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sábado, 17 de agosto de 2019

RETROCESSOS: Fim do Fundo Amazônia pode acelerar desmatamento






Suspensão de repasses da Noruega preocupa especialistas; Ibama depende do mecanismo para fiscalização

RIO — A virtual extinção do Fundo Amazônia é um tiro dado no combate do desmatamento ilegal no bioma com estilhaços em todo o país. A Noruega , que responde por 93,8% dos R$ 3,4 bilhões doados, pode não só interromper os repasses, como anunciou, quanto pedir de volta o cerca de R$ 1,5 bilhão ainda não comprometido com projetos aprovados.

O fundo financia não só projetos de pesquisa, mas é essencial para a fiscalização e o combate em campo do desmatamento ilegal realizado por Ibama, Força Nacional e autoridades de segurança e de meio ambiente dos governos estaduais. Recebem recursos não apenas a Amazônia Legal , mas Paraná, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Bahia e Ceará, já que 20% do fundo podem ser empregados em outros estados e países em programas essenciais ao meio ambiente, como a implementação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), por exemplo. Um por cento do fundo foi destinado a projetos internacionais em países amazônicos.

O dinheiro do fundo ajuda a pagar, por exemplo, os sistemas oficiais de monitoramento do desmatamento do Inpe , atacados pelo governo e reconhecidos pela comunidade científica e internacional. E estava sendo empregado na criação de sistemas semelhantes ao Prodes para a Mata Atlântica , Caatinga , Pampa e Pantanal.

Dinheiro de volta

O desmatamento segue a ferro e fogo, mostra uma imagem da Nasa captada pelo satélite Aqua no dia 13 e divulgada ontem. O sul da Amazônia, uma frente recente de desmatamento, arde, frisa Philip Fearnside, pesquisador titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.

Mas trabalhos de monitoramento e controle ficarão sem dinheiro sem os repasses do Fundo Amazônia. Assim como projetos de restauração de matas, demarcações de unidades de conservação e de apoio a terras indígenas.

Embora o governo mencione sempre as ONGs como principais beneficiárias, não são elas que ficam com a maior parte do bolo. O informe de 2018, o mais recente, mostra que as ONGs têm 58 projetos, mas ficam com 38% dos recursos. Já a União, com nove, fica com 28%. Os estados têm 22 projetos e 31% dos recursos. Juntos, somam 59% dos recursos. Desde 2015 o Ibama depende do fundo para ir a campo. É esse dinheiro que compra equipamentos e outros insumos que ajudam a atenuar os problemas trazidos pela falta de dinheiro do governo. Neste ano, o fundo praticamente parou. Até junho, somente R$ 34 milhões foram desembolsados.

Desprovido de recursos de sua principal doadora, a Noruega (responsável por 93,8%), que anunciou a suspensão dos repasses devido ao descumprimento pelo Brasil de sua contrapartida no fundo, o mecanismo na prática deixará de existir. Mantido com dinheiro da Noruega e Alemanha (5,7% das doações), que também cogita suspender os repasses, o Fundo Amazônia vira cinzas. Resta a Petrobras, com 0,5% das doações. A contrapartida brasileira era reduzir o desmatamento ilegal, que cresceu.

É incerto o destino dos recursos já captados. Dos R$ 3,4 bilhões de doações recebidas desde 2008, quando o fundo foi criado, somente R$ 1,1 bilhão foi desembolsado. Outros cerca de R$ 800 milhões estão comprometidos com projetos já aprovados. O governo Bolsonaro extinguiu o comitê orientador — outro fator que levou à decisão da Noruega — e nada colocou até agora em seu lugar.

A coordenadora do Programa de Política e Direito Socioambiental doInstituto Socioambiental , Adriana Ramos, diz que, pelo contrato do fundo, a Noruega pode pedir de volta o dinheiro não comprometido em projetos, ou quase a totalidade do R$ 1,5 bilhão não comprometido. Segundo ela, diplomatas noruegueses sinalizaram que esses recursos poderiam ser alocados em projetos não governamentais no Brasil. Porém, mais uma vez, nada está definido.

Se a meta era exterminar por falta de recursos o combate do desmatamento, ela foi atingida. O tiro foi na preservação da Amazônia, mas os estilhaços serão sentidos em todo o país.


Fonte: O Globo








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