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sexta-feira, 30 de março de 2012

Por que Licencas Ambientais demoram tanto?



MOROSIDADE DO LICENCIAMENTO - OPINIÃO DE AXEL GRAEL

O artigo abaixo traz um importante alerta: o licenciamento ambiental no Brasil é caro e lento. No entanto, apesar de apresentar algumas críticas (justas!) aos órgãos públicos, omite outros motivos relacionados quase sempre aos próprios empreendedores, que também causam atrasos e custos elevados para a fase de licenciamento.
  
Fui presidente da FEEMA entre 1999-2000 e 2007-2008. A FEEMA era o órgão estadual do Rio de Janeiro responsável pelo licenciamento ambiental e que foi substituído pelo INEA. Como ex-dirigente de um órgão licenciador e como consultor ambiental, e sem entrar no mérito das dificuldades e deficiências administrativas (falta de pessoal, etc) da administração pública, trago ao debate os seguintes problemas:
  1. BAIXA QUALIDADE AMBIENTAL DOS PROJETOS: de um modo geral, os projetos submetidos pelos empreendedores para análise dos órgãos ambientais carecem muito de qualidade quanto aos aspectos ambientais e de cumprimento à legislação. Segundo nossa estimativa, mais de 80% dos projetos necessitam de ajustes ou precisam ser refeitos durante o processo de licenciamento. Obras públicas são as que normalmente mais se ressentem de projetos de qualidade. As obras do PAC, à época em que estive na FEEMA, bem exemplificavam o problema. Muitas chegavam para análise da FEEMA contando apenas com uma mera planta ou um descritivo simplório. Às vezes, nem o imóvel onde seria implantada a obra estava definido. E a culpa do atraso destas obras ainda hoje é atribuída aos órgãos ambientais!!! Já enfrentei também situações em que projetos governamentais de municípios- que já contavam com financiamento aprovado pela Caixa Econômica Federal - pretendiam implantar redes de coleta de esgoto sem a previsão de estações de tratamento. O esgoto iria direto para o rio!!! Ora, não existe licença para poluir! Diante da minha negativa em conceder a licença, um grupo de prefeitos foi ao governador da época "pedir a minha cabeça". Não conseguiram. Saí depois, por outros motivos.
  2. O CARRO NA FRENTE DOS BOIS: há casos em que a defasagem entre a elaboração dos projetos e a criação de expectativas em torno da sua realização acontece por açodamento que quase sempre surge por motivo político. Foi o caso do COMPERJ. Antes de dar início ao licenciamento junto à FEEMA, várias solenidades políticas já haviam anunciado "o início das obras". A "Pedra Fundamental" do empreendimento chegou a ser "inaugurada" antes que o órgão ambiental concluísse a análise do EIA/RIMA do projeto. A definição da localização do empreendimento faz parte da LP-Licença Prévia. Assim, o público em geral é levado a acreditar que a culpa do atraso é mesmo do órgão ambiental.
  3. LICENÇA AMBIENTAL x FINANCIAMENTO: O que deveria vir primeiro? O Projeto Básico Ambiental (conceitual) ou a Licença Prévia (LP)? Induzidos por mecanismo da Lei de Crimes Ambientais, que responsabiliza criminalmente agentes financeiros que apóiam projetos em desacordo com a legislação ambiental, bancos públicos e privados condicionam a liberação de créditos para empreendimentos à apresentação pelo menos da Licença Prévia (LP). Ora, para obter a LP é necessário contar com pelo menos um projeto básico para o empreendimento e, frequentemente, o proponente da obra depende do crédito para providenciá-lo. Como consequência, os empreendedores lançam-se ao esforço de licenciamento antes de contar com um projeto adequado. Obviamente, isso afeta a qualidade da análise no órgão ambiental.
  4. BAIXA CAPACIDADE DE EXECUÇÃO: é muito comum em projetos de infraestrutura de grande porte, principalmente aqueles de iniciativa governamental, que sejam submetidos aos órgãos ambientais mediante grande pressão política para que sejam analisados com prioridade e com excepcional celeridade. Já tive que paralisar setores inteiros da FEEMA para licenciar empreendimentos emergenciais e, após todo o esforço, alguns simplesmente não saíram do papel. Foi o caso da correria para licenciar Usinas Termelétricas na época do Apagão. Algumas destas "prioridades" até hoje não foram implantadas. Outro exemplo é o Arco Metropolitano do Rio de Janeiro, licenciado sob regime de grande prioridade há cerca de quatro anos e que ainda se arrasta lentamente. Apenas há poucas semanas atrás o DNIT anunciou que fará a licitação para o trecho federal da obra!!! O trecho de responsabilidade estadual encontrou algumas dificuldades ambientais, inclusive o problema que acabou apresentado ao público de forma pejorativa, como o caso da existência de um brejo que abrigava uma espécie ameaçada de "perereca". A obra destruiria aquele habitat. A falha do projeto, que foi incapaz de identificar e evitar aquela área ambientalmente sensível, acabou repercutindo como exagero do órgão ambiental. Ou, quem sabe a culpa não teria sido da pobre perereca que colocou-se inadvertidamente à frente dos tratores?
  5. GRUPOS DE PRESSÃO E "RAZÕES MISTERIOSAS": normalmente, a decisão em torno de licenças ambientais não se baseiam apenas em critérios técnicos. Quem já atuou em órgãos ambientais licenciadores sabe o jogo de interesses que há por trás de muitos empreendimentos. A presença de grupos de pressão (políticos, lideranças comunitárias, ambientalistas, setores empresariais, ministério público, a mídia, etc), atuando ou fazendo lobby - contra ou a favor de empreendimentos - é uma constante. Da mesma forma que, de acordo com os seus intereses, os lobbies pedem celeridade, as vezes pedem através dos seus canais que o órgão ambiental "sente em cima" de determinados processos de licenciamento. Acho o lobby, como uma manifestação de opinião e de interesse, uma ação legítima de setores organizados da sociedade e da cidadania, uma prática democrática e que os órgãos públicos precisam ter canais institucionais eficazes de interação com a sociedade para que possam ser sensíveis a estes clamores. O problema é quando estas práticas extrapolam limites da ética e da moralidade. Mas, o fato é que estas diferentes formas de pressão existem e a liberação de uma licença depende de muita negociação e da resolução destes conflitos. E isso leva tempo.
  6. OUTROS ENTRAVES: muitos empreendimentos atrasam por outros motivos: conflitos sociais, legais, desapropriações, etc. Com frequência, os empreendimentos geram grandes conflitos e enfrentam verdadeiras guerras judiciais até que consigam se efetivar. Nesta briga, o próprio órgão ambiental acaba por se tornar réu e seus dirigentes são questionados quanto à decisão do licencenciamento. No caso do Arco Metropolitano, na verdade, o grande motivo do atraso das obras é a desapropriação dos imóveis e a solução de problemas como a existência de sítios arqueológicos no traçado da via. Ora, o Arco Metropolitano existe como projeto governamental há décadas e só agora, na hora de implantá-lo, seus responsáveis lembraram que haviam sítios arqueológicos no caminho? E a culpa é do órgão ambiental?!
  7. EXCESSO DE EXPECTATIVA QUANTO À LICENCA AMBIENTAL: devido à força de vários instrumentos legais e normativos, o licenciamento ambiental acabou se tornando um "check list" de políticas públicas. Cabe ao órgão ambiental a verificação do cumprimento de exigências cuja a responsabilidade é atribuída a outros órgãos e a outras esferas da administração pública. É o caso da legislação de uso do solo (responsabilidade municipal), bens históricos e culturais, impacto viário, terras públicas, aspectos fundiários, etc. Tudo isso torna a análise mais complexa e força o órgão ambiental a depender da ação de outras autoridades públicas.
  8. RESPONSABILIDADE E RISCO NA TOMADA DA DECISÃO: o dirigente de um órgão público que tem a responsabilidade de assinar uma licença ambiental, além do peso de decidir sobre intervenções que podem transformar uma cidade, um bairro, ou uma localidade - para o bem ou para o mal, ainda precisa preocupar-se com as consequências legais de sua decisão, pois pode ser responsabilizado criminalmente pelo seu ato. E o estado não o defende. Portanto, a cautela na decisão pode contribuir com a morosidade. Alias, este é um dos motivos que induzem à persistência de procedimentos altamente burocratizados. A necessidade de defesa em caso de questionamento judicial induz a uma lógica de diluição de responsabilidade e de profusão documental.

