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segunda-feira, 19 de setembro de 2016

CAPACIDADE DE SUPORTE: lidando com os efeitos do sucesso das unidades de conservação



COMENTÁRIO DE AXEL GRAEL:

Na década de 1990, quando fui presidente (1991-1994) da Fundação Instituto Estadual de Florestas (órgão do governo estadual já extinto e incorporado ao INEA e que era o órgão gestor de unidades de conservação no RJ), tive uma oportunidade que muito influenciou a minha atuação nas políticas públicas de conservação.

Fui convidado oficialmente pelo governo dos EUA para cumprir um programa na condição de "International Visitor", conhecendo várias unidades de conservação daquele país e aprendendo com as políticas públicas e técnicas de planejamento e gestão. Em Washington (DC), visitei órgãos gestores de parques como o National Park Service e de florestas nacionais, o National Forest Service, além de órgãos congêneres estaduais ou municipais. Também estive em alguns dos parques mais famosos do mundo, como o Yellowstone, Montanhas Rochosas, Everglades e também na interessante Floresta Nacional de El Yunque, em Porto Rico, planejada para atender aos interesses e demandas de duas culturas bem distintas que convivem na ilha caribenha: os latinos porto-riquenhos (tendem a ser mais gregários) e os lá chamados "anglo-saxões" ou "gringos" (apreciam mais a privacidade do que permanecer em grandes grupos). O parque oferecia atrativos para os dois gostos.

Os parques americanos foram idealizados para receber visitantes e quase todos foram planejados para recebe-los bem ao estilo norte-americano: de automóvel. Possuem uma infraestrutura fantástica, mas que às vezes me pareceram excessivas. Existem estradas, vastos estacionamentos, além da logística hoteleira, banheiros, restaurantes, áreas de piquenique, churrasqueiras, infraestrutura náutica, supermercados e outros comércios e tantas outras comodidades.

As trilhas são especialmente projetadas, construídas e sinalizadas para serem percorridas a pé, de bicicleta, de cavalo. Para cada modalidade de uso, existem pavimentos específicos, tipos de proteção e outros cuidados para garantir a segurança dos visitantes. Tudo com muita regra e muita fiscalização.

O grande assunto em pauta na época da minha visita, recorrente em quase todos as instituições e nos parques visitados, era o debate sobre a capacidade de carga ou capacidade de suporte ("carrying capacity") e como controlar ou definir limites para o número de visitantes. A gestão de parques custa caro aos contribuintes americanos e como lhes limitar o acesso quando querem visitar estes locais que são vistos como verdadeiros orgulhos nacionais? Por outro lado, é responsabilidade dos gestores de áreas protegidas garantir a integridade e a proteção do patrimônio natural destas áreas.

Me chamava a atenção nas reuniões técnicas a abordagem que faziam da aplicação do termo capacidade de suporte. Alguns poucos técnicos entravam no mérito do impacto da visitação sobre a biodiversidade (stress dos búbalos, alces, etc) ou outros recursos naturais. Mas, a grande discussão era mesmo objetivamente sobre a qualidade da experiência dos visitantes. Nada mais frustrante para o visitante/contribuinte americano do que procurar uma experiência próxima à natureza ao visitar um parque e ser surpreendido por um engarrafamento nas estradas internas.

Peguei dois engarrafamentos: um no Yellowstone e outro no Parque das Montanhas Rochosas. Um deles teve um motivo bem pitoresco e mais justificável: foi devido a uma manada de búfalos que decidiu deitar preguiçosamente na pista. Os carros pararam à distância. Eram proibidos de buzinar, piscar farol, sair do carro, gritar. A única coisa a se fazer era chamar o guarda florestal para que eles pedissem licença aos donos do pedaço e desobstruíssem a via. A "negociação com os animais" nos deixou mais de uma hora parados.

Era necessário estabelecer limites. Portanto, os gestores de áreas protegidas tendiam a uns critérios bem pragmáticos para definir os limites de visitantes, critérios estes mais fáceis de serem argumentados com os visitantes barrados, ou com a indústria do turismo que sempre pressionava por mais visitantes: o limite era de "tantos" carros e "tantas" pessoas, pois este era o número que as estradas comportavam, de vagas suficientes em estacionamentos, de banheiros públicos, etc. Foi um tiro no pé. Logo, a pressão sobre os gestores era de criar mais estradas, mais vagas de estacionamento e mais banheiros.

Consequência: quando eu lá estive, a ficha estava caindo e as atenções tendiam a se voltar para aqueles especialistas, antes minoritários, que tinham argumentos mais complexos, mas que talvez pudessem ser mais convincentes para a opinião pública e para os políticos que aprovavam as regras e orçamentos. Portanto, o argumento melhor não seria mais o número de vagas para carros, mas o "stress do búfalo", que afinal, era um dos principais motivos para o parque existir.

