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segunda-feira, 6 de junho de 2016

"ARREGACE AS MANGAS E MÃOS A OBRA" - Breve considerações sobre ambientalistas de Niterói e a luta ambientalista



COMENTÁRIO DE AXEL GRAEL:


ONGs x INGs - AMBIENTALISMOS DE OUTROS TEMPOS

O artigo de Raiana Collier para a revista de domingo de O Fluminense, publicada no Dia Mundial do Meio Ambiente (5 de junho de 2016), dá destaque ao esforço de militantes ambientalistas que agiriam "de forma individual" em defesa do meio ambiente:

"... a sociedade civil vem, ao longo dos anos, se mobilizando e colocando, literalmente, a mão na massa para tentar mudar esta realidade com iniciativas individuais no sentido de preservar e recuperar o meio ambiente".

Na verdade, nem todos os citados na matéria agem através de "iniciativas individuais". Alguns são respaldados por instituições orgânicas e estruturadas, como a decana do ambientalismo, Dora Negreiros, fundadora e dirigente do Instituto Baía de Guanabara. Outros citados no texto, mesmo sem ter a mesma organicidade formal, são capazes de mobilizar um bom número de participantes para as suas atividades.

PRIMÓRDIOS: É bem verdade que o movimento ambientalista mudou muito desde os tempos pioneiros quando comecei a militar na causa em Niterói, nos idos do final da década de 1970.

Quando comecei, apesar de raros, já haviam militantes aguerridos da defesa ambiental. O mais marcante deles era o saudoso professor Marcello de Ipanema, aguerrido lutador da causa ambiental, que liderou a fracassada mobilização contra a destruição da Duna de Camboinhas e da abertura do Canal ligando permanentemente a Lagoa de Itaipu ao mar, obra de autoria da finada empresa VEPLAN.

Naquela ocasião - tempos de regime militar e auge da ideologia desenvolvimentista - a correlação de forças com os destruidores da natureza era muito desigual. Por isso, os militantes valiam-se de "atitudes heroicas", obrigatoriamente performáticas, com o objetivo de chamar a atenção da população e da mídia para os primórdios da luta ambiental: jogavam a frente dos tratores, subiam nas árvores para que não fossem cortadas, impediam a entrada e a saída dos caminhões das fábricas de sardinha poluidoras da Enseada de Jurujuba... etc.

ONGs - Organizações Não-Governamentais x INGs - Indivíduos Não-Governametais.


Depois, em 1980, veio a criação do Movimento de Resistência Ecológica - MORE, instituição que chegou a reunir mais de 700 membros, que marcou época em Niterói e formou uma geração de ambientalistas que atuam até hoje. O MORE, que não existe mais, mantinha reuniões plenárias semanais, com grande número de participantes. Eram outros tempos, de movimento comunitário forte, de associações de moradores com grande capacidade de mobilização, que se reuniam na Federação de Associações de Moradores do Estado do Rio de Janeiro - FAMERJ, de grande força política.

A luta dos primeiros ambientalistas deixou um legado no Brasil e no mundo. O tema está definitivamente em pauta. No cenário planetário, fóruns diplomáticos debatem o futuro do clima, da biodiversidade, da poluição química etc. No cenário nacional, há extensa legislação ambiental e o tema ganhou as escolas e a mídia. No escala local, Niterói desponta hoje como uma referência de políticas públicas para a sustentabilidade.

Mas, a Baía de Guanabara, a falta de saneamento, o lixo, a seca e outros problemas estão aí para mostrar que a militância ambientalista ainda é tão necessária como outrora.

DECLÍNIO: Considero que o início do declínio do movimento ambientalista orgânico ocorreu, paradoxalmente, logo após a Rio-92. Passada a efervecência ambiental da Conferência da ONU, veio uma "ressaca antiambientalista". Surgiu a ideia que ambientalista bom era apenas aquele capaz de fazer projeto, debater tecnicamente, ter uma ação propositiva e firme respaldado jurídico. Era o império dos técnicos em meio ambiente em detrimento daqueles militantes não-técnicos, que foram pejorativamente alcunhados de "ecochatos".

O movimento ambientalista caiu nesta armadilha e se elitizou. Me lembro bem de uns militantes ambientalistas do Morro do Cavalão, em Niterói, que apesar de legitimamente mobilizados contra a implantação de uma linha de transmissão que desmataria uma parte do morro e que está até hoje lá no local. Aqueles militantes, legítimos na sua luta, acabaram se desmotivando, por se sentirem diminuidos "por não serem técnicos" e não encontrarem apoio.

