Forest Watch, o mundo perdeu em um ano o equivalente a quase 10 campos de futebol por minuto de florestas tropicais primárias, o que emitiu 2,4 gigatons de CO² na atmosfera - quase metade das emissões anuais dos Estados Unidos. Manter florestas de pé é essencial para reduzir emissões de gases de efeitos estufa, na medida em que elas absorvem e armazenam carbono quando preservadas, mas o liberam quando derrubadas.
Florestas abrigam os ecossistemas mais biodiversos do mundo. A ameaça à essa diversidade afeta diretamente populações, a natureza e o clima. Atualmente, 1,6 bilhão de pessoas no mundo dependem diretamente de recursos de florestas para manter seu sustento. Além disso, florestas também fornecem serviços ecossistêmicos fundamentais para a existência humana e de outras espécies. A qualidade da água, do ar e do solo, bem como a regulação do clima, das chuvas e das temperaturas são serviços em risco com a perda da biodiversidade de florestas.
É nesse sentido que plataformas intergovernamentais foram estabelecidas buscando metas de restauração ambiciosas. O Brasil integra grande parte delas. A começar pelo Desafio de Bonn, que tem como objetivo a restauração de 350 milhões de hectares até 2030 no mundo todo. O país também é parte da Iniciativa 20x20 e a Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU, que objetivam, respectivamente, iniciar o processo de restauração de 50 milhões de hectares na América Latina até 2030 e restaurar 30% das áreas degradadas do mundo até a mesma data. Ainda recentemente, durante a COP 16 da Biodiversidade na Colômbia, o Brasil lançou a nova versão do Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg), o qual reafirma seu compromisso de restaurar 12 milhões de hectares de vegetação nativa até 2030.
Como restaurar?
A restauração em larga escala como prevista no Planaveg, no Desafio de Bonn e outras plataformas pode trazer avanços importantes na mitigação das mudanças climáticas, impedir a extinção de diversas espécies e evitar catástrofes ambientais. Assim sendo, é importante compreender qual a melhor forma de restaurar e como fazê-lo em escala. Projetos de restauração ainda são majoritariamente focados em técnicas de plantio direto. Porém, esse tipo de técnica é custo intensiva. Seu alto custo traz dificuldades para atingir a grande escala necessária, principalmente em países em desenvolvimento, os quais concentram a maior parte do potencial de regeneração. Reduzir a ação humana e aproveitar da capacidade de regeneração dos próprios ecossistemas é uma forma de reduzir custos e garantir a restauração. Essa prática tem nome: a chamada Regeneração Natural Assistida (RNA) é uma solução baseada na natureza que combina a capacidade de regeneração natural das florestas com a intervenção humana planejada, como o plantio de espécies nativas de interesse e medidas de proteção contra o fogo ou degradação da vegetação em regeneração.
O grande potencial de regeneração das florestas tropicais
Uma das partes importantes da implementação da RNA é identificar as áreas na qual a regeneração natural tem potencial de ocorrer. Um recente estudo publicado na revista Nature aponta que esse potencial é grande na zona dos trópicos. A análise é baseada no uso de sensoriamento remoto e utiliza de variáveis geofísicas, socioeconômicas e biofísicas. O Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), distância de áreas urbanas, densidade da floresta local, distância da cobertura vegetal mais próxima e outras, são exemplos das variáveis usadas.
Saber quais áreas de florestas tropicais podem se regenerar é particularmente importante dado a enorme biodiversidade contida nelas, suas rápidas taxas de crescimento comparadas a outros tipos de florestas e, especialmente, porque elas já foram extensamente degradadas ou desmatadas.
O resultado do estudo: 215 milhões de hectares de floresta tropical têm potencial de regeneração natural. Em termos práticos, isso significa que o equivalente à área dos estados do Amazonas e Minas Gerais somadas podem ser regenerado e voltar a ser florestas tropicais. Desses milhões de hectares, 52% se concentram em 5 países: Brasil, Indonésia, China, México e Colômbia. Dentre eles, o Brasil possui a maior área com potencial de regeneração nos trópicos: 20,3% dessa área fica em solos brasileiros.
Esses 215 milhões de hectares, se regenerados, podem trazer importantes avanços na mitigação das mudanças climáticas. Estima-se que a regeneração dessas florestas, em um curso de 30 anos, é capaz de sequestrar 23,4 gigatons de carbono (Gt de C) somente em biomassa acima do solo. Esse valor equivale a mais do que a quantidade de carbono sequestrada globalmente por florestas tropicais e subtropicais primárias e secundárias em um período de três anos. Na realidade, esse potencial de sequestro de carbono é ainda maior quando contabilizado o que é sequestrado pela biomassa subterrânea. Ela é de difícil projeção, mas estima-se um aumento de 22 a 28% do número anterior. Ou seja, a regeneração dessas florestas poderia sequestrar até 30 gigatons de carbono em 30 anos.
Imagem de drone de restauração ativa na Caatinga nos estados da Paraíba e Pernambuco. |
Incentivando a adoção da RNA no Brasil
Ampliar as iniciativas de restauração é essencial para aproveitar o potencial de regeneração no Brasil e nos trópicos. Com esse objetivo, o WRI Brasil realiza e integra projetos para impulsionar a agenda da restauração e RNA no Brasil.
Para incentivar a restauração no bioma amazônico, o WRI Brasil executa o projeto “Regeneração Natural Assistida em larga escala na Amazônia brasileira”. O projeto atua identificando áreas prioritárias, desenha e testa soluções, e expande a escala das iniciativas bem-sucedidas. Ele visa ao incentivo do uso da RNA por comunidades da região e combina restauração com necessidades locais ao gerar renda e melhoria de vida para as populações. Saiba mais na página do projeto.
O WRI Brasil também desenvolveu, em parceria com a União Internacional para Conservação da Natureza (UICN), a metodologia ROAM. Ela identifica oportunidades, analisa dados e promove a restauração de paisagens. Seu método é participativo e parte dos interesses e desafios dos principais atores das regiões analisadas. O WRI Brasil já apoiou a aplicação da ROAM em 5 estados do Brasil. Entenda mais na página do projeto.
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