Trilha do Costão, Parque Estadual da Serra da Tiririca

Lembrei-me disso agora ao ler a matéria abaixo sobre o excesso de visitantes no Parque Estadual da Serra da Tiririca, principalmente nas trilhas do Costão de Itacoatiara, um dos locais preferidos pelos usuários. Como a matéria informa, só no feriado do 7 de setembro, a trilha do Costão recebeu 2.241 visitantes. Inviável! Os próprios visitantes reclamaram da qualidade da experiência (vide matéria).

Ocorre que temos um bom problema: o parque está sendo vítima do seu próprio sucesso com o público, mas diferente dos parques americanos que visitei, a infraestrutura e o número de profissionais na equipe é insuficiente e os impactos ambientais da visitação são muito elevados.

Há dois caminhos a se tomar: investir em infraestrutura e pessoal para reduzir os impactos e/ou limitar o número de visitantes. Sem os investimentos em vista, os gestores do parque decidiram corretamente limitar o número de visitantes. O chefe do parque, o dedicado Jhonatan Ferrarez, anunciou que para o próximo verão haverá uma limitação para um número de visitantes a ser definido entre 600 e 1.000 pessoas.

Com a atual crise financeira vivida pelo estado do RJ, é difícil crer que o INEA terá recursos orçamentários para fazer os investimentos necessários. Como alternativa, a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro - ALERJ aprovou uma lei que permite a contratação de Organizações Sociais para gerir as unidades de conservação estaduais.

Contar com uma infraestrutura adequada pode permitir flexibilizar o número de visitantes para um número um pouco maior, mas com a esperada continuidade do crescimento da demanda, não afasta a necessidade de se estabelecer limites.

PARNIT

Estamos começando a ter o mesmo problema nas recém criadas unidades de conservação municipais, como o Parnit, criado pelo Decreto 11.744/2014, assinado pelo prefeito Rodrigo Neves.

Mas, no caso de Niterói, a Prefeitura estruturou um alternativa para viabilizar os investimentos - o Programa Região Oceânica Sustentável (PRO-Sustentável), cujos recursos captados junto à CAF já foi aprovado pelo Senado Federal e estará disponível em pouco tempo, dependendo apenas de pendências do governo federal com a CAF.

A Prefeitura contratou serviços especializados para elaborar o Plano de Manejo do parque, que estabelecerá os investimentos necessários e implantará trilhas, espaços para atividades esportivas (parapente, downhill, etc), espaços para o lazer e recreação, logística de fiscalização e formas de manejo do ecossistema.

Trilhas já estão sendo preparadas para receber visitantes e a órgão de fomento ao turismo de Niterói, a NELTUR, já está trabalhando para planejar o desenvolvimento do ecoturismo na cidade.

A cidade precisa dos seus parques e a população precisa ter acesso a eles para usufruir das suas maravilhas. Mas, há que se valorizar estes espaços e estrutura-los para receber bem os visitantes, com impactos ambientais prevenidos, controlados e mitigados.

Hoje, o prefeito Rodrigo Neves deu um importante passo para este objetivo. Assinou a Carta Verde de Niterói, comprometendo-se com ambientalistas da cidade a cooperar na sua próxima gestão, caso reeleito (estamos muito esperançosos que sim), com o Parque Estadual da Serra da Tiririca, para que junto com as iniciativas municipais, Niterói possa contar com uma invejável rede de áreas protegidas que já se aproxima de quase a metade de seu território, de forma a proteger o seu patrimônio natural, torna-la mais resiliente, melhorar a sua qualidade de vida, gerar empregos com o ecoturismo e dinamizar a sua economia.

Podemos afirmar com orgulho, que Niterói avança para tornar-se uma referência nacional de sustentabilidade urbana. Sigamos em frente!

Axel Grael
Vice-Prefeito
Niterói



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Costão de Itacoatiara terá limite diário de visitação a partir do verão

Frequentadores enfileirados no trecho inicial de subida na rocha - Felipe Queiroz/Divulgação
 
 
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Objetivo é minimizar impactos da utilização excessiva, como erosão, alargamento da trilha e novas aberturas na vegetação

NITERÓI - Um dos mais conhecidos cartões-postais niteroienses, o Costão de Itacoatiara, de onde se descortinam paisagens deslumbrantes, virou uma preocupação constante para os gestores do Parque Estadual da Serra da Tiririca (Peset). Um dos pontos turísticos mais procurados da cidade, o local recebeu no último feriado da Independência, dia 7, o número recorde de 2.241 visitantes. Para tentar minimizar os impactos da utilização excessiva — que resulta em erosão, alargamento da trilha e novas aberturas na vegetação — e garantir um passeio mais tranquilo ao frequentador, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) definiu que é necessário limitar a quantidade de visitantes diários na trilha que leva ao Costão e à Enseada do Bananal. O objetivo é implantar esse controle já no próximo verão, permitindo o acesso de 600 a mil pessoas por dia, explica o chefe do Peset, Jhonatan Ferrarez.