As ONGs grass-roots (de base) acabaram perdendo espaços para as ONGs técnicas, chics, "profissionalizadas". Muitas mais se pareciam com escritórios de consultoria.

A situação piorou muito nas décadas seguintes, quando começaram a surgir os sistemas de incentivos fiscais para projetos culturais (Lei Rouannet), Lei de Incentivo ao Esporte e outras beneficiando a área de assistência social, ciência & tecnologia etc. Para a área ambiental, nada!

Hoje, a quase totalidade das empresas alicerçam as suas políticas de responsabilidade social nas leis de incentivos fiscais que, de tão vantajosas para estas empresas, tornam os investimentos diretos impossíveis de serem aprovados nas suas instâncias de governaça corporativa.

Consequência... as ONGs ambientalistas comunitárias e suas campanhas sofreram uma verdadeira inanição financeira e muitas acabaram se desmobilizando.

Existem outras formas de financiamento das atividades que não seja o patrocício corporativo? Claro que sim. Algumas poucas organizações, por exemplo, conseguem atingir um nível de arrecadação significativo a partir da anuidade de seus sócios. Mas, são casos raros (normalmente organizações grandes) e para alcançar este resultado, investiram muito em comunicação. Algumas experiências recentes tem se dado através de mecanismos de "crowd-funding".

ABNEGADOS: Por este motivo, considero que a ação dos atuais ambientalistas, mesmo quando perseveram individualmente ou em organizações formais, um ato de coragem e de resistência. Como vimos, as dificuldades são muitas e lhes devemos gratidão por carregarem o piano da causa ambiental.

Ao vermos este cenário e forma de atuação, parece que voltamos, de certo modo, aos idos dos anos pioneiros. Portanto, acredito que o movimento ambientalista precisa ser refundado para que as campanhas de caráter comunitário voltem a ter vida orgânica e legitimidade institucional, como já tiveram no passado.

Se é que é para este tipo de organização social estamos caminhando. Em tempos de redes sociais e outras formas de comunicação eletrônica, uma nova forma de militância poderá surgir, prescindindo das formas tradicionais de organização.

Mas, aí, é assunto para outro papo...

Axel Grael




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Arregace as mangas e mãos à obra


Luiz Alocchio vem colhendo o fruto de seu trabalho. Hoje já é possível ver as mudas em áreas como o mangue de Itaipu. Lucas Benevides



Com iniciativas individuais, eles apostam em ações que têm um só objetivo: preservar o meio ambiente

Raiana Collier

Neste domingo é comemorado o Dia Mundial do Meio Ambiente. Na prática não existem muitos motivos para festejar a data. Em novembro de 2015, a então ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, divulgou números apontando que as taxas de desmatamento na Amazônia aumentaram aproximadamente 16% em relação a 2014. No Rio de Janeiro, a conclusão do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, que vai receber as provas de vela dos Jogos Olímpicos 2016, ainda é uma realidade distante, embora a iniciativa já tenha custado R$ 10 bilhões em empréstimos ao Estado. Diante deste cenário nada promissor, a sociedade civil vem, ao longo dos anos, se mobilizando e colocando, literalmente, a mão na massa para tentar mudar esta realidade com iniciativas individuais no sentido de preservar e recuperar o meio ambiente.

O engenheiro Nelson Fiedler, de 55 anos, é uma dessas pessoas. E tem um projeto mais do que ambicioso: ele quer limpar a Baía de Guanabara. Detalhe: até antes da Olimpíadas, que acontecem daqui a três meses. Mas como isso seria possível? Ele explica: “Com um sistema para coleta de óleo e lixo contaminado do oceano”. Na bagagem Fiedler já traz grandes projetos, como as membranas de fibra projetadas e instaladas na reforma do Maracanã, na Arena das Dunas, em Natal, e no Estádio Beira-Rio, em Porto Alegre.

“Eu sou velejador, surfista e engenheiro. Depois de concluir este projeto na reforma do Maracanã, decidi voltar a investir em uma iniciativa que eu tinha há alguns anos, quando vi casos de derramamento de óleo no mar, como o que aconteceu no mar do Golfo do México. É um coletor que foi pensado inicialmente para isso, para tirar grandes materiais e volumes do mar”, conta.

Com a aproximação das Olimpíadas, Fiedler identificou a necessidade de um equipamento efetivamente capaz de retirar o lixo dos oceanos. Veio daí a ideia para um coletor que fica amarrado atrás de barcos de pesca, e pode recolher mais de dez toneladas de lixo flutuante. Ao todo foram 14 protótipos até chegar à versão mais recente, o “Piranha 45”, que, como resume Fiedler, “vai comer o lixo do mar”. Para conseguir transformar o projeto em realidade antes das Olimpíadas, ele corre contra o tempo em busca de grandes investidores.


