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sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

VEJA on line: Velejadores do Projeto Grael vão cruzar o Atlântico

Vela
A aventura de quatro brasileiros na travessia do Atlântico

Alunos do Projeto Grael, de Niterói, vão competir em regata que parte dia 15 da Cidade do Cabo, na África do Sul, rumo ao Rio de Janeiro

Flávia Ribeiro, do Rio de Janeiro


Hallan, Alex e Samuel, em um dos barcos de treinamento do Projeto Grael, em Niterói: quarto integrante, Allan vai se juntar ao grupo para a travessia (Foto Ismar Ingber)

Ouro nas Olimpíadas de Atlanta (96) e Atenas (2004), o iatista Torben Grael já tinha duas medalhas olímpicas (um bronze e uma prata) em 1993, quando completou sua primeira regata oceânica. Experiente e vencedor, Torben tinha 33 anos quando participou da Cape Town-Rio, regata tradicional que sai da Cidade do Cabo, na África do Sul, para o Rio de Janeiro. Hoje, Torben se enche de orgulho ao ver que quatro jovens do Projeto Grael participarão da mesma regata oceânica na qual ele estreou. Samuel Gonçalves, de 23 anos; Hallan Batista, 22; Alex Sandro Mattos, 21; e Allan Tavares, de 18, partem dia 15 da Cidade do Cabo para uma travessia de pelo menos 20 dias em mar aberto, num barco de 41 pés, ao lado de dois iatistas sul-africanos experientes. Serão os únicos brasileiros da regata.

“Vai ser uma experiência muito enriquecedora para eles. Primeiro, por conhecerem a África do Sul. Depois, pela regata em si. Quando eu participei, fui achando que a regata era algo como cruzeiro, então nós fomos com um barco mais adequado a isso, e nos deparamos com um monte de barcos de competição. Eles, não. Já vão com um barco de regata mesmo”, comenta Torben, que acredita no potencial dos quatro pupilos: “Os quatro têm participado de muitas competições e têm experiência de vela oceânica”.

O instituto, que funciona em Niterói, foi criado há dez anos por Torben, Lars e Axel Grael e Marcelo Ferreira, para promover a educação, através da vela, para crianças e adolescentes de comunidades carentes de Niterói e São Gonçalo. Um ano depois, Samuel Gonçalves, então com 14 anos e 98 quilos, assistiu a uma palestra sobre o projeto em sua escola. Apaixonou-se imediatamente. Entre 2001 e 2004, fez os cursos básico e avançado, que incluem disciplinas como carpintaria e mecânica, ganhou o certificado da Federação Brasileira de Vela como gerente de barcos e tornou-se tricampeão brasileiro na classe Ranger. Estudante de Desenho Industrial na UERJ, Samuel não se esquece das vezes em que ficou na frente até de seus ídolos.

“Em 2009, fui convidado por um suíço para velejar com ele no Sul-Americano de Vela, pela classe Star, que é olímpica. Na classificação final, não deu, mas teve uma regata em que cheguei à frente do Torben! Depois, fui convidado por um brasileiro para disputar o Europeu da Star na Itália. Eram 143 barcos e chegamos em terceiro lugar em uma das regatas, na frente do Robert Scheidt. Nesse dia até pulei na água na chegada. Outra grande emoção foi quando o Torben me chamou para velejar ao seu lado, este ano, na Soto 40”, lembra ele, que hoje, nove anos depois de seu primeiro contato com a vela, pesa 85 quilos: “O Projeto Grael mudou minha mente e meu corpo”, afirma.

Em 2002, Alex Sandro soube por um amigo que havia vagas em um projeto social da triatleta Fernanda Keller, que ficava em um contêiner em Charitas. Foi até lá, mas entrou no contêiner errado. “Naquela época o Projeto Grael não tinha ainda sede própria, ficava num contêiner vizinho ao da Fernanda. Quando percebi meu erro, resolvi saber do que se tratava. Gostei e fiquei. Fiz o curso básico de Optimist e quase todos os profissionalizantes, como mecânica diesel, marcenaria, eletrônica e fibra de vidro. Depois, fiz o de vela avançada”, enumera o rapaz, que é filho de empregada doméstica e está tentando entrar no curso de Construções Navais, da Faetec.

Hallan interrompe para explicar que não basta saber velejar: “Numa regata, é você quem cuida do seu barco. Tem que saber tudo”, diz ele, que chegou ao Projeto em 2005, junto com seu irmão gêmeo, Rennan, e seis meses depois já participava de regatas na Bahia. Filho de uma diarista e de um pescador, Hallan sonha dar a volta ao mundo através da vela. “A Cape Town é um primeiro passo. Quero participar da Volvo Ocean Race, que dá a volta ao mundo”, diz. Samuel também sonha com a Volvo, enquanto Alex pensa nas Olimpíadas do Rio, em 2016. Para Allan, filho de uma costureira, o objetivo é entrar na Escola de Formação de Oficiais da Marinha Mercante e se tornar prático de porto.