— O estudo de capacidade de carga apontou uma quantidade. Vamos discutir esse número com o Conselho Consultivo do parque e com a direção do Inea — explica Ferrarez. — Será definido um limite para o turno da manhã e outro para a tarde.

SUPERLOTAÇÃO INCOMODA

Além da observação diária das consequências da sobrelotação, foi utilizado um estudo de capacidade elaborado pela bióloga Fernanda Kreisher e coordenado pelo professor de Geografia da UFF Douglas Pimentel. A pesquisa ouviu 374 visitantes entre março e agosto do ano passado. A eles foram apresentadas imagens da rocha com diferentes quantidades de pessoas, para avaliar de que forma a frequência afeta a qualidade da visita. O resultado obtido é que o ideal seriam até 88 pessoas ao mesmo tempo no topo do Costão, segundo a ótica do visitante. Considerando a permanência média de cada um, o local suportaria 800 pessoas por dia.

Visitantes formam fila na subida do costão. Lugar recebeu 2.241 pessoas no dia 7 de setembro - Felipe Queiroz / Divulgação


— Quando tem muita gente, os próprios visitantes se incomodam. Curiosamente, quando está completamente vazio, parte dos visitantes atribuiu nota baixa, porque há sensação de insegurança — explica o coordenador da pesquisa, Douglas Pimentel.

Na última década, o número de visitantes em pontos da cidade que sempre foram populares, mas que não eram tão frequentados, cresceu substancialmente, e as redes sociais têm sido apontadas como as principais responsáveis por isso. Nesse sentido, a beleza cênica do Costão tem se destacado, tanto pela paisagem que se tem lá do alto como pela imagem que proporciona a quem está na praia. Com tudo isso, Itacoatiara tornou-se um exemplo da potencialização turística pela internet. No site TripAdvisor, a praia aparece como a mais bem avaliada entre as 86 atrações niteroienses listadas, sendo que a trilha do Costão fica em quarto lugar. Esse fenômeno de popularidade também é visível no Instagram, onde a hashtag #itacoatiaradise foi atribuída a nada menos que 46.557 fotos publicadas.

— Além do crescimento exponencial na visitação, houve uma mudança no perfil do frequentador. Os habituais trilheiros têm cedido espaço a um outro tipo de público. São pessoas que vêm de longe para conhecer Itacoatiara e decidem subir a pedra — observa Ferrarez.

MAIS DE 10 MIL VISITANTES EM JULHO

Para se ter uma ideia, durante a Olimpíada, turistas de 20 estados e 13 países aproveitaram a beleza do lugar, além de gente de todo o Rio. Já em julho, no período de férias escolares, foram mais de dez mil pessoas, sendo cerca de 500 estrangeiros.

Pedra do Costão bastante movimentada - Divulgação / Felipe Queiroz


Há 14 anos, no dia 22 de setembro de 2002, O GLOBO-Niterói noticiava a preocupação de ecologistas e do Instituto Estadual de Florestas (órgão anterior ao Inea) com a utilização excessiva da trilha do Costão — à época, até 300 pessoas num fim de semana. Na ocasião, o ambientalista Cássio Garcez, do grupo de caminhadas ecológicas Ecoando, já sugeria que o ideal para o local era receber metade dos visitantes. Não imaginava que atualmente essa frequência seria diária.

— É chocante uma unidade de conservação preservada receber um número de visitantes tão grande. Sempre tivemos essa opinião, mas é preciso conciliar com a preocupação de não perder o visitante — diz Garcez. — No entanto, como o aumento ocorre em progressão geométrica, alguma coisa precisa ser feita.

Acostumada a pegar a trilha durante o fim da tarde para ver o pôr do sol, a engenheira agrônoma Ingrid Trancoso vê a medida com pesar. Ela, entretanto, reconhece que a limitação é a saída para frear o uso descontrolado.

— Eu me assusto sempre que fico algum tempo sem ir. No último domingo, fiquei impressionada ao ver como a trilha está muito larga e malfeita. Encontrei muitas latinhas jogadas pelo caminho. Falta consciência às pessoas, então é importante trabalhar a educação, explicar a importância de manter aquilo preservado.


Topo da rocha em dia de grande visitação - Divulgação/Felipe Queiroz


A arquiteta Carina Bersot, que já subiu algumas vezes a trilha, esteve no Costão no dia 7 de setembro. Quando subiu, por volta das 10h, o movimento estava tranquilo. Quando desceu, conta que já havia uma fila com cerca de cem pessoas.

— No início da subida na pedra, que é a parte mais íngreme, as pessoas passaram a tomar um caminho novo, beirando a mata e se apoiando na vegetação. O caminho ali sempre foi pela rocha — lembra Carina. — Também vi gente escorregando. Acho que deveriam ter guardas ali para orientar.

O Peset recebeu, até agosto deste ano, cerca de 195 mil visitantes. Desde o início do ano foram registrados sete acidentes, sendo seis leves e um moderado. Até o final do ano a unidade deve receber mais de 300 mil visitantes, estima o Inea.

Fonte: O Globo


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