Nelson Fiedler e seu coletor para retirar lixo dos oceanos. Objetivo é limpar a Baía de Guanabara até as Olimpíadas. Arquivo


“Ao longo dos anos, já investi muito dinheiro do meu próprio bolso, porque é um projeto em que eu realmente acredito. É difícil conseguir alguém que invista US$ 350 mil, que é o valor necessário para botar um coletor no mar, mas ainda dá tempo”, garante.

O engenheiro conta que a ideia é criar um mercado de retirada de lixo dos oceanos, uma vez que a incineração desse material pode ser usada para a geração de energia elétrica.

“Se conseguirmos provar para o mundo que lixo pode gerar dinheiro, acredito que vamos conseguir fazer acontecer. Já viu catador de lixo que briga por latinha? Então! A mesma coisa pode acontecer com lixo do mar”, acredita.

Há quatro anos o biólogo marinho Luiz Alócchio, 53 anos, percebeu que o mangue de Itaipu precisava de uma intervenção efetiva. Como mora bem perto da região, ele não teve dúvidas ao decidir que precisava fazer alguma coisa para mudar aquela situação. Desde então, vem plantando, ao longo da margem do Canal do Camboatá, dos rios João Mendes e da Vala, e na Lagoa de Piratininga, mais de 20 mil mudas que estão mudando o cenário e recuperando o ecossistema daquela área.

“Hoje já começamos a ver o verde. O manguezal é berço do mar, afeta de muitas formas a região, como, por exemplo, a atividade pesqueira. É preciso acreditar que cada um pode fazer a sua parte, e que não dependemos de grandes projetos. Com um pouquinho de boa vontade, podemos ajudar a melhorar a cidade”, defende Alócchio.

O biólogo lembra que, inicialmente, os próprios caranguejos da região eram um problema para as mudas que ele ia plantando.

“No começo eu plantava e os caranguejos comiam as mudinhas. Com o tempo, fui entendendo a metodologia e descobri que se eu colocasse uma garrafa pet para proteger as plantas, resolveria o problema”, afirma.




O biólogo Ricardo Garcia aposta em iniciativas de preservação do meio ambiente ao lado do filho Théo e também com um grupo de escoteiros. Lucas Benevides.



A boa notícia é que a iniciativa vem dando muito certo. O trabalho é tão minucioso, responsável e, de fato, realizado a longo prazo, que essas garrafas que foram colocadas por ele no início da ação estão sendo retiradas agora, aos poucos.

“É um trabalho que exige estudo, pesquisa, mas você vai, aos poucos, conseguindo sucesso. É igual na vida: nós erramos e vamos aprendendo como as coisas funcionam”, reflete.

Luiz pontua que o trabalho que vem realizando também passa pela educação ambiental. Tanto que as escolas agora levam os jovens e crianças para conhecer a região. Recentemente, em parceria com o Parque Estadual da Serra da Tiririca (Peset), foram colocadas placas informativas próximas ao mangue.

“A ideia é que a pessoa que não conhece o manguezal passe a conhecer um pouco mais da importância desse ecossistema. As crianças vêm e se surpreendem com o que encontram. Com a realidade fora dos livros. É importante mostrar que o homem pode ajudar a recuperar o meio ambiente. Nós não somos eternos, precisamos deixar esse aprendizado para eles”, enfatiza.

Educação ambiental para os jovens também é um dos focos do militar reformado e escoteiro Ricardo Garcia, 51. Depois que encerrou a carreira como militar, o biólogo por formação começou a trabalhar com projetos ambientais junto ao grupo escoteiro São Francisco de Assis.

“É um trabalho de ‘formiguinha’, que é devagar e exige esforço. É como você plantar uma semente, que, um dia, mais lá na frente, vai germinar. Trabalhar com o meio ambiente, de uma forma geral, é gradativo, você vai vendo pequenos resultados”, diz.

Desde que começou os trabalhos com o grupo, já se vão dez anos realizando ações que contribuem para a recuperação da biodiversidade, como plantios de mudas nativas e limpeza de trilhas e praias niteroienses.

“É engraçado porque acontece de chegarem crianças criadas em apartamento e os pais ficarem preocupados, achando que eles não vão conseguir subir as trilhas, não vão conseguir ajudar nos plantios. Mas eles conseguem. Tem alguns que entraram bem novinhos, com 6,7 anos, e agora já estão nos 17. Isso é muito legal”, comemora.

