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segunda-feira, 7 de janeiro de 2019

Governo anuncia que começará a fiscalizar as ONGs



COMENTÁRIO DE AXEL GRAEL:


FISCALIZAÇÃO DAS ONGs

A Medida Provisória (MP) 870/2019, publicada pelo governo de Jair Bolsonaro (PSL) no dia 1 de janeiro de 2019, incluiu um dispositivo que prevê “supervisionar, coordenar, monitorar e acompanhar as atividades e as ações dos organismos internacionais e das organizações não governamentais no território nacional”. Tais atribuições ficarão a cargo da Secretaria de Governo da Presidência, comandada pelo general Carlos Alberto dos Santos Cruz (Isabela Alves, Observatório do Terceiro Setor).

A tentativa de fiscalizar as ONGs não é uma novidade. É uma atitude governamental cíclica, que surge normalmente sob a influência de algum escândalo na mídia, com a denúncia de casos de irregularidade ou má-fé de certas organizações. Mas, no contexto dos retrocessos democráticos que estamos acompanhando, com o desmonte da política indigenista, desmantelamento institucional do setor ambiental, o rebaixamento de setores sociais, do esporte e da cultura, que perderam o status ministerial, o assunto ganha contornos mais sérios do que as tentativas anteriores exercer controle sobre o terceiro setor.

A Medida Provisória prevê “supervisionar, coordenar, monitorar e acompanhar as atividades e as ações dos organismos internacionais e das organizações não governamentais no território nacional”. 

Apesar do nítido cuidado da fala do ministro para evitar transparecer a real intenção, é óbvio que o objetivo agora é acima de tudo político, pois a retórica de ataques às ONGs e ao ativismo cidadão já vem no discurso do presidente desde a campanha eleitoral.

O que as novas autoridades ainda não perceberam é a dimensão e a importância do setor que estão falando. Existem  338 mil ONGs no país, segundo o IBGE e o terceiro setor no Brasil emprega cerca de 2 milhões de pessoas.

Mas, na visão do presidente Bolsonaro, ONGs são apenas focos de "resistência esquerdista", que causam entraves aos seus projetos. Portanto, há que lhes impor controle ou coagi-las a um enquadramento ao ideário do governo.

ONGs conveniadas já são fiscalizadas

Cada ONG registrada no país é regida pelo seu próprio estatuto, por uma extensa legislação específica, na qual se destaca o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil e outras normas legais também aplicáveis.

Assim como em outros setores da sociedade, existem organizações bem geridas e outras não. Algumas produzem bons resultados para o país e para a sociedade, outras nem tanto. Umas são sérias e outras não. Quando eficientes duram décadas, mas a maioria não consegue sobreviver por muito tempo.

A boa gestão de ONGs não é uma prática trivial. Elas precisam se legitimar para exercer as ações e serviços que motivam e justificam a sua existência. Precisam angariar associados ou participantes e mantê-los ativos na instituição. Precisam atrair doadores, patrocinadores, voluntários e colaboradores para se viabilizarem. Para tudo isso, precisam ter credibilidade e, portanto, boas propostas, bons resultados, transparência e boa governança. Com estas qualidades, são instituições saudáveis e facilmente auditáveis, seja por suas instâncias internas, como externas à organização.

Fiscalizar as organizações que recebem recursos públicos, que são beneficiadas por renúncia fiscal ou outra forma de apoio público direto, já é uma obrigação legal da gestão pública e esta fiscalização é exercida através de múltiplas instituições. As ONGs conveniadas são auditadas, por exemplo, pelos próprios órgãos responsáveis pelo repasse dos recursos, pela Controladoria Geral da União (CGU), pelo Ministério Público, pelos Tribunais de Contas etc.

É bom lembrar que poucas conseguem receber recursos governamentais, devido ao rigor dos processos seletivos dos editais e às numerosas exigências para que se tornem elegíveis para estas parcerias. A incidência de controles e a burocracia já é enorme, mas mesmo assim, não impedem as recorrentes denúncias de mal uso de recursos públicos ou de desvios de finalidade.

Segundo estatísticas do IBGE, o Brasil conta com uma proporção de 184,4 ONGs para cada 100 mil habitantes. 

Segundo o anúncio governamental, a ação fiscalizatória não se limitará apenas sobre aquelas organizações que recebem recursos públicos. Caso se confirme a intenção, corremos o risco de estar diante da tentativa de controle político das organizações, seguindo na perigosa direção da censura, da doutrinação e do cerceamento do direito constitucional do livre associativismo no país. 

Controle ou burocracia?

Ocorre que, invariavelmente, cada iniciativa do governo de exercer mais controle resulta no aumento de burocracia, sem a garantia do retorno de eficiência, transparência e de "moralidade" na relação entre o estado e a sociedade civil. A burocracia já impõe um pesado ônus para as ONGs, que são obrigadas a conviver com um exigências que vão de listas infindáveis de certidões, a regras que mudam toda hora e exigências incompatíveis com organizações que vivem de seus apoiadores e quase sempre lutam arduamente para sobreviver.

