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segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Aversão de conservadores à ideia de conservar ambiente não faz sentido




Vaqueiro atravessa área de pasto degradado em Alta Floresta (MT).


Eis algo que me causa espécie (como dizia o povo do século 19 quando queria se referir a algo esquisito): a bizarra aversão de muitos dos que se consideram conservadores à ideia de conservação... ambiental.

Apresso-me a acrescentar que fui "contaminado" com esse estranhamento por um sujeito que muita gente gosta de malhar como arquiconservador: o biólogo americano Edward Osborne Wilson, 87. Erudito, dono de voz mansa e gentileza impecável, Wilson foi acusado de machista e racista apenas por defender que existe uma natureza humana de origem biológica, com certos componentes inatos. A esquerda americana, por muito tempo, adotou Wilson como seu espezinhado número 1.

Foi em um de seus livros mais líricos, chamado "O Futuro da Vida", que o biólogo levantou essa incômoda lebre: conservadores não deveriam ser a favor da conservação, no mínimo por razões etimológicas?

Ao menos no Congresso brasileiro, não é o que parece. Temos uma safra particularmente conservadora de parlamentares –com destaque para os representantes do agronegócio, das igrejas evangélicas e dos órgãos de segurança pública–, e é difícil não perceber a movimentação desses setores em favor de projetos que fragilizam as reservas ambientais da Amazônia e os direitos de etnias indígenas sobre suas terras tradicionais, talvez os dois maiores pilares do combate ao desmatamento no país.

Pergunto: isso faz algum sentido do ponto de vista ideológico? Façamos um exercício de excesso de boa vontade, esqueçamos por um minuto o fato de que a política no Brasil tem pouco de ideologia consistente e quase tudo da máxima "farinha pouca, meu pirão primeiro" e tentemos pensar no que o conservadorismo significa, ao menos historicamente.

Como movimento político, a postura conservadora nasceu da ideia de que as instituições e as ideias da nossa espécie se estabeleceram por meio de um processo histórico complexo e lento, no qual as coisas que funcionam e são consonantes com a natureza humana foram sendo mantidas. Um conservador, portanto, é o sujeito que teme propostas radicais de virar a sociedade e a própria natureza do ser humano de ponta-cabeça porque a chance de que esse tipo de maluquice (da perspectiva dele) dê certo é baixíssima.

Ora, não faria sentido que o nosso conservador hipotético adotasse mais ou menos a mesma atitude em relação a alterações no ambiente causadas pelo Homo sapiens? Afinal de contas, estamos falando de uma trama de interações ainda mais antiga e complexa do que a delicada malha das instituições ancestrais humanas.

O conservador responsável deveria pensar 500 mil vezes antes de se empolgar com a derrubada da maior floresta tropical do planeta, cuja existência está diretamente atrelada à regulação climática de meio mundo - inclusive à da chuva que pode acabar deixando de cair na plantação de soja dele, ou dos netos dele (conservadores deveriam se preocupar com o futuro da família, ou não?).

Não me parece diferente o caso das culturas indígenas. Considerada a veneração conservadora por instituições herdadas do passado, é mesmo sábio achar que dá para substituir de uma hora para outra tradições que talvez tenham milhares de anos por um estilo de vida que caiu de paraquedas no meio delas? Conservadores têm orgulho de não se render à ditadura do curto prazo. Está na hora de essa atitude deixar de ser seletiva.

Fonte: Artigo publicado na Coluna Reinaldo José Lopes, Folha de São Paulo

Reinaldo José Lopes é jornalista de ciência com graduação, mestrado e doutorado pela USP. É autor do blog "Darwin e Deus" e do livro "Os 11 Maiores Mistérios do Universo". Escreve aos domingos, a cada 2 semanas.








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