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quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

USP disponibiliza o “Atlas dos Viajantes no Brasil”



João Cardoso e Ian Rebelo Chaves, responsáveis pelo projeto, que tem como principal objetivo divulgar o acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP – Foto: Cecília Bastos / USP Imagens


Plataforma digital interativa dá acesso a relatos e imagens produzidos no País desde o século 16

Por Claudia Costa

Uma vasta enciclopédia sobre o Brasil, com informações relacionadas à natureza, sociedade, economia, cultura e cotidiano, é o que apresenta o novo Atlas dos Viajantes no Brasil. É uma plataforma digital e interativa que traz relatos e imagens dos viajantes, brasileiros e estrangeiros, que percorreram o País entre o século 16 e início do século 20. Inicialmente, os usuários encontram as rotas de sete viajantes de diversos perfis. Mas, aos poucos, o Atlas ganhará novos conteúdos, ampliando o acesso a uma das mais importantes coleções da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP.

É possível, por exemplo, acompanhar a rota percorrida por um viajante, comparar informações sobre um local determinado produzidas por dois ou mais viajantes, filtrar informações por assuntos e temas do seu interesse e até ver o mapa histórico sobreposto aos atuais, entre outras possibilidades. Logo que abre o portal, o usuário vê fotos dos viajantes, dando acesso ao material de cada um deles, ou, se preferir, na coluna da esquerda há sugestões de pesquisa por assuntos ou palavras-chave. Além de toda a cartografia especialmente criada para o Atlas, há um link para as obras originais da Coleção de Viajantes da BBM.

Segundo João Cardoso, especialista em pesquisa que atua em Mediação Cultural na BBM, o projeto nasceu em 2017 com o objetivo de divulgar o acervo da biblioteca, que, diferente das demais, é específica para consulta de pesquisadores. “Delineamos os mapas e uma base cartográfica digital, e foi a partir daí que chegamos aos viajantes, que produziram relatos relacionados ao deslocamento no espaço e no tempo, um conjunto de trabalhos que melhor se encaixava na ideia do projeto”, explica Cardoso, informando ainda que, no início de 2018, foi contratado o estagiário Ian Rebelo Chaves, que está cursando o último ano de Geografia na USP, e produziu propriamente os mapas.

Dentro desse grande acervo, que inclui mais de 1.200 obras de uma centena de viajantes, foram selecionados sete nomes. Os critérios, como informa Cardoso, foram a diversidade, como nacionalidade, período da viagem, ponto de vista e ocupação. Há missionários, naturalistas, políticos e comerciantes. “Tentamos criar um painel bem variado do acervo de viajantes para começar e, à medida que a plataforma avançar, serão incluídas novas informações e funcionalidades”, completa.


Tela de abertura do Atlas dos Viajantes no Brasil: uma vasta enciclopédia sobre o Brasil – Foto: Divulgação BBM


Tela com informações sobre os viajantes. No início foram selecionados sete viajantes, mas aos poucos o Atlas vai ganhar novas informações e funcionalidades – Foto: Reprodução / Atlas BBM


Sete mapas, sete viagens

Em ordem cronológica, o mais antigo dos viajantes selecionados é o cientista francês Charles de La Condamine, o primeiro a descer o curso do Rio Amazonas, publicando na Europa um conjunto de descrições da geografia, fauna e flora da bacia amazônica, contribuindo para despertar o interesse da comunidade científica sobre a região. Cardoso conta que La Condamine veio em uma missão na América Espanhola, a de medir a circunferência da terra na linha do Equador. “Depois de 10 anos, em 1744, quando volta à Europa, decide ir pelo rio Amazonas. Ele desce os Andes e percorre o Rio Amazonas desde o começo até a foz no Pará, e de lá ele vai para Caiena, na Guiana Francesa, e depois para a França”, informa. Se La Condamine tinha um interesse científico, o segundo viajante chegou aqui com uma visão de administrador: também do século 18, o político português Francisco Xavier Ribeiro de Sampaio veio ao Brasil, em 1774, para conhecer as riquezas e potencialidades do País, concentrando-se na região amazônica.

Os outros cinco relatos são do século 19, que abriga a maior parte da coleção de viajantes por uma questão histórica. “Antes da Independência do Brasil, Portugal limitava a entrada de estrangeiros, fato que muda só a partir de 1888, com a vinda de Dom João VI”, contextualiza Cardoso. O primeiro deles é John Mawe, comerciante especializado em pedras, que chega ao Brasil em 1807 e é um dos primeiros estrangeiros a conhecer a região das minas. Entre 1817 e 1820, a dupla de alemães Johann Baptist von Spix e Carl Friedrich Philip von Martius, zoólogo e botânico respectivamente, percorreu o maior roteiro apresentado no Atlas dos Viajantes no Brasil. “Foram cerca de 5 mil quilômetros, registrando espécimes vegetais e animais, mas também escrevem sobre os costumes das tribos indígenas, além de aspectos políticos e econômicos. Seus estudos renderam três volumes, que depois resultaram em outras dezenas de publicações”, destaca Cardoso.


Imagens da época presentes na Coleção de Viajantes da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin (BBM) da USP – Foto: Cecília Bastos – USP Imagens

Imagens da época presentes na Coleção de Viajantes da BBM – Foto: Cecília Bastos – USP Imagens


O missionário metodista norte-americano Daniel Kidder fez uma viagem de propaganda evangélica pelo Nordeste e pela Amazônia, distribuindo bíblias entre as populações das cidades que percorreu. “Seu relato traz o aspecto religioso, incluindo, como todos os viajantes, sua visão sobre os costumes e comportamentos das pessoas”, conta Cardoso. Já a região Sul do Brasil é retratada por Robert Avé-Lallemant, um médico e explorador alemão que vem em uma missão científica. Segundo Cardoso, ele abandona a missão e, patrocinado por D. Pedro II, faz viagens de exploração, detendo-se nas colônias alemãs que começavam a se instalar no Sul do Brasil.

Por fim, o Atlas traz um brasileiro, “contemplando também os viajantes brasileiros que viajaram pelo próprio país”, nas palavras de Cardoso. Joaquim de Almeida Leite de Moraes era um político que saiu de São Paulo até Goiás para assumir a presidência da cidade, em 1880. “Ele fica por um ano no cargo, e na volta decide descer o Rio Araguaia até o Pará, costeando o litoral até São Paulo”, informa. Cardoso ainda relata uma curiosidade: Leite de Moraes é o único que faz um trecho da viagem de trem. “A maioria dos viajantes fazia os percursos em mulas, cavalos ou a pé, ou ainda em barcos, quando iam pelos rios.”

Todas essas viagens estão retratadas em mapas que, segundo Ian Rebelo Chaves, responsável pela cartografia digital, tinham como maior desafio a integração das informações. Segundo ele, era um grande quebra-cabeça, porque são relatos muito diferentes. Havia também um trabalho difícil em relação aos topônimos, ou seja, as localidades do século 18 já não têm o mesmo nome atualmente. Além disso, era preciso achar soluções gráficas, lembra Chaves, ressaltando que “o intuito dos mapas não é servir de roteiro histórico, mas de narrativa das viagens”.

O Atlas dos Viajantes no Brasil está disponível neste link.

Fonte: Jornal da USP








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