Enfim, estes são apenas alguns motivos pelo qual a Licença Ambiental é uma decisão difícil, conflitiva, complexa e de alto risco para quem se responsabiliza por ela.

Somos muito críticos aos procedimentos e à lógica que regem o licenciamento ambiental atual e temos várias ideias sobre como mudar o quadro atual. Mas deixamos este tema para outra postagem.

Axel Grael



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LICENÇA DEMORADA E CARA


O Estado de S.Paulo

Não se conhecem valores precisos, mas certamente é alto o preço que, sem saber, o brasileiro paga pelo atraso nas obras de infraestrutura em razão da demora na concessão do licenciamento ambiental indispensável para sua execução. Em outubro do ano passado, o Ministério do Meio Ambiente publicou várias portarias que simplificam e aceleram o andamento dos processos de licenciamento dessas obras, mas os problemas acumulados pelos atrasos anteriores continuam a afetar muitos projetos, encarecendo-os.
Entre a decisão de iniciar uma obra no setor elétrico e a obtenção da licença prévia (a primeira de três exigidas até o início de operação do empreendimento) decorre em média um período de 958 dias - mais do triplo do prazo máximo de 285 dias estipulado para o órgão ambiental autorizar ou não o projeto -, de acordo com estudo do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) que o Estado (18/3) noticiou. A emissão da licença de operação, a última das três exigidas, demora em média 2.355 dias, ou seis anos e meio.