Enquanto isso, o rapaz auxilia um professor de windsurfe no Clube Naval de Niterói, faz entregas de barcos em outros estados brasileiros e, eventualmente, um trabalho de mecânica em barcos, fruto de seu aprendizado nos cursos profissionalizantes do Projeto. Ele é o caçula do grupo não só em idade: só entrou no instituto há três anos e só soube que iria para a Cidade do Cabo quase um mês depois dos outros. “Na época em que estavam selecionando o pessoal, me ligaram, mas eu estava entregando um barco em Santos e meu celular estava desligado. Fiquei chateado por ter tido esse azar, mas ao mesmo tempo feliz por ter sido colocado na reserva. Era sinal de que eu tinha capacidade para substituir qualquer um dos três. Então me ligaram dia 23 de dezembro para dizer que decidiram que nós quatro iríamos. Fiquei muito feliz, foi um presente de Natal!”, comemora.

Os quatro repetem a todo o momento que o foco do Projeto Grael não é a competição. Mas não escondem que a meta de cada um deles é essa. “Isso é mérito individual. E, quando você vai participar de um campeonato desses, já tem que entrar no barco sabendo o que fazer. A gente aprende no Instituto. Numa competição, ninguém vai parar para te ensinar”, diz Samuel, que conclui: “É difícil, mas nosso objetivo é viver da vela”.

"Quando eu participei, fui achando que a regata era algo como cruzeiro, então nós fomos com um barco mais adequado a isso, e nos deparamos com um monte de barcos de competição. Eles, não. Já vão com um barco de regata mesmo”, diz Torben

Entre os aprendizados da regata, o desafio da convivência


O grupo que vai cruzar o Atlântico: convivência com culturas e idiomas diferentes faz parte dos obstáculos da travessia (Foto Ismar Ingber)

Durante a regata, os quatro jovens velejadores terão que vencer uma série de obstáculos, desde a alimentação, com comidas desidratadas, até a barreira da língua. Samuel fala inglês, os outros dizem que ficam no “embromation”, mas todos acreditam que a comunicação entre iatistas é universal. “Nessas provas longas, o pior pode ser a convivência. Já velejei com um sujeito que queria descer de Búzios às onze da noite, debaixo de uma tempestade. Numa outra vez, velejei com um cara que bebia sem parar. Nós quatro nos conhecemos, isso vai ajudar”, torce Hallan.

Eles pretendem unir suas experiências para que a viagem corra o mais tranquilamente possível. Por mais que todos venham do mesmo projeto, cada um tem uma vivência diferente lá dentro. Hallan participou do curso Terra à Vista, em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF), com foco no meio ambiente.

“Depois do curso, trabalhei por seis meses no projeto Águas Limpas, de monitoramento do lixo”, conta. Já Allan é piloto do Peixe-Galo, catamarã a energia solar pelo qual correu, por exemplo, uma regata em Paraty, no ano passado.

Samuel trabalhou como árbitro em competições importantes de Vela, como o Pan-Americano do Rio, em 2007. “Parei depois de um tempo, porque queria me concentrar em ser iatista, não juiz”, diz ele, que fez o ensino médio técnico em Máquinas Navais na Faetec e hoje cursa o oitavo período de Desenho Industrial na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Alex, o mais calado dos quatro, conta que venceu grande parte da timidez graças ao projeto. “Eu era individualista, preguiçoso e retraído. Continuo tímido, mas bem menos. Hoje sei trabalhar em equipe e já conheci muita coisa”, diz, lembrando que participou do Campeonato Espanhol de snipe e que é tricampeão brasileiro de Ranger, como Samuel: “Estávamos juntos nessa”, destaca.

Torben lembra que o projeto mudou muito desde seu início, e que isso reflete nas experiências desses jovens. “No começo, o projeto era só uma escola de vela. Hoje, é muito mais que isso, ensina desde natação até uma série de cursos profissionalizantes. Alguns deles trabalham em barcos, e isso permite que continuem velejando”, diz.

Fonte: Revista Veja,
30/12/2010 - 16:25

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INFORMAÇÕES RELEVANTES

A participação da equipe do Projeto Grael foi possível graças aos seguintes apoios:

- Consulado Geral do Brasil na Cidade do Cabo, África do Sul.
Embaixador Joaquim Whitaker Salles e Pedro da Cunha e Menezes
- John Martin, comodoro do Royal Cape Yacht Club, organizador da Regata.
- Patrocínio da empresa Wellstream.
- Apoio da empresa G-Comex

Um comentário:

  1. Axel,sensacional iniciativa do grupo, desejo a todos os melhores ventos e que aproveitem esta experiência ao máximo!!
    bons ventos!!

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