Criou-se no Brasil uma séria distorção na administração pública: há uma hipertrofia dos órgãos de controle, cujas carreiras profissionais estão dentre as mais prestigiadas e bem remuneradas do serviço público, e um atrofia dos órgãos das atividades-fim, ou seja, dos responsáveis pela efetiva execução das políticas públicas e da prestação de serviços à população. Quem atua nas ONGs já sabe o quanto as formalidades de controle e fiscalização já pesam no dia-a-dia e nos custos operacionais de uma organização. 

E agora, somando-se a tudo isso, haverá a ação do general, que para fiscalizar as ONGs como promete, em breve contará com um numeroso acervo burocrático sob a sua pasta, somando-se aos muitos órgãos controladores já existentes. E seguiremos em frente na lógica da burocracia.

Cidadania

O princípio do livre associativismo é uma das bases do exercício da cidadania e da vida democrática no país. É através das organizações da sociedade civil que as pessoas se fazem representar, defendem seus interesses comunitários e atuam democraticamente em defesa de temas específicos como meio ambiente, direitos humanos, exercício de atividades profissionais e tantos outros temas de interesse coletivo na sociedade.

Por isso, em 2011, diante de um destes episódios em que a importância das ONGs foi questionada, postamos aqui no Blog o texto O Brasil seria melhor sem as ONGs?, baseada no contexto daquela época, mas fazendo uma reflexão sobre a importância das organização da sociedade civil. Também recomendo a leitura de postagens sugeridas aqui ao final.

Que o Brasil não se desvie da trilha da democracia e de uma sociedade mais solidária, atuante e altruísta. 

Que os governantes ora no comando da instância federal sejam capazes de separar o joio do trigo, que garantam a qualidade dos serviços proporcionados à população por organizações da sociedade civil, punam os malfeitos, mas que reconheçam a importância e a legitimidade do trabalho cidadão de muitas centenas de milhares de pessoas que dedicam o seu tempo, recursos pessoais, seu trabalho voluntário ou mesmo profissional, em benefício do interesse público.

Axel Grael







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Governo vai fiscalizar ONGs para 'otimizar' o repasse de recursos públicos, diz ministro


Santos Cruz disse que objetivo do governo é verificar a efetividade dos trabalhos desenvolvidos por ONGs — Foto: Luiz Felipe Barbiéri/G1


Carlos Alberto dos Santos Cruz, da Secretaria de Governo, disse que pretende avaliar a efetividade dos serviços prestados pelas ONGs. Atribuição foi conferida à secretaria por meio de medida provisória.

Por Luiz Felipe Barbiéri e Roniara Castilhos, G1 e TV Globo — Brasília
06/01/2019 10h53 Atualizado há 22 horas

O ministro da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, disse em entrevista ao G1 e à TV Globo que a pasta vai fiscalizar Organizações Não-Governamentais (ONGs) para "otimizar" o repasse de recursos públicos às entidades.

De acordo com o ministro, a ideia é verificar se os trabalhos desenvolvidos pelas ONGs estão cumprindo o papel de complementar ações governamentais. Serão fiscalizadas mesmo aquelas que não recebem dinheiro público.

A primeira medida provisória assinada pelo presidente Jair Bolsonaro assim que assumiu a Presidência atribuiu à Secretaria de Governo a responsabilidade de supervisionar, coordenar, monitorar e acompanhar as atividades de ONGs, assim como ações de organismos internacionais no Brasil. Algumas dessas entidades receberam a medida como uma tentativa de intimidação.

Para Santos Cruz, o objetivo do governo não é interferir nas organizações, mas tornar a relação com o governo mais transparente e garantir o serviço para a população.

“O objetivo dessa coordenação é otimizar a utilização de dinheiro público e levar mais benefícios na ponta da linha. Então, não é interferir na vida das organizações, nem restringir nada. Mas como é dinheiro público, tem de ter transparências, tem de ter resultados”, afirmou o ministro.

Santos Cruz disse que, inicialmente, a Secretaria de Governo vai fazer um levantamento do número de ONGs em atividade no país e o campo de atuação de cada uma. Num segundo momento, de acordo com o ministro, será feita uma avaliação sobre a efetividade das ações prestadas pelas ONGs.

“Os processos de verificação já são estabelecidos pela CGU [Controladoria-Geral da União], pelo TCU [Tribunal de Contas da União] etc. E aí você tem que acompanhar para ver, principalmente, o resultado e a transparência disso tudo, porque no final do filme é dinheiro público. Se está compensador ou não, se dá para melhorar”, explicou o ministro.

Ele não disse o que pode acontecer com as entidades que não alcançarem os resultados esperados.

Histórico

Durante toda a campanha eleitoral do ano passado, Bolsonaro fez reiteradas críticas à atuação de ONGs. Por exemplo, disse que as instituições que atuam na defesa dos direitos humanos prestam "desserviço" ao Brasil.

Em 2014, a então presidente Dilma Rousseff sancionou o marco regulatório das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), com o objetivo de tornar mais transparente a relação entre governos e as entidades.

A partir desta norma, o governo ficou obrigado a abrir chamamento público para firmar parcerias com as OSCs, categoria da qual fazem parte as ONGs.

A lei instituiu o chamado Procedimento de Manifestação de Interesse Social. O instrumento permite às organizações da sociedade, movimentos sociais e cidadãos apresentarem ao poder público propostas de parcerias com organizações civis.


Fonte: G1




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