Em todo o mundo, a realização de grandes projetos empresariais, de infraestrutura ou de outra natureza está condicionada à observância de regras ambientais cada vez mais rigorosas. A realização da Rio + 20 em junho, com a participação de centenas de líderes mundiais, deverá estimular as ações nesse sentido, pois seu tema principal será o desenvolvimento sustentável, que busca não comprometer o patrimônio ambiental das futuras gerações.

No Brasil, no setor de energia, no entanto, surgiram muitos obstáculos à tarefa de compatibilizar o desenvolvimento com preservação ambiental. "Virou um processo muito complexo, com uma legislação cheia de furos e vazios", disse ao Estado o consultor Abel Holtz, que elaborou o estudo Agenda Ambiental junto com Adriano Pires.

Mais de 70% dos 428 projetos licitados ou autorizados entre 2008 e 2010 na área de energia não começaram a ser executados, de acordo com estimativa de Holtz, e um dos principais motivos é a questão ambiental. Alguns investidores já desistiram do projeto e solicitaram às autoridades a devolução da concessão que receberam.

Em certos casos, o atraso da concessão se deve aos próprios interessados, por causa da baixa qualidade dos documentos (Estudos de Impacto Ambiental e Relatórios de Impacto Ambiental) por eles apresentados aos órgãos oficiais. Em geral, porém, a demora se deve às dificuldades que surgem ao longo de um processo burocratizado e lento pela falta de qualificação do pessoal incumbido de analisar os casos, escassez de técnicos, influência de fatores políticos ou ideológicos no exame dos relatórios ambientais, superposição de funções entre órgãos públicos e até a judicialização do processo, pelo Ministério Público.

Dependendo da natureza do projeto e da localização do empreendimento, o licenciamento pode depender da avaliação de cinco órgãos do governo federal (fora as instituições estaduais e municipais). Se o projeto estiver em área indígena, o aval da Funai é indispensável. Em áreas habitadas por quilombolas, o processo terá de passar pela Fundação Cultural Palmares. Na parte arqueológica, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) terá de ser consultado. Nas áreas de doenças endêmicas, é indispensável ouvir o Ministério da Saúde. Em qualquer dos casos, a autorização final sempre será do Ibama.

A autorização pode vir acompanhada de condicionantes, ou seja, das compensações ambientais ou sociais impostas pelo órgão ambiental. Tudo isso eleva o custo do projeto. "Os custos da incerteza regulatória aumentam o orçamento dos programas socioambientais, representando quase 30% de todo o valor do empreendimento. E o orçamento final pode chegar a 50% acima dos valores iniciais previstos nos estudos de viabilidade", diz o estudo da CBIE.

Além de onerar o projeto, impondo custos adicionais aos consumidores, que pagarão a conta, o atraso do licenciamento ambiental trava o crescimento do País.

Fonte: Estadão

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Leia matéria de O Globo e veja onde está o problema.





Um comentário:

  1. Axel,
    Vc tem experiência e comentou muito bem sobre o assunto.
    Esse artigo do Estado é mais um daqueles que não vai no ponto certo. De onde o Abel Holtz e o Adriano Pires tiraram as informações? Se foi do estudo do Banco Mundial, tá tudo furado.
    Os órgãos ambientais têm seus problemas, não vamos tapar o sol com a peneira, mas a grande responsabilidade é do setor elétrico, que não chama a área ambiental para contribuir nos estudos de planejamento.
    O planejamento de uma UHE ou uma linha de transmissão leva às vezes mais de 5 anos, e só na época do leilão que a componente é considerada, no licenciamento.
    E os estudos, feitos a toque de caixa, deficientes, em regiões onde há total ausência do estado, tendo o empreendedor que arcar com essas responsabilidades, que muitas vezes são colocadas nas costas do licenciador.
    Vejam quanto ganha um analista de infraestrutura, um servidor da Aneel ou outra agência, e quanto ganha um analista ambiental. A rotatividade é enorme nesse cargo, salários baixos, pressão política, etc...
    Se hovesse um real investimento na área ambiental, com formação, melhores salários e planejamento, esses ditos atrasos não aconteceriam.
    Cito dois exemplos de linhas de transmissão para mostrar como são as coisas. As linhas do Madeira foram licitados um ano depois do que deveria ter ocorrido. Santo Antonio está com LO e os linhões não estão prontos. A culpa foi atribuída ao licenciador. Veja Belo Monte, tem LI pra a UHE, mas até janeiro a EPE não havia concluído o estudo para o leilão das linhas de transmissão. Parece piada.
    Outra coisa que deve ser considerada, a biodiversidade no Brasil não pode ser comparada com a dos países da Europa e América do Norte, lá é fácil fazer um estudo e aprovar. Já se conhece tudo.
    Abraço

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