Pai de Théo, de 14 anos, e Nicole, de 12, que também são escoteiros, Garcia leva a consciência ambiental para dentro de casa. Lá, cerca de um saco de lixo com capacidade de 50 litros é preenchido por semana. Depois de lavado, esse material passível de reciclagem é separado, e, periodicamente, levado por Ricardo até a sede da Clin.

“Aqui em casa a gente começou a separar o lixo e depois de um tempo parou. Mas há alguns anos, implantamos definitivamente a coleta seletiva. Todo mundo ajuda e participa. Na Europa já vemos a consciência da importância da reciclagem, mas no Brasil ainda falta criarmos esse hábito”, afirma Garcia.

Cassio Garcez, do Ecoando.


Cássio Garcez, 52, também é adepto de hábitos mais simples de preservação do meio ambiente, como reciclar o lixo, reduzir o consumo de bens supérfluos, buscar consumir produtos produzidos de forma mais artesanal e mais próxima de onde mora, economizar água e energia. Mas ele leva a ideia de iniciativas pessoais ainda mais a sério. Em 2009 ele teve um câncer na bexiga. Segundo o médico, “doença de quem fuma”.

“Eu só coloquei um cigarro na boca uma vez na vida, quando era jovem, para nunca mais. Me mudei para a Região Oceânica há mais de 10 anos, onde muita gente tem o costume de, diariamente, queimar folhas, galhos, lixo verde de uma forma geral. Eu mesmo cheguei a fazer isso e fui alertado por um vizinho. Um tempo depois, percebi que a doença pode ter sido ocasionada pela fumaça que eu inalava”, lembra.

A partir daí, ele começou uma espécie de campanha pessoal para tentar conscientizar os moradores da região sobre os malefícios dessa prática. Nessa jornada quase solitária, ele tentou sensibilizar vizinhos, elaborou material informativo sobre o tema, fez denúncias e cobrou ações do poder público.

“Em 2013 o vice-prefeito me recebeu. Fiz um dossiê completo e apresentei ao Axel Grael, que assumiu o compromisso de abraçar a causa. A Prefeitura de Niterói passou a fazer estudos, campanhas de conscientização, cursos com agentes comunitários e também a veicular informações na página virtual da Secretaria de Meio Ambiente, muitas vezes usando dados e material que eu havia pesquisado ou elaborado”, conta.

O problema, no entanto, persiste. A prefeitura e o Parque Estadual da Serra da Tiririca fazem a fiscalização, mas fica difícil reprimir todos as casas que têm a prática. Do alto do Morro da Peça, onde o guia ecológico realiza trabalhos de reflorestamento, é possível ver os vários focos de fumaça que tomam conta da região durante os fins de tarde.

“O que falta é gente se engajando na causa. Essa prática tem quem ser erradicada. Depois de um tempo, cansa, ter que fazer esse trabalho sozinho”, desabafa Garcez, que também é responsável pelo Ecoando, um projeto que, há mais de 20 anos, promove caminhadas ecológicas, educação ambiental, viagens, consultoria em ecoturismo e treinamento corporativo em Niterói.


Dora Hees de Negreiros, do Instituto Baía de Guanabara.


Engenheira química, ambientalista e fundadora da extinta Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema), Dora Negreiros chama a atenção para a importância não apenas das iniciativas individuais, mas para um esforço coletivo da população.

“É claro que é importante a participação de todos, que cada um faça a sua parte. Mas é bom que as pessoas tenham ideia do coletivo. É fundamental ter em vista o bem geral”, frisa. “Essa consciência ambiental ainda não é comum a todas as classes sociais. Para as pessoas muito pobres, isso é muito complicado, porque, às vezes, falta o que comer, imagine pensar como vai ser descartado o lixo que ela produz. E entre os mais ricos também falta essa consciência, porque existe um esquecimento do coletivo”, acredita.

Dora identifica que a falta de atenção com o meio ambiente é geral, e não só um descaso dos governantes. Isso se traduz, por exemplo, no caso da Baía de Guanabara. “Nós temos atraso de um século jogando lixo na Baía. A gente não podia tirar 100 anos de esgoto de lá de uma vez só”, defende.

Para Dora, a chave é, de fato, a educação. “Dentro dessa educação geral está também a educação ambiental. Hoje os nossos filhos estão mais preocupados com a educação e com questões relativas ao meio ambiente do que nós estávamos quando tínhamos a idade deles. Isso é importante para termos um meio ambiente mais equilibrado”, finaliza.

Fonte: Revista O Fluminense







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